29 de março de 2024
Adriano de Aquino Colunistas

HiperBlog

Na luta pela sobrevivência o sujeito faz coisas às vezes impensadas, tolas, violentas, intempestivas ou calculadas, as quais, mais adiante, pode não se orgulhar.

A sobrevivência é uma determinação natural. Dela ninguém escapa.

Ela não poupa fracos ou fortes. Ricos, medianos ou pobres. Seres dóceis ou brutamontes, calculistas frios e determinados ou nostálgicos emotivos são obrigados a dar seu quinhão de vida para essa prova crucial da existência… ‘Eu estive aqui’, gravado no tronco da árvore da vida.

Pode-se lutar pela sobrevivência com rigor, elegância ou mesmo ostentação. Entretanto, ainda que os monges e iluminados creiam que dessa pecha estão salvos, o mínimo redutor comum da sobrevivência é despertado quando o primeiro sopro de oxigênio invade o pulmão da criatura que dela só escapa(ou vence?) com a morte.

Pelos idos dos anos 20/30 do século passado Walter Benjamin precisava de grana para continuar manter o esqueleto em pé e o organismo nutrido e funcionando. Nessa época escreveu uma série de roteiros para programas radiofônicos difundidos em Berlim e Frankfurt. A maior parte desses programas foi feita pela voz do autor. Apesar de não se orgulhar muito do trabalho que diz ter feito apenas devido a dificuldades financeiras, Benjamin foi um dos pioneiros para a expansão do rádio que surgira na Alemanha três anos antes.

Qual seria a motivação de tal decepção? Eis uma pergunta jamais respondida.

Imagem: Google Imagens – YouTube

A editora Nau lançou no Brasil o livro A HORA DAS CRIANÇAS – narrativas radiofônicas (projeto editorial da Rita Ribes Pereira com tradução de Aldo Medeiros) que reúne textos de 86 programas com periodicidade variada, 60 dos quais o próprio Benjamin se encarregou da leitura. Para quem gosta do autor trata-se de uma oportunidade para conhecer como o pensador via e se comunicava com o mundo das crianças da sua época, as quais dedicava uma hora de leitura.

Vendo hoje a grade de produtos que o sistema de comunicação empresarial hipermoderno oferece às crianças, uma questão se destaca.

Poucos anos após o termino da programação radiofônica que durou aproximadamente três anos, Benjamim veio a conhecer e sofrer na própria pele a dura realidade e as trágicas consequências que se impuseram sobre a sociedade alemã da qual Benjamin se tornou uma vitima.

Quantos assíduos ouvintes da “Hora das Crianças” tornaram-se instrumentos da vontade nazista?Quantos tiveram seus sonhos e esperanças ceifadas, antes de poderem experimentar a liberdade de ser e as coisas da vida?

Hoje se discute se existe, de fato, uma relação entre a grade de ofertas de produtos pelo sistema de comunicação de massas o consumismo desbragado e a escalada da violência perpetrada contra crianças.

No campo dos estudos culturais o ensaio de Benjamin “A Obra de Arte na Era da Sua Reprodutibilidade Técnica” (1936) descortinou a perspectiva da arte frente os novos meios tecnológicos de difusão. Entretanto, a previsibilidade sobre as consequências do uso desse sistema em grande escala permanece uma incógnita.

Não encontrei arquivos de voz da programação acima referida. Para compensar publico a seguir o link de um belo conto/poema de Walter Benjamin, que já postei tempos atrás.

Adriano de Aquino

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

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