23 de abril de 2024
Editorial

O meu paradoxo com o STF

Foto: Arquivo Google – BBC

Todos, que vêm lendo meus editoriais há algum tempo, sabem o quanto eu desaprovo a atuação da maioria dos ministros do STF. Só cumprimentaria, pessoalmente, os Ministros Fachin e Barroso. Todos os demais, se eles me estendessem a mão, eu viraria as costas e, se não corresse o risco de ser preso, conforme o Presidente Toffoli propôs, daria um dedo ou uma banana pra eles.
No entanto, na decisão de ontem, considerando que eles estavam julgando UM HABEAS CORPUS (HC) específico, eu tenho que dizer que concordei com o resultado e que não poderia esperar outro, tecnicamente falando, é claro…
Sei que a população está hoje gritando, alguns beira da histeria, contra os ministros que votaram a favor do HC, mas, infelizmente, o voto deles foi o mais correto juridicamente falando.
Eu também gostaria que os presos da Lava-Jato continuassem presos e os ainda soltos (tipo Aécio), já estivessem na cadeia, sem privilégios, mas infelizmente nosso processo jurídico não funciona assim. Há muitas brechas, que permitem, aos endinheirados (sim , porque aquele defendidos pela Defensoria Pública não têm este direito), se utilizarem delas para se manterem soltos “até trânsito em julgado”.
Acho que nesta expressão está o nosso maior problema: TRÂNSITO EM JULGADO!
A Constituição diz, expressamente, que o TRÂNSITO EM JULGADO ocorre quando se extinguem, em todas as Instâncias, todos os recursos previstos no CPP ou no CPC, dependendo do caso, e daí podemos aplicar a pena prevista no julgamento.
No atual entendimento do STF, a condenação em Segunda Instância, é motivo suficiente para o possível e imediato cumprimento da pena prevista. Sim, foi 6×5, mas é o atual entendimento. Por isso Lula está preso!
Sim, sei que isto ainda está sub judice e será uma disputa ferrenha… e alguns membros, e vocês sabem quais, estão doidos para verem estas figuras fora do STF para que tenhamos um Tribunal Superior, realmente da nossa elite jurídica, como sempre deveria ser, pra mim, sem interferência dos demais Poderes, ou seja, eleição dentro do Judiciário para a escolher, não só os Procuradores, mas também os Ministros dos Tribunais Superiores, cujo mandato tem que ter data de início e término, deixando de ser vitalício. O Poder Judiciário deve ter a autonomia para escolher seus líderes, mas isto é assunto para outra oportunidade.
No momento, quero tratar da decisão de ontem.
Em primeiríssimo lugar, quero parabenizar o Presidente Toffoli (nunca pensei em dizer ou escrever isto), mas ele foi prudente, equilibrado e cônscio de seus deveres de equidade, qualidade exigida e primordial para um juiz, o qual ele não é, pois nunca passou em concurso para este cargo…  mas, de novo, isto também é assunto para outra oportunidade.
Sabedor de que a decisão de ontem, embora restrita a um único HC, poderia suscitar dúvidas e daí, uma enxurrada de pedidos para retorno à Primeira Instância dos processos em que o réu não delator, não pôde falar depois do réu delator, o Presidente do STF tomou uma decisão acertada.
Sei que isso é difícil de o leigo entender, mas é um dos princípios básicos do nosso Sistema Jurídico: O RÉU FALA SEMPRE DEPOIS DO ACUSADOR. É o Princípio do Contraditório.
Isso por quê? O réu, segundo a Constituição tem o direito à ampla e irrestrita defesa, logo, como ele poderia falar antes do final da acusação? O acusador pode trazer novos fatos ao processo, dos quais o réu não teve a devida oportunidade de se defender… principalmente nas Alegações Finais, onde, após o que, ninguém mais fala no processo.
A decisão divide, corretamente, os réus em duas ou três categorias, ou sejam: réus em processo onde não houve delação premiada de nenhum deles; réus em processos individuais, não baseados em delações premiadas; e, por último e a mais importante para este caso, aquelas em que há, num mesmo processo, como litisconsortes – explicando aos leigos – “um processo com vários autores ou vários réus”, -em que um réu ou mais de um, delata os demais réus. Daí os delatados não teriam mais como se defender das novas acusações ou ilações dos réus delatores.
Nestes casos, quando dentre os vários réus, algum ou alguns resolvem aderir à delação premiada, hoje denominada Colaboração Premiada, se você usa, e é obrigado  constitucionalmente a seguir  o princípio do contraditório, o réu deverá falar sempre depois do acusador (como eu posso me defender de algo que não sei sobre o que estou sendo acusado?), mas cabe ao juiz, dar às duas partes o mesmo tempo para se pronunciar e apresentar as ALEGAÇÕES FINAIS.
Agora imaginem a situação: 2 réus, por exemplo, denunciados por homicídio, em que um deles resolve aderir à Delação Premiada. Ok, ótimo, assim poderemos esclarecer o crime e punir o verdadeiro culpado. Lógico que se o delator falar depois do outro réu não delator, este último ficará impedido de se defender, pois já apresentou sua defesa nas Alegações Finais… daí ele teria sido nitidamente prejudicado no processo legal e a Constituição veta isto.
Dá bem pra entender, ou seja, eu preciso saber exatamente do quê e por quê, estou sendo acusado para poder ter meu amplo direito à defesa confirmado.
Se eu acusar, depois de o réu finalizar sua participação no contraditório, e eu apresentar novas provas, o normal é se abrir vista ao réu para que se manifeste, mas, de acordo com os Códigos de Processo Penal e Civil, o previsto é justamente o contrário, ou seja, o réu só fala depois que todas as acusações sobre ele sejam feitas, permitindo a ele se defender de todas as acusações, para garantir o direito da ampla defesa.
Por isso acho que a decisão do STF de ontem, CONSTITUCIONALMENTE, foi correta, embora eu, como a maioria, torcesse contra.
Graças à atuação do Presidente Toffoli e à ausência (que eu não entendi) do Ministro Marco Aurélio (devia estar morrendo, internado num CTI, para justificar sua ausência num plenário tão importante). Não fora isso, e não importando para a decisão, valeu para fortalecer a decisão do Ministro Toffoli… de novo – achei que jamais diria ou escreveria isto na minha vida – mas…
Bem, com a decisão, como ficamos?
Temos agora três opções:
A primeira: criar uma Súmula Vinculante, obrigando que todos os processos onde aconteceram fatos semelhantes ao deste HC, terão que voltar à Primeira Instância;
A segunda: a decisão valerá, segundo a proposta altamente consciente e com a precaução devida, do Ministro Barroso de que esta decisão deveria valer somente daqui pra frente. Esta seria, pra mim, a decisão correta…
A terceira: a extensão da decisão valerá apenas para os processos idênticos ao julgado e necessitará de requerimento da parte interessada à Instância Superior competente.
Sei que tomarei porrada de muita gente, mas estou analisando tecnicamente, como advogado que fui (estou aposentado nesta “função).
Desta vez, apesar de estar contra o que nós (sim eu me incluo na opinião geral) esperávamos o contrário, o STF acertou!
Desta vez, estou concordando com o STF…

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

Advogado, analista de TI e editor do site.

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