29 de março de 2024
Colunistas Ricardo Noblat

Decisão do Supremo Tribunal Federal sobre orçamento secreto não é para ser negociada, é para ser cumprida

Rafaela Felicciano/Metrópoles

De Jair Bolsonaro, diz-se com razão que ele só enfraquece a democracia, desde que se elegeu presidente da República. E do Congresso comandado por Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL), empenhado em desobedecer à ordem do Supremo Tribunal Federal de revelar o nome de deputados e senadores beneficiados pelo orçamento secreto da União? O que se dirá?

Orçamento secreto, por si só, é um atentado à Constituição, que estabelece que “os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência devem ser observados pela administração pública direta e indireta no desempenho de suas funções”. Portanto, que história é essa de esconder quem recebeu dinheiro do orçamento e a que obras públicas ele foi destinado?

Disse a ministra Rosa Weber em decisão aprovada pela esmagadora maioria dos seus colegas de tribunal:

“Enquanto as emendas individuais e de bancada [ao Orçamento da União tal como se conhece] vinculam o autor da emenda ao beneficiário das despesas, tornando claras e verificáveis a origem e a destinação do dinheiro gasto, as emendas do relator [a parte secreta do orçamento] operam com base na lógica da ocultação dos efetivos requerentes da despesa.”

Pacheco esteve com Rosa. A conversa foi rápida e ele saiu de mãos abanando. As emendas do relator são controladas por Pacheco, presidente do Senado, e Lira, presidente da Câmara. O que eles pretendem é que o tribunal deixe por isso mesmo o que ficou para trás – em troca da promessa de que, daqui para frente, tudo será diferente. Ou seja: que o que foi feito de errado, errado fique.

Alegam que não existia lei que os impedisse de fazer o que fizeram. Como não existia? A Constituição não vale? Só passaria a valer a partir da decisão de Rosa confirmada por seus pares? A decisão da ministra foi além, com o apoio da maioria dos ministros. Ela suspendeu o pagamento de emendas com base no orçamento secreto. E deu um prazo de 30 dias para que tudo venha à luz.

Só às vésperas da votação na Câmara da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criou o Auxílio Brasil e aplicou o calote no pagamento de dívidas judiciais vencidas (precatórios), o governo prometeu liberar quase R$ 1 bilhão para deputados que votassem como ele queria. Sim, é sobre o uso escandaloso de dinheiro público para a compra de votos de deputados e senadores.

O mensalão do PT, em 2005, foi por fora do Orçamento da União. O mensalão de Bolsonaro é por dentro. Transparência no pagamento de emendas poderá desarrumar a base de apoio do governo no Congresso, expondo deputados e senadores que venderam seus votos. Servirá também para que se investigue se o dinheiro liberado para obras foi de fato investido em obras.

Decisão judicial não se negocia, respeita-se e cumpre-se. A palavra, outra vez, está com o Supremo Tribunal Federal.

Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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