29 de abril de 2024
Editorial

Sobre o caso das joias

Imagem: Google Imagens – Portal Política

Quando temos, no governo, um assunto grave a ser tratado, devemos ter alguns cuidados: quem não tem nada com o assunto não deve se manifestar e quem tem tudo a ver com o assunto também não deve se manifestar, salvo nos autos do respectivo processo legal, até para não vazar informações vitais para a investigação.

Sim, obviamente, estou falando do caso das joias presenteadas, ao ex-presidente e à ex-primeira-dama, ou ao governo brasileiro, pela Arábia Saudita.

Recusar presentes de nações amigas é sempre uma encrenca diplomática. O Itamaraty já determinou que a regra é aceitá-los sempre. No entanto, se for excessivo, vai para o Acervo da Presidência e não para a(s) pessoa(s).

Mas como julgar o “excessivo”? Personalístico ou personalíssimo, diz a regra. Mas quem julga o que é personalístico? Um relógio seria personalístico? Um brinco ou um colar o seriam?

No momento, há uma evidente caça às bruxas da famosa herança maldita, daí a encrenca formada.

Mas voltando ao tema de meu parágrafo inicial, sobre quem deve ou não deve – e como – se manifestar sobre este assunto.

Vou citar dois exemplos…

O ministro Paulo Pimenta, ministro-chefe da Secretaria de Comunicação. Figura conhecida. Deputado federal mais votado do PT. Relator de CPI e integrou diversas comissões, ou seja, é uma pessoa experiente. Não ocupa seu atual cargo por acaso. É jornalista, sabe como se comunicar e, por isso podemos cobrar dele qualquer frase que ele tenha dito.

Na semana passada, este ministro, que não investiga e nem cuida de qualquer investigação, ou seja, não é policial ou procurador, foi ao Twitter e postou que “…as provas contra Bolsonaro e a ex-primeira-dama, no caso das joias, são robustas”. Ele disse que as joias foram apreendidas na Receita Federal e que Bolsonaro, inconformado, em quatro oportunidades tentou reaver os presentes que vieram escondidos para o Brasil. Disse ainda que Bolsonaro mobilizou mais quatro ministérios e alguns militares para recuperar estes mimos, referindo-se ainda à ex-primeira-dama como “Micheque” e ao ex-presidente como “criminoso”.

Nesta postagem, ele faz juízo, ironiza, brinca com palavras e é agressivo. Não deveria ser assim.

O segundo exemplo é o Ministro da Justiça Flávio Dino. Advogado, Professor de Direito, Juiz e ex-governador. Seu ministério cuida de muita coisa importante. Começa pela Polícia Federal, combate à pirataria, direito do consumidor, lavagem de dinheiro e mais um monte de outras coisas.

O que se esperaria dele? Esperaríamos que ele fizesse inveja aos demais nomes que já ocuparam sua atual cadeira. Que ele agisse com compostura, sobriedade, serenidade e austeridade, mas ele vai ao mesmo Twitter falar sobre o caso das joias.

Disse que “…isso pode configurar crime de descaminho, peculato, lavagem de dinheiro e outros possíveis delitos que poderão surgir nas investigações”. Disse ainda que há indícios fortes de cometimento de crime. Não deveria ser assim. Haverá uma investigação que determinará se houve crime e, em caso positivo, que crimes se enquadraria. Ele não é o Delegado, o promotor ou mesmo procurador. É “apenas” ministro!

Estes dois exemplos mostram que, enquanto ministros, quando falam, eles não estão expressando a opinião pessoal deles e sim a do governo.

Claro que eles podem ter suas próprias opiniões e achem que têm o direito de se manifestar, mas ministros, quando falam, expressam a opinião do governo ao qual eles servem. Não pelo conjunto do governo, mas como integrantes do governo em posições importantes.

No caso, um é o responsável pela comunicação do governo. O outro é o responsável pela Justiça do país. Não estamos falando de ministérios de segunda classe, apenas criados para atender ao toma-la-dá-cá do governo com o Congresso, como Pesca e aquicultura, p

Povos indígenas, Igualdade racial e outros. Absolutamente desnecessários e criados apenas para enquadrar os indicados pelos aliados no Congresso.

Daí volto ao que eu disse no início: a opinião de quem nada tem nada a ver com a história não interessa e não colabora. A opinião de quem tem tudo a ver com a história, interessa, mas quando sai, não colabora, ao contrário, prejudica a investigação… desde que esta seja justa e segundo “o manual”.

Resumindo:

Então, quem não tem nada a ver com a história não deve falar, porque nada tem nada a ver com o fato (Paulo Pimenta). Quem tem tudo a ver com o fato não deve falar, porque tem tudo a ver com o fato (Flávio Dino).

As investigações de um caso como esse são muito delicadas. Bolsonaro tem um problema grave nas mãos. A acusação não é trivial. É grave e a intenção é bem clara para todo mundo: querem fazer com Bolsonaro o que, supostamente, a Lava-jato fez com Lula.

Não importa se os presentes foram pessoais ou personalísticos. Se o foram, cabe ao ex-presidente solicitar à Arábia Saudita que diga que o presente foi específico para cada um deles, caso contrário, os ditos presentes deverão ser incorporados ao acervo nacional. Simples assim.

Só que não há um cartão e nenhuma mensagem de congratulações, de agradecimento ou qualquer outro adjetivo que informe a verdadeira razão do presente. Nenhum outro presente aos presidentes do Brasil, chegaram a este valor. Aliás, nem mesmo aos demais presidentes no mundo.

Nada disso importa. O valor é comercial e estimado, mas como as joias não serão comercializadas, estes 16 (ou mais) milhões de reais são da cabeça de avaliadores.

Quantos presentes – ou bens – Lula levou após sair da presidência? O apartamento, no mesmo andar, de sua residência em São Bernardo, foi alugado apenas para guardar os “mimos” que ele levou. Alguns legais, mas a maioria não! O depósito onde ficaram os mimos foi pago pela Odebrecht, comprovadamente. Foram 434 recebidos por Lula e 117 recebidos por Dilma.

Alguns dos mimos de Lula foram encontrados em um cofre do BB. Outros foram localizados no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Os mimos de Dilma foram encontrados num Galpão da Cooperativa dos Trabalhadores Assentados na Região de Porto Alegre, em Eldorado do Sul (RS).

Não sei os valores dos presentes, mas há ainda obras de arte que Lula teria levado do Alvorada em sua mudança.

Mas não se pode errar porque o outro errou. Um erro não justifica o outro. Bolsonaro errou em não declarar os presentes, sendo pessoais ou não, deveria tê-los declarado. Um dos mimos passou despercebido, o outro não.

Cabe a ele agora, informar que os presentes devem ser incorporados ao acervo. Minimiza o problema, mas não o resolve porque há outras coisas a serem avaliadas…

O embaixador saudita no Brasil está calado. Ninguém o contactou para inquirir sobre o presente? Se o fez, qual a resposta? Para resolver este imbróglio, o governo possui a PF, o MPF, a Receita Federal e vários outros órgãos competentes que investigam estes eventos.

Precisamos tomar cuidado com o fato de membros do governo quererem tirar casquinha do ex-presidente. Por quê? Qual o objetivo? Qual o propósito? Raiva? Vingança?

Talvez isso explique, porque com raiva, você age com o fígado. Com raiva você age de maneira imprópria. Pode até se arrepender depois, mas já será tarde.

Aqui mostrei dois exemplos.

Às possíveis perguntas, o Ministro das Comunicações deveria dizer que: “este assunto é estranho à pasta que eu presido, logo não devo me manifestar sobre isso”. O Ministro da Justiça deveria dizer que: “como ministro da justiça não devo me manifestar sobre assuntos que estão sendo investigados pelos órgão competentes de meu ministério”.

Por que não fizeram isso?

Não importa aqui se eles acertaram ou não em declarar sua opinião. A questão é a vontade de bater. A vontade de criticar. A caça às bruxas…

O importante é que agentes políticos devem se manifestar apenas quando os assuntos sejam do interesse direto de sua pasta, resguardado o sigilo para que a investigação siga seu plano normal, sem influências externas.

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

Advogado, analista de TI e editor do site.

1 Comentário

  • Eduardo 17 de março de 2023

    Desculpe, Valter, sempre fui a favor de seus editoriais, mas este me fez pasmo. Como já não bastasse a saída do Nelson Motta, aquela cronista negacionista, Lucia sei lá das quantas. agora isso.
    Estou me despedindo do site, boa sorte a vocês.

    Eduardo

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