Recebo uma revista no final de semana que vem com outra , menor, que cuida do lazer conta sobre filmes, séries de TV, exposições, peças de teatro, etc.
Demorei a perceber que seu teor mudava de semana para semana, mas, nesta em especial, em que estão em sua capa diversos “moradores de rua” no Páteo do Colégio, um local que costumeiramente serve como ponto histórico e de turismo por aqui, percebi que os assuntos a serem abordados seriam outros.
E dentro, fotos e reportagens com pessoas que, por vocação e muito desprendimento ou porque é essa a sua função na prefeitura, trabalham especificamente com os segmentos de risco da população.
Um parênteses e, depois de ter lido a extensa reportagem, fico pensando: nenhum de nós deixa de se encaixar nesse, assim chamado, “perfil de risco”…
Leio que quase 50% desses moradores são ex-detentos e fico simplesmente estupefata diante do fato de que essas criaturas, quando são soltas, devem pagar uma quantia que varia entre R$300,00 e R$ 1.500,00 para o “erário público”, sob pena de não serem considerados cidadãos “quites com a lei”, o que lhes impedirá de tirar carteira de trabalho e outros documentos que lhes permitam trabalhar.
Como quase a metade dos presos é solta depois de ficar indevidamente presa por anos a fio, esperando um advogado apenas para ler seu processo e liberá-los, se for o caso, me pergunto se quem ficou por mais tempo do que deveria também tem que pagar ao erário, ou se deveria ser por ele ressarcida…
Consta que, em São Paulo, capital, temos a bagatela de 20.000 moradores de rua que estão em uma das “divisões” que cito: são drogados por crack, bêbados contumazes, têm algum problema mental ou não conseguem se manter em um quartinho com banheiro que lhes custará mais do que irão ganhar, se e quando forem “recrutados”.
Há uma foto do Viaduto Bresser, que se localiza no Brás, um dos bairros onde a população procura para comprar o que quer que seja mais em conta e, de um de seus lados (o outro não foi fotografado) tem, uma ao lado da outra, bibocas de madeira, menores do que uma cabine de pedágio onde “moram 52 famílias”!
Aí, vamos ver as pessoas que se compadecem com eles e bolam, com uma vaquinha digital na Internet, uma lavanderia para os andrajos deles, chuveiros com “kit limpeza”…
Leio que a Prefeitura gasta, todos os meses, mais de 17 milhões de reais para cuidar dessa gente e pagar seus funcionários – e não consigo deixar de pensar em nossos diligentes vereadores que, segundo denúncia do último administrador que dali saiu na semana passada, sempre têm um quinhão para distribuir entre todos os eleitos, de todos os partidos…
Mais para o final da reportagem, vê-se a foto de um ex-morador de rua de origem portuguesa que, tendo chegado aqui com uma mão na frente outra atrás e encontrado uma alma caridosa que topou deixá-lo morar num prédio abandonado para que ele tomasse conta, conseguiu juntar dinheiro para comprar uma Kombi 85, deixou os entorpecentes, passou a fazer carretos. Enfim, a única história de final feliz que se lê…
Mais adiante, na revista, encontro pessoas veganas – um estágio bem mais xiita do vegetariano – tentando “direcionar” a vontade de seus filhos para “linha de pensamento”, o que conseguem com os dois menores. Mas, o maior, de 12 anos, que já dá suas “escorregadas”, não se submete aos rigores da dieta. Fico me questionando: a vida já é tão difícil, como será dificultá-la mais um pouco, obrigando as crianças a seguir uma rotina que não é a da escola, nem a dos coleguinhas e muito menos a dos professores?
É. Acho que a revista não curte mais assuntos de lazer.
Tradutora do inglês, do francês (juramentada), do italiano e do espanhol. Pelas origens, deveria ser também do russo e do alemão. Sou conciliadora no fórum de Pinheiros há mais de 12 anos e ajudo as pessoas a “falarem a mesma língua”, traduzindo o que querem dizer: estranhamente, depois de se separarem ou brigarem, deixam de falar o mesmo idioma… Adoro essa atividade, que me transformou em uma pessoa muito melhor! Curto muito escrever: acho que isso é herança familiar… De resto, para mim, as pessoas sempre valem a pena – só não tenho a menor contemplação com a burrice!