12 de outubro de 2024
Colunistas Marli Gonçalves

Os normais dias seguintes


À esta altura você já deve ter se dado conta – assim como eu – de como é dura a realidade dos fatos, e que ano após ano a gente acredita que eles vão mudar como mágica à meia noite de um Ano Novo. E assim levamos a vida.
Teve mais uma vez quem pulou sete ondinhas, vestiu branco, saiu carregando uma mala em volta do quarteirão para chamar viagens, comeu lentilhas, chupou caroço de romã. Fora a calcinha, que essa é de praxe. A minha deste ano foi amarela. E a sua? Ah, você usa cuecas? Coloridas? Acredita que já tentei praticamente de todas as cores nessa longa vida? Testei até não usar. Nunca veio, nem o amor da vermelha, nem o dinheiro da amarela, nem… Esse ano para o ano que vem, andei pensando, vou tentar a verde, da esperança. Qualquer coisa direi que estava lutando pelo meio ambiente, contra o aquecimento global, pela legalização, coisas assim…
Tem também a de acender velas, tomar passes, oferecer oferendas, de não comer nada que cisca pra trás, e o que mais? Banho de ervas? Roupa nova? Estourou uma champagne, viu a rolha voar, com aquele estampido bom, abraçou e beijou quem estava por perto, e assim foi a tal noite feliz – sempre acho que é essa a Noite Feliz, não a de Natal, sempre mais envolta em tristezas.
Espero que não tenha acreditado na possibilidade de fogos de artifício não terem barulho. Balela! Só o dia que forem apenas virtuais, projetados, e acredite, a gente vai odiar. Nada como vê-los como são, sempre foram, explodindo em cores, formatos – aquele momento, aqueles poucos minutos especiais em que viramos crianças de novo.
Fez lista de decisões? Escreveu ou ficou só na cabeça, na intenção? Aliás, já pensou ou olhou para ela nesses poucos, mas longos dias, que já correram e ocorreram de forma assustadora? Devo perguntar ainda se já desistiu de algum item e sacou que tinha exagerado, exigindo muito de você mesmo. Acontece. A gente se promete cada coisa!
Ano após ano parece que tudo se acelera, e que os efeitos de Ano Novo estão cada vez mais efêmeros. Antes, aliás, costumava-se dizer por aqui que o ano só começava depois do Carnaval, mas já faz algum tempo que isso mudou, creio que desde que a globalização se instalou de vez entre nós, fazendo o país acelerar para não ficar mais trás ainda do que já está. Fica aí esperando, sem fazer nada, trabalha não, pra ver se as coisas caem do céu.
Bem, você também já ter conferido: que eu saiba, não ganhou a tal Mega da Virada. Esse ano, joguei – e eu nunca jogo na loteria, mas a mulher do horóscopo falou que podia ser, que havia propensão, probabilidades. Não custava nada acreditar. Um ponto, e olhe lá, em cada aposta.
Enfim, as rédeas do destino a gente até segura, mas o cavalo empina sempre em mais direções do que a vã consciência pode explicar. Passou a meia-noite, e já na outra meia-noite estávamos preocupados com o luto da guerra, com o que os dirigentes mundiais se divertem, com os botões que apertam, as ordens que gritam, com as bobagens que proferem aos borbotões, isso sim. Descobrimos ou lembramos que não somos os únicos agentes de nossos caminhos, onde inclusive andamos deparando com tantos seres do mal que dá vontade de nem sair de casa e passar o ano é gritando socorro.
Aguenta firme aí, temos mais 50 semanas. E pelo que já vimos, assunto não vai faltar.

Marli Gonçalves

Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon).

Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon).

    Deixe um comentário

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *