12 de fevereiro de 2025
Editorial

O STF x Operações policiais

Para esclarecer este problema, vou falar um pouco sobre a ADPF635 no STF.

A ADPF 635, proposta em 2019 pelo PSB, foi julgada pelo STF, com relatoria do ministro Edson Fachin e conduzida em conjunto com uma série de movimentos negros, de mães e familiares de vítimas da violência policial, de comunidades, além de organizações da sociedade civil, inicialmente inspirada na ação civil pública da Maré, proposta pela Defensoria Pública – RJ para a adoção de protocolos que visassem a redução da letalidade policial durante as operações, a “ADPF das Favelas”, como ficou conhecida, mira a adoção de medidas estruturais que possam frear e reverter políticas de segurança pública historicamente pautadas no racismo e na violência contra territórios negros e moradores de comunidades.

A Suprema Corte, então, determinou medidas para reduzir a letalidade policial, tais como:

Uso de câmeras corporais por policiais e nas viaturas; (ainda uma discussão e, segundo os governos, em fase de implantação)
Aviso antecipado de operações para autoridades de saúde e educação; (este é o ponto crucial desta medida)
Proibição de operações próximas de escolas, creches, hospitais ou postos de saúde; (se estas instituições estão em área de crime, é mais do que prudente
fecharem durante as operações)
restrição do uso de helicópteros em operações autorizadas. (este é o meio mais eficiente de visualizar a posição de criminosos para orientar os policiais em terra. Sem eles, os policiais ficam expostos desnecessariamente. Hoje, a polícia já usa drones, mas os bandidos também os usam e já têm armas próprias para derrubá-los.

Esta decisão, na prática, criou restrições para ações policiais em comunidades em todo o Brasil. Os críticos desta ADPF alegam que a medida apenas favoreceu o crime e não os cidadãos honestos que moram nas comunidades, com o que eu concordo.

O ministro André Mendonça votou contra, dizendo: “Se a atuação do Estado atualmente é deficiente nessas localidades, não é impedindo ou restringindo o agir das forças de segurança que se solucionará o problema, pelo contrário. Onde não há Estado, há crime organizado. […] É preciso estimular a inserção das forças públicas nesses espaços, a partir de diretrizes que orientem [os policiais], sem inviabilizar a elaboração de planos”.

O Procurador de Justiça do RJ também criticou a medida. Ele afirmou que “as operações da polícia foram restringidas de forma errônea, atrapalhando a ordem e pacificação das regiões dominadas pelo crime”.

Bem, evidentemente, a decisão se trata, mais uma vez, de ativismo judicial do STF. A atitude, na minha opinião, foi equivocada, pois não existe lei no Brasil que proíba ações policiais e o STF não pode, constitucionalmente, criar leis nem tomar medidas administrativas, pois ele não faz parte dos Poderes eleitos e destinados a este fim, como o Executivo e o Legislativo, embora seja o que ele tem feito nos últimos tempos.

Na prática, a liminar de Fachin, e a posterior decisão do plenário, proibiu a realização de operações policiais nas favelas do Rio de Janeiro sem prévio aviso. Como resultado, repito, a medida deu espaço para o fortalecimento da ação do narcotráfico nos morros da cidade, inclusive com a intensificação de treinamento tático de traficantes, como nunca antes havia ocorrido.

As polícias (Civil e Militar) criticam, duramente, a decisão, principalmente por causa do “aviso antecipado de operações para autoridades de saúde e de educação”, porque, avisando antecipadamente, dá chance aos criminosos, por vazamento de informação, de serem avisados e fugirem ou montarem barricadas de contenção, dificultando a operação e ameaçando a vida dos moradores e dos policiais.

Enquanto isso, segundo especialistas em segurança pública, as lideranças do narcotráfico têm se dedicado a fortalecer e ampliar suas posições, principalmente por meio da instalação de centenas de barricadas que, impedem ou dificultam, o avanço de viaturas; aumentar seus arsenais de guerra e até mesmo receber traficantes de outros estados, que agora veem os morros fluminenses como locais seguros para permanecerem impunes enquanto comandam o crime em seus estados de origem.

Estas barricadas prejudicam o dia a dia das comunidades, já que inviabilizam o trajeto dos veículos oficiais e dos moradores. Até mesmo ambulâncias e caminhões de bombeiros, com frequência, são impedidos de fazer deslocamentos de emergência.

A Polícia Militar do RJ já incluiu em seu treinamento de policiais, o manejo de tratores para derrubar barricadas. Para termos uma ideia, só este ano, foram retiradas mais de 7mil toneladas de barricadas nas incursões em comunidades, para cumprimento de mandados e para tentar estancar a distribuição de armas e drogas no estado.

Isso seguindo a regra do STF. Quanto seria retirado se não houvesse esta regra? Se eles armam barricadas, é porque têm a informação antecipada da operação… é difícil entender isso?

Vale sempre lembrar e repetir: o Rio de Janeiro não produz armas e drogas! Elas chegam através de nossas fronteiras, mal vigiadas. Há fronteiras “secas e molhadas” não, ou mal, vigiadas, e por aí entram as armas e as drogas. O problema é que se elas entram têm que ser distribuídas. E como são? Evidentemente, por nossas estradas estaduais, federais e baías.

Um Tenente-coronel da PMERJ, com mais de 25 anos de experiência em operações nos morros fluminenses diz:

“Nesses últimos anos, o tráfico teve tempo para se organizar com tranquilidade dentro das comunidades carentes. Hoje você vê uma barricada, que só tinha dentro da comunidade, já nas vias principais. Eles avançaram e ganharam mais terrenos. Anteriormente, eles sabiam que se ficassem na rua, a qualquer momento, poderia chegar uma viatura. Hoje, sabem que as operações são somente as planejadas e avisadas com antecedência. Isso tira o “efeito-surpresa”, que é o que permite que os criminosos sejam pegos. Nesse cenário atual, eles não perdem armamento, não perdem drogas e só vão se fortalecendo financeiramente, o que permite que consigam cada vez mais arquitetar essa guerra”.

Este depoimento, pra mim, é definitivo, principalmente por ser de alguém envolvido diretamente neste guerra.

Para não dizerem que estou falando só do Rio de Janeiro, o Secretário de Justiça de MG diz: “O tráfico se fortaleceu porque, quando não há ações da polícia, o resultado é o incremento no número de armas em poder das facções e a ampliação dos seus territórios. Eles se aproveitaram da inércia do Estado para agir”,

Para ilustrar a complexidade do cenário, na operação realizada, nesta semana, no Complexo do Alemão, criminosos utilizaram metralhadoras antiaéreas, que possuem capacidade para perfurar blindagens e neutralizar aviões, para tentar derrubar um helicóptero da Polícia Civil. Os traficantes também lançaram mão de rajadas de metralhadoras a esmo, em meio a residências, colocando em risco moradores dentro de suas casas. Estas balas disparadas vão pra algum lugar e acabam atingindo alguém. Dezenas de granadas também foram lançadas contra as forças de segurança, também aumentando a possibilidade de danos à população.

Os criminosos oprimem os moradores da comunidade de todas as formas: obrigam manifestações; usam essas pessoas como escudo humano e recorrem a táticas de guerrilha e ao uso de armamento de guerra para defender seus territórios. Monopolizam o gás de bujão, a água e a internet, obrigando os moradores a consumirem o “seu produto”.

Dá pra entender que estamos em uma GUERRA CIVIL ou tá difícil?

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

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Advogado, analista de TI e editor do site.

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