Não é por acaso que ela já foi cenário de filmes importantes como O Evangelho Segundo São Mateus de Pasolini, A Paixão de Cristo de Mel Gibson, e o último filme de Daniel Craig como James Bond, apenas para citar alguns. Matera é uma cidade extraordinária, literalmente fora do comum.
Está localizada na província da Basilicata, ao sul da Itália continental, bem próxima da fronteira com a província da Puglia. Possui uma parte muito antiga, de cavernas escavadas em rochas calcárias, uma parte menos antiga, vamos dizer assim, com construções barrocas na região alta da cidade e uma parte moderna mais afastada do centro histórico.
O que a torna tão especial é a existência dos Sassi de Matera, cavernas habitadas continuamente desde os tempos paleolíticos até a década de 1950. Isso faz Matera ser uma das cidades habitadas mais antigas do mundo.
Um pouco da história:
A Matera mais antiga está localizada em um terreno de rochas calcárias, na beira de um desfiladeiro com 70 a 80 m de profundidade. Nessas rochas foram escavadas cavernas que foram habitadas desde a pré-história. Essas cavernas são os “sassi” (plural do “sasso”, que em italiano significa pedra ou rocha) que, na realidade, são um conjunto de cavernas/moradias, muitas vezes umas sobre as outras, sem qualquer ordem, que formaram um núcleo urbano subterrâneo, onde o homem habitou ou se refugiou desde a pré-história até os tempos atuais.
Em tempos posteriores, as cavernas também foram ocupadas por monges greco-bizantinos, e por isso há uma quantidade de igrejas rupestres, muito nos moldes das igrejas da Capadócia. Mais adiante as cavernas sofreram algumas modificações, como fachadas de pedra ou de tijolos.
A partir do século XVII a parte alta da cidade foi sendo ocupada. Essa é a parte barroca, com seus palacetes, praças e novas igrejas. Até uma grande cisterna subterrânea, a Palombaro Lungo, foi criada para abastecer a nova cidade. Aliás, é possível visitá-la e é muito interessante.
Quanto mais a parte barroca de Matera se desenvolvia, maior era o contraste com as moradias nas cavernas. Os Sassi não tinham água nem luz nem ventilação natural. Os ambientes insalubres eram, geralmente, habitados por agricultores pobres que dividiam o espaço com seus animais. Por incrível que possa parecer, a situação permaneceu assim nos Sassi até a década de 1950. Foi o escritor e pintor Carlo Levi, que estava exilado próximo a Matera, quem primeiro denunciou o péssimo estado dos Sassi e só então o governo determinou a remoção de seus habitantes.
Os Sassi de Matera foram abandonados até a década de 1980, quando uma lei federal destinou verbas para restaurar as cavernas. Hoje os Sassi são habitados com outras condições de moradia, e vários deles foram transformados em hotéis e restaurantes, e se transformaram na grande atração turística da cidade.
Os Sassi de Matera são Patrimônio Mundial da Unesco desde 1993.
O que fazer:
Chega-se a Matera pela parte mais nova da cidade. Lá estão a estação de trem e os estacionamentos públicos, e construções pouco interessantes. Após curta caminhada o cenário muda e construções barrocas começam a aparecer. E por aí começam os atrativos da cidade.
A primeira parada é na Piazza Vittorio Veneto, que é a praça principal da cidade alta, rodeada por belas construções barrocas como o Cine Teatro Comunale e a singela Chiesa di Mater Domini. É na praça que fica o acesso à cisterna subterrânea, a Parombalo Lungo, com capacidade de armazenar 5 milhões de litros d’água.
Mas talvez o maior atrativo da Piazza Vittorio Veneto é o belvedere, de onde se tem uma primeira visão impactante da parte mais antiga de Matera.
Ela é dividida em dois bairros: Sasso Caveoso e Sasso Barisano, onde há cavernas e também construções escavadas nas rochas. Nesses bairros há casas com fachadas de pedra, mas não se engane: por dentro são escavadas na rocha também. Na evolução das cavernas originais, que parecem cavernas trogloditas, e com o processo de restauração, muitas delas se transformaram em residências bem razoáveis de se viver. Algumas dessas casas/cavernas estão abertas à visitação, vale conferir. E outras hoje abrigam restaurantes e hotéis.
Caminhar e se perder pelos bairros Sasso Caveoso e Sasso Barisano é o maior atrativo da cidade. É um verdadeiro labirinto, entre escadarias, recantos, pátios e uma arquitetura surpreendente.
No Sasso Caveoso está localizada a Catedral de Matera. De lá a direção a seguir é o “calçadão” na beira do desfiladeiro. Caminhar ao longo do desfiladeiro proporciona imagens espetaculares. Além das vistas, há muito o que ver como a Chiesa di San Pietro Caveoso e a igreja rupestre de Chiesa Rupestre di Santa Maria di Idris, logo atrás.
Uma das igrejas que mais gostei foi a Chiesa di San Giovanni Battista, terminada no século XIII. Ela é um exemplar muito interessante do estilo românico da região da Puglia.
Matera é uma cidade única, e, na minha opinião, é preciso de um bom guia local para conhecê-la bem. Assim como sugiro para viagens à Capadócia, o guia pode fazer toda a diferença. Sugiro duas noites de pernoite, para dar tempo de conhecer e aproveitar bem a visita.
Por último, uma dica para Matera: ir até o outro lado do desfiladeiro até o Belvedere Murgia Timone. De lá há a vista mais linda de Matera. De dia a vista é a da primeira foto dessa coluna. Em dias sem sol, a vista é como a da foto abaixo, que com um zoom dá para ver detalhes incríveis dos Sassi. E em outros dias de sol, se puder esperar para ele se pôr, então a imagem é inesquecível!
“Arquiteta de formação e de ofício por muitos anos, desde 2007 resolveu mudar de profissão. Desde então trabalha com turismo, elaborando roteiros e acompanhando pequenos grupos ao exterior. Descobriu que essa é sua vocação maior.”
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