3 de outubro de 2024
Sergio Vaz

Parece que foi ontem

E já faz cinco anos que ela nos alegra todo santo dia.


Parece que foi ontem.
Disse isso pra Marina, no domingo agora.
Estávamos brincando na minha sala, ela, a avó e eu, e aí, num momento qualquer, provavelmente quando algum de nós fez referência ao aniversário dela que chegava, olhei para aquela criaturinha tão doce, tão fofa, tão esperta, tão alegre, e fiz a exclamação:
– “Parece que foi ontem.”
Não me lembro se Marina verbalizou a pergunta “O que é isso, vovô?”, ou se eu apenas vi a pergunta nos olhões sempre vivíssimos, faiscantes dela. E aí, como volta e meia faço, comecei a dar uma longa explicação – um papo comprido, detalhado.
Quando o avô vem com essa coisa de longa explicação, Marina em geral ouve em silêncio, demonstrando estar prestando a maior atenção – e dá para ver pela expressão que ela está processando as informações, colocando os dados no hard disk e fazendo as conexões.
Muitas vezes Marina me contesta, diz que estou errado, que não é assim, que não é assado. Às vezes retruca com dureza e, se o pai ou a mãe estão presentes, ela é repreendida por usar esse tipo de tom com o avô. Às vezes o tom excessivamente bravo dela ao me contestar me irrita um pouquinho, mas em geral levo na maior. Há várias décadas que já desapareceu da face da terra aquela coisa do tempo dos meus pais, de reverência absoluta aos mais velhos. E é ótimo ver que ela tem lá as posições dela e as põe na mesa, firme, segura.
Faz cinco anos, e parece que foi ontem.
Quando Marina começou a chegar, mesmo antes de nascer, trouxe de volta a alegria que minha filha tinha perdido ao perder a mãe. Foi a primeira bênção que ela nos deu, a todos.
No final de 2014, fiz um texto com o título “O ano em que Marina nos fez felizes”. “Marina já havia nos feito felizes em 2013. Mas em 2014, em que entrou com 9 meses e meio, nos fez mais felizes ainda, toda crescendo, toda a cada dia aprendendo mais coisas, aumentando o repertório, ampliando os conhecimentos, a cada dia se comunicando mais com a gente, interagindo, provocando, instigando, pedindo, exigindo, oferecendo. Acompanhar o desabrochar da inteligência de uma criança é uma das experiências mais fascinantes que pode haver. E ninguém tem mais condições de fazer isso do que os avós.”
E mais adiante eu falava dessa bênção que foi Marina ter trazido de volta a alegria da mãe: “Que maravilha é ver minha filha alegre que nem pinto no lixo. O que ela enfrentou em 2010, meu Deus, ninguém merece. Aí veio Marina, e nunca minha filha tinha sido tão feliz na vida. Estar com Marina, no começo da noite, e ver o rosto de minha filha se iluminar ao ver a filha dela, quando chega em casa depois do trabalho, não tem preço.”
Há exatinhos 5 anos, no dia em que Marina nasceu, escrevi:
“Acho que nunca tinha visto minha filha tão feliz. Nem o Carlos tão bobo de felicidade. (Incrível como ele soube segurar Marina pra tirá-la do colo da Fê pra colocá-la, com a maior suavidade, no bercinho ao lado da cama; eu não tinha essa cancha para segurar a Fê.) E eu que achava que daquele mato não saía mais cachorro… Saiu uma Marina pequetita, mignon, como a avó materna – e já houve quem garantisse, de pé junto, que o nariz é do Carlos, mas a boca é da Fernanda. Mary, a avó de coração, foi mais longe: disse que a boca é de Vaz. Os dedos da mão, o avô reparou, são longos – bons para teclado. Vó Mary reparou que são dedos longos como a da vó Maria Luísa.”
Cinco anos depois, claro que acho que ela tem um monte de coisas da mãe. Cara duma, focinho doutra, como se dizia em Minas. Por exemplo: o jeitinho com que chega nos lugares desconhecidos ou em que há gente desconhecida e fica toda tímida, calada, quieta, observando, apreendendo, antes de se soltar. Igualinha que nem.
A mãe acha que ela é igualzinha ao pai – e dois dias atrás ela disse que quer ter a mesma profissão e a mesma arte do pai. Às vezes acho que ela puxou muita coisa foi da vovó Mary, por osmose.
Ela parece um pouquinho com cada um de nós, talvez, mas obviamente é muito ela, única, inimitável, insubstituível. Um poço de doçura, que é a característica dela que mais me impressiona. É carinhosa, grudenta, gosta de pegar, abraçar, beijar, e não tem receio algum de fazer declaração de amor – muitíssimo antes ao contrário. Ah, que continue assim, sabendo exprimir o que sente e gostando disso.
Criaturinha abençoada, meu Deus do céu e também da terra!
Parece que foi ontem, e já faz cinco anos que ela nos alegra todo santo dia.

O Boletim

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