20 de abril de 2024
Ligia Cruz

A morte dos princípios


Em Brumadinho para onde se olhe é devastação que se vê. Até o momento 163 mortos e 147 pessoas desaparecidas. A trágica soma tecnicamente ultrapassará 300 mortos. Números que ninguém vai se esquecer, nem mesmos dos restos mortais daqueles que jamais serão encontrados. Se é para enterrá-los, enterrados estão. Triste conclusão.
Somando-se o episódio de Brumadinho ao de Mariana, provavelmente Minas Gerais seja o estado brasileiro com mais vítimas de impunidade.
Em país sério, o presidente da Vale, Fábio Schvartsmann, e todo seu staff estariam atrás das grades. No início, quando pego ainda no aeroporto ao voltar de viagem, ele se resignou, parecia um zumbi saído de uma caverna. À medida que as informações sobre a sucessão de erros sendo revelada, o tom mudou. Não basta o bloqueio de R$ 11 bilhões pelo governo porque isso é pouco para cobrir a extensão da tragédia. Famílias, empregos, negócios, meio ambiente, fauna e flora, tudo destruído pela falta de princípios e compromisso com a vida.
Mariana está aí para confirmar o nível de responsabilidade da Samarco, associada da Vale, para com as vítimas humanas e ambientais. Ninguém até agora foi devidamente indenizado. O fato é que há muito mais caroço neste angu para alimentar a vergonhosa impunidade.
Até agora, o que o brasileiro aprendeu foi o “tecniquês” da mineração. Já sabe o que é barragem a montante, descomissionamento e sabe principalmente o que é picaretagem, desrespeito e fortes indícios da relação promíscua entre a mineração e o estado brasileiro. Fazem as leis, geram receitas e se auto fiscalizam. Podridão muito acima dos rejeitos.
O resulto é muito pior quando se computam as perdas ambientais de todo o ecossistema do rio Paraopeba.
Os pesquisadores do SOS Mata Atlântica fizeram aferições da qualidade da água por um pouco mais de 300 km do rio e detectaram nível de turbidez três vezes acima do habitual. O que significa que a borra resultante da atividade de mineração sem controle supera os índices de oxigenação que permitem a reprodução das espécies da fauna e flora e de água própria para o consumo. Pode-se dizer que o rio morreu.
E sabe-se lá quantos séculos levará para construir a intrincada trama do equilíbrio ambiental. Rio morto é civilização morta em qualquer tempo. Ninguém planta, colhe, se alimenta no entorno de toda a extensão do rio e sua várzea.
Mais que isso, Brumadinho é exemplo de falência moral da relação entre empresa privada e seus interesses e o estado irresponsável e corrupto.
De novo: num país sério o presidente da Vale estaria trancafiado a sete chaves, bem longe da vida nababesca que deve ter.

Ligia Maria Cruz

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *