20 de abril de 2024
Editorial

Investigados ou depoentes da CPI?

Na última semana, quem vem acompanhando a “CPI do fim do mundo”, não pode ter deixado de notar uma maior aproximação entre o Legislativo e o Judiciário. Diálogo salutar entre o Legislativo e o Judiciário.. isto seria o ideal. O fato mostra um certo grau de amadurecimento, muito embora não seja esta a intenção do “eca” relator.

Foto: Google Imagens – Poder360

Por que eu digo isso? O relator anunciou a intenção de tornar, formalmente, investigados um grupo de pessoas, sendo que parte deste grupo já tenha passado por depoimentos na CPI. Mas o que isto significa na prática?

Objetivamente, muito pouca coisa, na verdade, quase nada, mas as cabeças pensantes na área jurídica desta CPI disseram que não há na legislação brasileira um critério definido para quando uma pessoa é investigada por uma CPI ou somente um depoente. Isto fica a cargo da entidade que está procedendo à investigação, ou seja, quem a comanda.

No inquérito policial, é o delegado de polícia, seja da Polícia Civil ou da Polícia Federal, a depender de onde tramita o referido inquérito. Ele, o delegado, é o responsável pelo indiciamento. Em sequência, o MP (ou MPF) pode ou não seguir com o indiciamento, mas isto já é outra questão.

Novamente, não há na lei brasileira um marco que diga: “a partir daqui a pessoa é considerada investigada”. Em outros países, até há esta distinção.

Por mais incrível que possa parecer, o indiciamento, muitas vezes, é interessante para a parte “acusada”, porque, a partir daí ela poderá usufruir dos direitos e garantias que lhe são garantidas pela Constituição Federal, como por exemplo, o direito ao silêncio, ou seja, a lei garante que o investigado não é obrigado a se autoincriminar com alguma resposta.

Além do que, isto sim é o mais importante pra mim, a parte sendo considerada como investigada, obrigatoriamente, tem que ter acesso livre às provas, fatos e documentos que o acusador tenha contra ela.

A CPI, até agora, chamou quase só investigados. O quase fica por conta, por exemplo, com as Dras. Luana e Natália Pasternack, uma médica e uma cientista espetaculares, diga-se de passagem. Tentando simplificar, seria como se o Promotor de Justiça chamasse só para depor os réus e nenhuma testemunha.

Isto gera um problema, porque os investigados, mesmo convocados como testemunhas, iriam ao STF e conseguiriam um habeas corpus para não comparecer ou para não responder às perguntas que pudessem, de alguma forma, incriminá-los.

Então a decisão de Renan, inverte um pouco esta lógica, na minha opinião, até esvaziando a CPI porque garante de saída todos os direitos constitucionais dos investigados. Alguns pedidos feitos por investigados ao STF barraram quebras de sigilo fiscal, telefônico, bancário e telemático.

No entanto, o STF está dividido mais uma vez. Parte das decisões mantém a quebra de sigilo, porém, outra parte, derruba a quebra de sigilo. Daí a CPI precisa fundamentar muito bem sua defesa, porque se retrocedermos a 2004, tínhamos a CPI da Pirataria na Câmara dos Deputados e um dos principais investigados era um empresário sino-brasileiro – Law Kin Chong – do mercado imobiliário de locação de lojas e espaços em complexo empresarial de pequenos e médios empreendedores.

Tornou-se conhecido no Brasil, em função de administrar Shoppings sediados na região conhecida como 25 de Março, no centro de São Paulo. Apontado, à época, como um dos maiores contrabandistas do país. Ele foi chamado a depor na CPI, só que ele foi ao STF e pediu para não comparecer, ou em caso de obrigação de comparecer, que a sessão não fosse gravada, proibindo a transmissão ao vivo da audiência. A sessão estava marcada para às 10h. O que fez o relator daquela CPI?

O então ministro Cesar Peluso acatou o HC e daí o presidente da CPI deu um drible na decisão do STF. Ele cancelou a sessão das 10h em curso e abriu uma nova às 14h, sobre a qual não havia qualquer decisão contrária do STF, já que a anterior referia-se apenas à das 10h. Tecnicidades que mantêm fora da cadeia milhares de réus, principalmente os de colarinho branco.

O investigado, novamente, entrou no STF com novo pedido de HC, só que a sessão já estava em andamento e o STF derrubou a liminar de Peluso.

Em poucas palavras, a Câmara, ignorou a decisão do STF e, desobedeceu-a, na cara dura. Foi um escândalo, tanto que o então presidente do STF, Maurício Corrêa, veio a público e deu entrevistas dizendo que aquilo poderia provocar um conflito entre os Poderes, porque o Legislativo, no caso a CPI, não poderia desrespeitar uma decisão do STF. A seguir o próprio STF, em seu Pleno, derrubou a Liminar, colocaram panos quentes e a vida seguiu.

Quando pegamos esta realidade, já vivida, e a trazemos para os dias de hoje, de Renan Calheiros transformando depoentes, em investigados, muito para sinalizar ao STF, dizendo que as decisões com as quais ele não concorda, a CPI vai aditar ao pedido inicial, fundamentos que possam viabilizar uma nova decisão.

É óbvio, e constitucional, que haja harmonia entre os Poderes, logo a aproximação do Legislativo com o Judiciário é saudável e boa para o país, mas se ambos se unem contra o Executivo, isto deixa de ser bom.

Para encerrar, acho que esta abertura de diálogo do Legislativo e do Judiciário é muito boa para o país, porque o STF deixa claro que vai garantir, de saída, o respeito ao direito que qualquer investigado tem.

Daí surge uma dúvida: como fica o acesso às provas e documentos que a CPI tenha arquivado dos depoentes, até então não investigados?

Bem, a CPI tem o direito de quebrar o sigilo bancário. Se mesmo autorizado pelo STF, a CPI jamais poderia divulgar ou vazar o que encontrou, ou seja, a CPI tem amplo e irrestrito acesso a estes documentos, no entanto, se isto for vazado ou divulgado, não poderão fazer parte das provas num futuro processo contra o investigado. Serve, no caso aquela máxima do Direito: fruto de árvore podre, é podre!!!

A CPI corre um sério risco, porque alguns documentos tidos como “confidenciais” fazem parte do Portal da Transparência. Como lidar com isso? É público ou sigiloso? Se está no Portal é público, mas se considerados como sigilosos, não podem entrar no Portal… dúvida cruel!!!

A CPI deve decidir como agir, sabendo que: se agir errado poderá comprometer todo o processo, toda a investigação pela máxima do Direito acima mencionada.

Pelo que vimos, a CPI não é a favor de descobrir o que foi feito, ou não, de errado, por erro ou omissão, durante a negociação das vacinas… agora temos o processo de aquisição da Covaxin… nada foi assinado, nenhuma vacina chegou… negociações apenas… pelo menos até agora. Puramente política para tentar incriminar o Presidente…

Vacinas para quem quiser. Para quem não quiser, que assuma o risco… A regra é esta!

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

Advogado, analista de TI e editor do site.

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