7 de dezembro de 2024
Editorial

Quando teremos o fim do monocratismo no STF?

Davi Alcolumbre, o nosso atual presidente do Senado quer entrar para História.

Todo político almeja entrar para a História. Algumas vezes o faz por bem, outras, por mal. No caso específico de Alcolumbre, certamente será por mal. Aliás, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já entrou por mal há algum tempo, mas no momento quero me ater ao Presidente do Senado.

Foto: Google – Jota (meramente ilustrativa)

A insistência em sua reeleição, a princípio apoiado por Maia, mas agora este, meio que sozinho desistiu, me faz lembrar a infeliz figura de FHC que, quando foi eleito sabia que seu mandato seria de 5 anos sem direito à reeleição: jogo feito, regras conhecidas. Eleito para este mandato, começou a “trabalhar” nosso Parlamento para que o mandato presidencial fosse de 4 anos, com direito à reeleição, inclusive para ele. Isto diz bem do caráter dele…

A mesma coisa está fazendo Alcolumbre, tentando mudar as regras do jogo. A legislação, da forma como foi concebida, diz que os Presidentes da Câmara e do Senado não podem ficar dois mandatos seguidos na presidência de suas respectivas Casas dentro de uma mesma Legislatura. Seria até válido, e mais ético, ele propor esta alteração, se fosse o caso, para os próximos presidentes, mas quem está preocupado com ética, não é mesmo?

Mas ele será lembrado também, pela sua atitude engavetadora. Ele tem em sua gaveta mágica, um projeto de lei importantíssimo para limitar o uso de decisões monocráticas dos Ministros do STF, para falar apenas de um, que considero importantíssimo.

Estas decisões monocráticas mexem com o dia a dia da população. A força de uma só caneta no STF tem que ser diminuída, tem que ter limites. Devem valer sempre, em conjunto, as 11 canetas do plenário ou, no mínimo, as 5 de cada uma das Turmas… sim, as decisões monocráticas vão, depois, a plenário, mas aí depende de o Presidente do STF pautá-las. Pode levar meses ou anos…

A decisão monocrática é tão absurda que, imaginem esta situação hipotética: o Congresso Nacional aprova uma lei e um daqueles partidinhos que estão sempre contra tudo que não os beneficia, entra com uma ação de ADI (ação direta de inconstitucionalidade) no STF. Um ministro daquela Corte, pode, sozinho, derrubar esta lei, aprovada por nosso parlamento (Câmara, 530 deputados e Senado com 81 senadores) por maioria. Ou seja, ele tem mais “força” na mão do que um Poder Constitucional inteiro. Ele derruba a lei e assim ela permanece até que seja ratificada, retificada ou anulada em plenário.

Por este projeto, engavetado no Senado – as decisões monocráticas somente poderiam ser tomadas no recesso do Judiciário e, ainda assim deveriam ser confirmadas pelo plenário. Este projeto está pronto para votação desde setembro de 2019. Já passou por todas as comissões possíveis, só precisa ser pautado para o plenário, mas isso depende da mesa e, consequentemente, da vontade do Senhor Presidente do Senado…

A ausência da aprovação deste Projeto, dá permissão aos ministros do STF, monocraticamente, agirem, legislando, como têm feito alguns nos últimos tempos. Só para termos uma ideia, apenas 1% dos casos que chegam ao STF vão a plenário, o grosso é decidido monocraticamente. Absurdo!

Aí é que surgem os problemas: quando temos duas decisões monocráticas que se chocam é mais grave.

Recentemente o Ministro Marco Aurélio de Mello propôs acabar com isso, reduzindo este poder, pelo menos nas decisões que interfiram diretamente nos demais poderes. Evidentemente os demais ministros deixaram claro que não querem perder este poder. Sendo assim, a decisão teria que vir do Parlamento, e aí, o engavetador Alcolumbre não deixa.

Um ótimo exemplo é um caso que está em curso e que é bem conhecido que mostra que este monocratismo não funciona porque há interpretações diferentes para casos semelhantes.

A LEI DEVE SER CLARA E NÃO PERMITIR INTERPRETAÇÕES. Não se deve tentar imaginar “o espírito do legislador” ao fazer a lei. Não podem haver entrelinhas, mas, em algumas há, e aí é que entraria O PLENÁRIO DO STF para decidir, e acabam legislando, porque o Congresso se omite.

O caso que mencionei acima é a absurda decisão do – graças a Deus – quase ex-ministro Celso de Mello no que tange ao processo contra o Presidente Bolsonaro sobre uma suposta influência na PF. Este ministro decidiu, sim ELE decidiu, porque não é o que está na lei, que o depoimento de Bolsonaro tem que ser PRESENCIAL, ou seja, ele tem que ir lá depor.

Quando Temer ainda era o Presidente, o Ministro Barroso decidiu, num processo em que o então Presidente Temer era investigado – igualmente ao que agora é submetido o Presidente Bolsonaro – que o depoimento poderia ser POR ESCRITO, e assim foi. Ambos não são réus, são apenas investigados.

Agora vejam a absurda divergência das decisões monocráticas, como ambas acima foram.

Os dois ministros se valeram do mesmo artigo 221 do Código de Processo Penal (CPP). Óbvio que ambos leram o mesmo artigo só que o interpretaram de forma diferente. O que diz o referido artigo?

Não vou transcrevê-lo por que seria demais. Em resumo ele diz que o Presidente da República (e mais outras autoridades, devidamente listadas no artigo) poderão optar por prestar o depoimento por escrito, o que referenda a decisão de Barroso quanto a Temer, mas então, por que Celso de Mello quer obrigar Bolsonaro a depor presencialmente baseado no mesmo artigo?

Fui ver as decisões – sim tive saco pra isso.

Celso de Mello se baseou no fato de que o artigo 221 está num capítulo do CPP onde se trata das testemunhas e, sendo assim, Bolsonaro, sendo investigado e não testemunha não teria este direito… mas por que Temer o teve baseado no mesmo artigo?

Já o Ministro Barroso Barroso disse que, como no CPP não havia nada específico para um “investigado”, ele se valeria do tratamento dado pelo CPP à “testemunha”.

Decisões monocráticas conflitantes. O Plenário não decidiu à época de Temer, se assim o tivesse feito, o decano não poderia tomar uma decisão diferente. Não importa qual fosse uma ou outra, teria que ser a mesma.

É isso! Se o caso de Temer tivesse sido decidido em plenário, estaria formada a jurisprudência e não haveria a atual divergência.

Vejam o conflito: como podemos dizer quem está errado? Na verdade, o tema é que está errado por não estar previsto no CPP.

O caso atual foi a plenário e o Ministro Marco Aurélio já votou dizendo que concede a Bolsonaro o mesmo tratamento dado a Temer, ainda reforçando que: “… é inadmissível o critério de dois pesos e duas medidas num Estado de Direito…”.

Concordo inteiramente com ele… certo ou errado, o tratamento deve ser o mesmo.

O país precisa de estabilidade jurídica.

O Supremo não quer fazer isso, gosta do jeito que está.

O Congresso não quer fazer e o dono do problema tem nome e sobrenome: Davi Alcolumbre.

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

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Advogado, analista de TI e editor do site.

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