25 de abril de 2024
Editorial

As jabuticabas do novo Código Eleitoral

Amigos, na semana passada, pela primeira vez nestes 24 anos, não pude atualizar O Boletim por problemas de saúde.

Eu e minha mulher contraímos a Covid-19 e tivemos que ser internados para melhor tratamento. Eu com 50% de comprometimento dos pulmões e ela com cerca de 35%. Bom que ela ficou apenas 5 dias internada, apenas com medicamentos e sem oxigênio e eu, com um acometimento maior do pulmão, precisei de suporte com o cateter de O2 para ajudar a respiração. Tive que permanecer no hospital por 7 dias. Com alta hospitalar, o tratamento continua em casa por pelo menos uma semana. Mas já estamos melhores. Agradecemos aos amigos os votos de melhoras. De volta ao trabalho, devagarinho, porque qualquer esforço é seguido de um cansaço absurdo.

Desde já peço desculpas pelo tamanho do Editorial, mas prolixo com sou de costume e calado por uma semana inteira, tenho muito a falar… rs

Pois é, foi assim, de um leito hospitalar que pude acompanhar a bela manifestação democrática (chamada de antidemocráticas pela mídia de sempre) pró-Brasil de 7 de setembro, bastante impressionado com a adesão e com a forma pacífica como se desenrolaram as manifestações por todo o país. Ressalvando-se os excessos, esperados pela multidão, do Presidente que, no calor do momento, atacou diretamente Alexandre de Moraes e Barroso. Temer veio de bombeiro e conseguiu contornar politicamente, que é sua expertise. Bom que o Presidente teve a consciência de aceitar um recuo estratégico pelo bem do país. Às vezes um passo atrás nos dá possibilidade de dar dois à frente depois.

Brasília na manifestação de 7 de setembro – Foto: Google Imagens – Revista Oeste (meramente ilustrativa)

Também de lá, acompanhei a manifestação “contra o governo”, no dia 12, a meu ver, estrategicamente mal marcada, que foi uma furada para os organizadores e simpatizantes de sempre: CUT, MST, Partidos de esquerda et caterva. O PT, espertamente, não participou o que certamente diminuiu em muito o número de participantes. Não vi uma bandeira do Brasil. Nada de verde-amarelo. Apenas bandeiras e camisas vermelhas.

Manifestações de 12 de setembro – Foto: Google Imagens – Pragmatismo Político (meramente ilustrativa)

Acho muito legal E DEMOCRÁTICA qualquer manifestação seja ela contra ou a favor de qualquer pauta. Isso é a livre manifestação do povo!

Mudando de assunto, no entanto, gostaria de dar um pitaco de leve neste novo Código Eleitoral – cheio de jabuticabas (ou jabutis, como preferirem) – que está sendo costurado, votado e prestes a ser aprovado às pressas na Câmara para que seus efeitos já sejam sentidos na próxima eleição. Ainda bem que li que Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado, já disse que não vai votar na correria, mesmo que isto implique na não aplicação das novas regras no próximo certame eleitoral.

Nossa legislação – Foto: Google Imagens – Jardim Exótico (meramente ilustrativa)

Vou pinçar e comentar apenas algumas modificações mais gritantes, a meu ver, contra a lisura das eleições e, principalmente, a favor da possibilidade de candidatura de parlamentares que estariam inclusos na Lei da Ficha Limpa, a qual estão flexibilizando.

Bem, já que falei na Lei da Ficha Limpa, uma lei criada a partir de milhões de assinaturas em um projeto enviado àquela Casa, que já o desvirtuou parcialmente na sua implementação, desta feita, em caso de aprovação da alteração proposta, praticamente cairia por terra porque retira-se dela o trecho que torna inelegível o parlamentar que renuncia ao mandato para evitar a cassação. Recurso comumente usado e que até o Renan “CaNAlheiros” o fez para evitar sua cassação na época de seu implante capilar e no caso daquela famosa jornalista/amante Mônica Veloso, lembram? Permitir esta manobra a parlamentares que correm o risco de cassação lhes dá uma arma poderosa, porque se cassados, hoje, ficam proibidos de concorrer em pelo menos duas eleições, mesmo que renunciem antes da votação, o que não aconteceria com a aprovação da nova proposta. Não podemos permitir isso!

Outro ponto a ser destacado é a proibição de divulgação de pesquisas a partir da antevéspera do pleito. Isso prejudica em muito nós, os eleitores, porque nos priva da informação – seja ela confiável ou não, porque nossos institutos de pesquisas estão “pra lá de Marrakech” quando se trata de acertos em pesquisas. Temos que ter o direito à informação. Crer nelas ou não é problema nosso! Não queremos políticos pensando por nós. Chega! Queremos e precisamos de todas as armas possíveis para poder votar conscientemente!

Fundo Partidário é outro ponto vital. Esta jabuticaba em nossa legislação, nesta proposta, além de permanecer existindo – o que por si só já é um absurdo – abre a possibilidade para que os partidos o usem para atividades relacionadas à sigla, tornando genérico o texto: “permissão para uso de interesse partidário, conforme deliberação da executiva do partido político”. Já não chega eles poderem pagar advogados com o nosso dinheiro para defendê-los de seus desvios, ainda será a executivo do partido que definirá se vale ou não usar o fundo para qualquer fim? O que vocês acham que em 100% das vezes ocorrerá?

Fiscalização de contas. Hoje, o TSE é o único responsável pela auditoria das contas dos partidos. Por esta alteração, os partidos podem contratar empresas privadas (já vimos isso, né?) para auditar suas contas e daí enviar um relatório ao TSE. Que beleza, não? É como se eu mesmo me fiscalizasse e emitisse um relatório avalizando meus atos… ou algum inocente acha que um partido contratará uma empresa que emitiria um parecer contrário ao que ele precisa? Óbvio que ao contratar, o relatório já estará previamente ajustado, caso contrário, nada de contratação daquela empresa… com todo o respeito pelas empresas de auditoria, NÃO DÁ PRA ACREDITAR!!!

Multas: outro problema crônico. Algum de vocês já teve notícia de pagamento de alguma multa aplicada pelo TSE a algum partido ou candidato? Há recursos que demandam anos e anos e acabam prescrevendo (outro absurdo em nossa legislação. Refiro-me ao instituto da prescrição de crimes, seja ele de que espécie for). As multas hoje podem chegar a milhões de reais, mas na nova regra proposta, o teto para multas é de R$30mil. Isso é dinheiro de bolso para qualquer dos parlamentares, o que dirá dos partidos. Uma brincadeira de profundo mau gosto. O pior é que não é brincadeira. Está no projeto a ser votado…

Quarentena: este é outro tema importante. Ele surgiu após a traição pública feita pelo ex-juiz Sergio Moro ao Presidente Bolsonaro e com a ascensão de militares a cargos antes destinados exclusivamente às garras dos partidos para se montar a base governista. O novo texto prevê a obrigatoriedade de uma quarentena de 5 anos, ou sejam, duas eleições, para militares, policiais, magistrados e integrantes do MP que desejarem disputar as eleições. Aprendi em meu curso de Direito e ainda em minha militância diária no Direito, enquanto advogava, que quanto mais casuística a lei, pior ela é. É o caso! Que tal proibir parlamentares a concorrer a mais de dois mandatos, tal como as eleições majoritárias. Nada de viver de política. Trabalhar pelo país deve ser o lema. Mas alguém acha que isso passa na cabeça de qualquer parlamentar?

Sexismo. Sim, pra mim isso é sexismo. Na proposta, há previsão de que o parlamentar que deixar sua cadeira seja substituído por um suplente do mesmo sexo, mesmo que haja outra pessoa de gênero oposto, mais votado na fila. Se o parlamento é a representação popular mais importante, o mais votado tem que ser sempre o preferido. Pelo fim das eleições proporcionais… os mais votados entram e pronto! Tal e qual o suplente mais votado.

Fake News. Eu nem iria tocar neste assunto, mas como faz parte de um todo, vamos lá. Na nova proposta há uma previsão de pena de 1 a 4 anos de reclusão no caso de divulgação ou compartilhamento de fake news com o objetivo de afetar as eleições. Este ponto tem, claramente, um alvo, que é o Presidente Bolsonaro e seus seguidores, que usaram, e algumas vezes abusaram, das Redes Sociais para divulgação. Os parlamentares ainda vivem na Idade da Pedra Lascada que é o que lhes interessa. Redes Sociais só os atrapalham porque informam a população dos fatos que ocorrem em nosso dia a dia político. Deixem o povo se manifestar e que ele mesmo decida sobre o que ler ou não – e em que acreditar ou não – nas Redes Sociais. É a forma atual do povo se informar. Atualizem-se. Divulguem, se for o caso, na grande imprensa, que é fake news e pronto! O povo saberá que aquela informação é fake. Liberdade de expressão está prevista em nossa Constituição.

Precisamos esquecer momentaneamente a festa democrática de 7 de setembro e voltar nossos olhos para esta votação do novo Código Eleitoral, que pelo que tentei mostrar, vai mexer – e muito – com nossos direitos, desfavoravelmente e com os “direitos” dos partidos e parlamentares, favoravelmente.

Temos que impedir este absurdo. Contamos no momento com as Redes Sociais e com o Presidente do Senado que, até agora pelo menos, se manifestou contrário à correria, mas não à proposta, ou seja, ele pode até não correr para valer nas próximas eleições, mas não está contra a aprovação.

De olho neles!!!

#NovaConstituintejá

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

Advogado, analista de TI e editor do site.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *