5 de maio de 2024
Vinhos

Alguns vinhos icônicos – Barca Velha

Este vinho é um fenômeno, simplesmente. Conseguiu ser mais famoso e reconhecido internacionalmente do que o – me desculpem – mais famoso produto português, o Vinho do Porto.

Para completar o quadro, o Barca e os Portos são elaborados na mesma região, o Douro.

Que audácia!

Há muito o que contar sobre este vinho, história de pessoas e de lugares.

Começamos com D. Antónia Adelaide Ferreira, a “Ferreirinha” (1811-1896), uma mulher importantíssima na história do vinho português. Abastada e generosa, sempre ajudou as famílias em necessidade e acreditava que a qualidade era o único caminho para o sucesso. Investiu na compra de terras, algumas em locais quase inacessíveis, naquela época, entre elas, o que se tornaria a Quinta do Vale Meão. Era muito inovadora para o seu tempo.

Em 1887 começa a plantar videiras enxertadas (pós-filoxera), já pensando em elaborar Vinho do Porto, o que aconteceu pouco depois, fundando a Casa Ferreira, com seus descendentes. O Vale Meão passa a ser visto como um local de excelência.

Ela tinha um sonho: produzir um tinto fino, não fortificado, coisa impensável no Douro. Este desejo só foi acontecer em 1952, pelas mãos de outro personagem importante, o Enólogo Fernando Nicolau de Almeida, que tinha as mesmas ideias de D.Ferreirinha.

Começou a trabalhar na Casa Ferreira aos 16 anos, em 1929, trazido por seu pai, então Enólogo Chefe. Em 1949, assume o posto máximo e conhece Emile Peynaud, principal winemaker de Bordeaux, que o convida para visitar o Château Calon-Segur, de onde volta para Portugal fervilhando de novas ideias para elaborar um tinto de qualidade.

Matéria-prima não lhe faltava, as uvas do Vale Meão eram formidáveis, só faltava adaptar o método francês de elaboração. Havia um importante diferencial: enquanto lagares abertos eram os preferidos na terrinha, os franceses vinificavam em cubas de carvalho e com temperatura controlada.

Em 1952, a primeira vinificação do Barca foi uma verdadeira aventura. Ainda não havia eletricidade no Meão e o gelo, necessário para manter a temperatura durante o processo, foi trazido de Matozinhos, numa viagem que durava doze horas. Além das uvas locais, outras foram trazidas da região de Meda, de solos graníticos, para dar acidez e equilíbrio.

Pronto o vinho, Nicolau de Almeida introduz mais uma novidade, deixar o vinho amadurecer por alguns anos, neste caso, sete deles. Quando foi lançado, o Barca 1952 se tornou um enorme sucesso, que se mantém até hoje.

São mais de 70 anos e apenas 20 safras foram comercializadas, a mais recente é a de 2011. Não é sempre que as uvas estão no ponto certo para um Barca.

Somente três Enólogos tiveram o privilégio de produzir este vinho: Fernando Nicolau de Almeida – 1952/1998, José Maria Soares Franco – 1998/2003 e Luis Sottomayor, atual Enólogo Chefe.

Em 1987, o Grupo Sogrape comprou a Casa Ferreira. A Quinta do Vale Meão, pertencente a um trineto da Ferreirinha, Francisco Javier de Olazabal, deixa de fornecer suas preciosas uvas, preferindo elaborar seu próprio “Barca”, o Quinta do Vale Meão, carinhosamente apelidado de “Barca Nova”.

A Quinta da Leda passou a desempenhar o principal papel no fornecimento da matéria prima, mantendo a qualidade tão sonhada por D. Antónia Adelaide Ferreira.

Resta explicar a origem do nome.

Nicolau de Almeida tinha uma frase: “É mais fácil ir a Luanda que no Meão”. Eram tempos duros, com poucos recursos e infraestrutura de transportes bastante precária. Os vinhos que precisassem atravessar o rio utilizavam uma antiga balsa, a “Barca Velha”, que um dia foi substituída. Mas o apelido ficou gravado em muitas gerações.

O corte tradicional de um Barca é composto por 50% Touriga Franca, 30% Touriga Nacional, 10% Tinta Roriz e 10% Tinto Cão. Dependendo da safra e do Enólogo, podem acontecer variações. É um vinho artesanal, constantemente testado, sendo comercializado, apenas, quando está num ponto de maturação que outros vinhos nem sonham em atingir.

Uma lenda!

Preço médio no Brasil: R$ 7.000,00 (safra 2011)

Saúde e bons vinhos!

Tuty

Engenheiro, Sommelier, Barista e Queijeiro. Atualiza seus conhecimentos nos principais polos produtores do mundo. Organiza cursos, oficinas, palestras, cartas de vinho além de almoços ou jantares harmonizados.

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Engenheiro, Sommelier, Barista e Queijeiro. Atualiza seus conhecimentos nos principais polos produtores do mundo. Organiza cursos, oficinas, palestras, cartas de vinho além de almoços ou jantares harmonizados.

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