25 de abril de 2024
Colunistas Ligia Cruz

Mais além da Crimeia

Imagem: Google Imagens – Infoescola

O tabuleiro de xadrez do leste europeu teve movimentações mais bruscas na última semana por conta da crise entre a Ucrânia e a Rússia.

O que pesou foi a declaração dos Estados Unidos de que enviaria tropas para fortalecer a fronteira ucraniana ante o iminente ataque de Vladimir Putin.

Mobilizou as forças da Otan e deixou os parceiros da aliança de sobreaviso.

Depois disso, retaliação, o russo estreitou um acordo de cooperação militar com a China, sob o pretexto de se ter pronta resposta ante as “forças desestabilizadoras” presentes na Europa e na Ásia – leia-se Otan.

Cravou 100 mil soldados na fronteira com a Ucrânia e mandou navios para os mares de Azov e Negro, a fim de blindar qualquer tentativa de ataque por via marítima. A aliança envolve planos globais de defesa com mísseis e armamentos de grande precisão. Claro que Xi Jinping viu a oportunidade de um acordo de peso porque se morde com as interferências de “estrangeiros” em Taiwan.

Após essa resposta de força, Joe Biden amarelou. Disse que não era bem assim. Mas orientou os cidadãos americanos a deixarem a Ucrânia, com o agravo de que a situação pode sair do controle — o que foi seguido pelo Japão, Coreia do Sul e Holanda.

Depois da saída desembestada do Afeganistão, o presidente americano já não tem tanto moral assim, mostrou-se despreparado para gerir crises. Mas não é só isso.

A Alemanha, o mais forte país europeu e sócio da Otan, não deseja arrastar o país para mais um conflito mundial, ainda que reprove os métodos de repressão do governo russo. E há uma razão muito importante: 50% do gás consumido pelos alemães vêm da Rússia.

Ou seja, Putin não é exatamente um parceiro, mas também não é um inimigo figadal. Há um gasoduto praticamente pronto, o Nord Stream 2, ligando os dois países, por baixo do Báltico. A operação foi interrompida quando a crise com a Ucrânia arrefeceu e a Alemanha teve que se posicionar.

Na verdade, a Rússia passou a sofrer embargos após a anexação da Crimeia, região ucraniana de fronteira, em 2014. E é por tudo isso e muito mais que a crise ganhou corpo.

Na ocasião, Putin deu um jeitinho para que 500 mil cidadãos ucranianos de lá ganhassem passaporte russo e votassem pelo desmembramento em referendo popular. Óbvio que ninguém se vendeu facilmente, a maioria dos habitantes da Crimeia fala russo e tem identificação cultural desde antes dos tempos da antiga União Soviética.

Quando a União Soviética colapsou, a Otan tinha doze membros. Com a independência dos países do leste europeu, em 1997, a organização passou a ter 30 associados. A Rússia nunca engoliu isso e se vê cercada em suas fronteiras. E vai piorar ainda mais se a Ucrânia entrar e integrar também o bloco europeu, como deseja.

Putin relembra os membros da Otan que foi feito um acordo de não ampliação da organização e a aceitação da Ucrânia daria forças militares para que recuperasse a Crimeia, considerado seu território. E essa disputa está longe do fim.

Embora haja acordos de pacificação celebrados no passado por missões diplomáticas, vários países foram prejudicados pelas sanções à Rússia. Por exemplo, a Hungria, que faz parte da União Europeia e Otan, teve que encerrar contratos de fornecimento de gás e petróleo com a Rússia, o que prejudicou enormemente os planos do primeiro-ministro Viktor Orban, que tenta pôr panos quentes na crise, desagradando os sócios.

Porém, na raiz de todo o imbróglio, há beligerância e ódios antigos na fronteira entre a Rússia e Ucrânia, que poderá reformular o mapa daquele pedaço de mundo.

Na região de Donbas, no Mar de Azov, há dois estados separatistas, não reconhecidos, que se consideram países e reivindicam a independência:

República Popular de Donetsk e República Popular de Luchansk.

É uma área carbonífera habitada por tribos diversas, descendentes de antigos povos dos primórdios da ocupação daquele solo, como citas, hunos, alanos, búlgaros, tártaros, nogais, turco-mongóis etc.

A região esteve sob controle do hetmanato cossaco ucraniano e pelo Canato da Crimeia até o século XVIII, quando o império russo os anexou.

No censo de 1989, em Donbas 45% da população era russa. Mas eles não pensam assim, devido a toda a diversidade cultural, usos e costumes.

Durma-se com um barulho desse, enquanto a turma do “vai pra cima” e “deixa disso” tentam conter uma guerra que a maioria não quer.

Ligia Maria Cruz

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

1 Comentário

  • […] mim o foco está claro… a amiga Ligia Cruz, nossa colunista, em sua coluna de 11/2, explicou com detalhes toda a “trama”, mas na minha opinião o que fica claro, é que a […]

Deixe um comentário para Bolsonaro na Rússia: e daí? – O BOLETIM Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *