3 de maio de 2024
Walter Navarro

A gente somos canibais de nós mesmos


E somos antes que a terra nos coma, cem gramas, sem dramas. Por que que a gente é assim?
Ora pícolas! Porque a gente somos inútil.
O agora ex-ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, engrossou o cordão dos milhões de desempregados.
Sinceramente, ele pode ter feito e falado muita asneira, mas dizer uma grande verdade, foi a gota d’água.
Vélez pode até estar arrependido ao confessar, sob tortura, claro, que foi “infeliz” ao afirmar que brasileiro age como “canibal” em viagens ao exterior.
Vélez merecia ser demitido é por não saber o que é canibal. Com certeza até temos canibais no Brasil, mas errou. Na verdade, brasileiro no exterior não sai comendo gente. Isso é coisa de japonês e alemão. Muito brasileiro no exterior é como brasileiro no Brasil: selvagem, desonesto, bárbaro, vândalo e idiota.
Vélez está coberto de razão quando afirmou que brasileiro no exterior, nem todos, “rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião, ele acha que sai de casa e pode carregar tudo. Esse é o tipo de coisa que tem de ser revertido na escola”.
Ops! Brasileiro também não rouba assento, rouba o colete salva-vidas!
Brasileiro faz isso no Brasil, por que não faria lá fora?
Tem até ex-presidente em Curitiba e uma piada pra confirmar nossa natureza de jeitinho, de levar vantagem e de ser amigo do alheio: “O cara troca de geladeira e coloca a antiga na rua, para quem quiser. O tempo passa e ninguém pega. Então, ele faz um cartaz com um preço, tipo R$ 100 e, com fita adesiva, cola na geladeira, ainda na calçada. Pronto. Meia hora depois, levam a geladeira. Sem pagar, óbvio”.
Amigo meu de Barbacena, arquiteto, um gozador, foi me visitar em Paris. Ele não falava francês, uma vez saiu sozinho e voltou rindo.
Perguntei o motivo de tanta risada e ele: “Waltinho, tive uma ideia genial pra brasileiro que faz merda em Paris. Basta ele começar a falar: ‘Pero, y nosotros? Mi Buenos Aires querido. Maradona es mejor que Pele. Os argentinos que levem a culpa’. Achei genial, mas nunca precisei usar desta artimanha. Além de falar francês, “sorry periferia”, não sou chegado a roubar, gritar, quebrar. Dou “Bonjour”, falo “merci” e peço por favor. Não dói, juro.
Seta anos antes, em Amsterdam, 1982, eu estava no Museu Van Gogh. De repente, entra uma turba barulhenta, falando alto e fazendo piadinhas em frente aos quadros: “Olha este aqui, com boquinha de viado… Olha aquele ali, meu sobrinho faz igualzinho…”. Brasileiros!
Coisas de gentinha de pouco estudo, como diz outro amigo meu de Barbacena.
Em Londres, muitos anos depois, brasileiros me ensinaram a “roubar energia”. O aquecimento funcionava com moedas, “pound”, libra. Moeda bonita, pesada. Eles descobriram que, jogar certas moedas brasileiras ou fichas de telefone na máquina rendia o mesmo efeito e ficava muito mais barato.
Em Paris, compravam discos em promoção e, com uma nota fiscal antiga, trocavam os CDs por outros, com preço normal, mais caros.
Em Nova York, brasileiros e similares que nem leem inglês, jogam uma moeda nas máquinas que vendem jornal. Em vez de pegar um, levam três. Só pelo prazer de levar vantagem. Só de brincadeira…
Vélez está certo. Honestidade a gente aprende primeiro em casa, depois na escola.
No Brasil, de vez em quando, vira manchete o faxineiro que acha dinheiro e devolve, mesmo precisando. Mas a maioria… Esqueçam um celular num táxi ou numa mesa de bar…
“No ranking do Mapa da corrupção de 2015 feito pela Transparência Internacional Brasil Hoje, o Brasil está em pior colocação do que nações africanas, como Namíbia e Botsuana. Os escândalos envolvendo a Petrobrás ajudaram a rebaixar o país, que caiu do 69º lugar no ranking anterior para o 76º na edição atual”. Imaginem quando descobrirem BNDES, as Belo Monte…
Coreia do Norte e a Somália são os mais corruptos. No extremo oposto, entre os países menos corruptos, aparecem a Dinamarca e a Finlândia.
PS: Petrobras com P de PT. Vélez foi demitido por falar o óbvio. Haddad foi ministro da Educação de 2005 a 2012. Precisa escrever mais?

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

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