28 de março de 2024
Colunistas Mary Zaidan

Os sabujos

Antes, Nunes Marques era desembargado no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, onde deixou uma vaga aberta.

Não há Nunes Marques ou qualquer outro capacho que salve o desgoverno Bolsonaro. Por Mary Zaidan

Quinta-feira, 2 de junho: o ministro Kassio Nunes Marques suspende, monocraticamente, a cassação de dois deputados bolsonaristas, peitando decisões colegiadas do TSE. À noite, na sua live semanal, Jair Bolsonaro comemora a liminar dada pelo afilhado, volta a atacar as urnas eletrônicas e as cortes superiores. Sexta-feira, 3: o presidente desembarca no Paraná, domicílio do deputado estadual beneficiado Francisco Francischini (União Brasil), monta mais um palanque e renova ameaças ao TSE: “Vai cassar o meu registro? Duvido que tenha coragem de cassar o meu registro”. O PGR Augusto Aras se faz de morto. E, na velocidade da luz, o presidente da Câmara, Arthur Lira, reempossa Valdevan Noventa (PL-SE).

Mesmo bandeiroso e primário, o script funcionou, como muitos que Bolsonaro arma.

Todos os envolvidos sabem que as liminares serão derrubadas, que Francischini voltará a perder o mandato, que Noventa não manterá seu assento na Câmara. Mas o movimento coordenado cumpre outros objetivos: minar a credibilidade da Justiça e a coesão do STF no combate às fake news disseminadas via redes sociais – essenciais na campanha de reeleição. E, mais importante, tumultuar.

A liminar de 60 páginas de Nunes Marques para o caso Francischini parece ter sido elaborada pela equipe de Bolsonaro. Tenta excluir as redes sociais dos meios de comunicação, o que impediria conferir a elas o mesmo tratamento punitivo dado aos atos ilegais cometidos na tevê, rádio, jornais e revistas, além de criar um esquisito nexo temporal para os crimes eleitorais de abuso do poder econômico e veiculação de mentiras. Sem, é claro, levar em conta que pagar de forma ilícita, mentir e enxovalhar o outro ou uma instituição, seja no papel, na televisão ou no rádio, são crimes. Mesmo antes da internet.

O teatro protagonizado pelo ministro bajulador servirá para Bolsonaro questionar a “tipificação para fake news” – como se mentira precisasse de ser qualificada -, e incrementar o seu discurso contra o TSE e o STF, alvos que ele pretende que sua turba enfrente, até com armas de fogo – “em defesa da pátria” -, se o resultado eleitoral não lhe sorrir.

Não há surpresa nem novidade no método bolsonarista. Na maioria das vezes, os acertos são feitos como tergiversação, para desviar os holofotes de desconfortos envolvendo o chefe e a primeira família. Os fiéis aliados do Centrão, bem nutridos com cargos e orçamento secreto, são usados para atiçar pautas de costumes ou “jabutis” escandalosos quando os frangalhos da economia ganham a atenção do público. Tudo massivamente exposto nas redes sociais. Não raro, tem-se um combinado múltiplo para disfarçar insucessos contínuos do governo e esconder estranhas transações, como a mansão de R$ 6 milhões filho Flávio, também enrolado com rachadinhas.

O esforço e a dedicação do presidente para manter azeitada essa máquina de campanha e de autoproteção são espetaculares. E esse é o ponto. Quando se trata do país, sua inoperância, inapetência e desídia são gigantescas. Tamanha, que aliados próximos mostram preocupação com a pecha de preguiçoso, “do cara sempre de camiseta e sandálias”, que anda de jetski e motocicleta, passeia muito e não trabalha.

O problema adicional para o presidente é que a tática diversionista só tem funcionado pontualmente, sem apresentar resultados em sua aprovação. Muito menos em fazer recuar a altíssima rejeição, consolidada acima de 50% – 54% segundo o último Datafolha.

Sob pressão, com o país mergulhado cada vez mais na inflação, na fome e na miséria, Bolsonaro tem repetido o batido esquema com exaustiva frequência, colocando-o a perder. Para além dos seus fanáticos – e até eles já devem estar cansados -, a cantilena anti-STF, fraude nas urnas, povo armado não será escravizado, tem tido baixo retorno. Na última parte do bordão, com adesão negativa: mais de 70% dos brasileiros são contra armas de fogo nas mãos de civis.

Sem alternativa, ele continuará insistindo no mesmo método, certamente recrudescendo no estímulo aos tumultos. Mas uma coisa é certa: não há Nunes Marques ou qualquer outro capacho que salve esse desgoverno.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 5/6/2022.

Mary Zaidan

Jornalista, mineira de Belo Horizonte, ex-Rádio Itatiaia, Rádio Inconfidência, sucursais de O Globo e O Estado de S. Paulo em Brasília, Agência Estado em São Paulo. Foi assessora de Imprensa do governador Mario Covas durante toda a sua gestão, de 1995 a 2001. Assina há mais de 10 anos coluna política semanal no Blog do Noblat.

Jornalista, mineira de Belo Horizonte, ex-Rádio Itatiaia, Rádio Inconfidência, sucursais de O Globo e O Estado de S. Paulo em Brasília, Agência Estado em São Paulo. Foi assessora de Imprensa do governador Mario Covas durante toda a sua gestão, de 1995 a 2001. Assina há mais de 10 anos coluna política semanal no Blog do Noblat.

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