26 de abril de 2024
Editorial

“À mulher de César não basta ser honesta, precisa parecer honesta!”

Muita coisa foi dita, postada e publicada sobre este assunto, pela oposição, pelos governistas e pela imprensa, afinal dois de nossos Ministros do STF, “supostamente” simpatizantes e/ou agradecidos ao PT pela indicação – Luiz Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski – participaram de um evento oficial nos EUA com os pré-candidatos à Presidência durante a Brazil Conference – evento de sabatinas e palestras realizado em Boston, nos Estados Unidos, por estudantes brasileiros da Universidade de Harvard e do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Até aí, nada demais.

Imagem: Google Imagens – Folha – UOL

Participaram todos os candidatos? Não! Apenas os pré-candidatos pelo MDB, PDT e PSDB, alguns de nossos inúmeros partidos, evidentemente de esquerda – salvo pelo MDB que vai pra onde a onda o leva desde sempre – e que, obviamente, não pouparam críticas ao governo atual. Justo. Acho que quem está fora do governo deve mesmo criticar, quando for o caso e quem está dentro deve defender… é o jogo político… perfeitamente normal. Não vejo nada demais.

Assisti ao vídeo e, sinceramente, não vi qualquer tendência política no discurso dos dois ministros, a despeito do enfoque do Encontro.

No entanto, apenas a presença e participação deles, dando mais credibilidade ao evento, infringe diretamente o artigo 95 da Constituição Federal e da Lei 1.079: (textos resumidos abaixo)

“Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:
/…Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
…/… III – dedicar-se à atividade político-partidária”.
(O grifo é meu).

Segue: o artigo 39 da Lei 1.079/1950, ainda em vigor, diz: (texto resumido a seguir). Além disso, a definição na introdução desta Lei, diz: “Define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento”.

Art. 39. São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.
1- …/…
3 – exercer atividade político-partidária”;
(o grifo é meu)

Transcrevo aqui, do site JusBrasil o texto que mostra que esta lei ainda está válida: “Não revogada, tácita ou expressamente, por legislação superveniente, subsiste a Lei nº 1.079 /1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o seu processo de julgamento, em tudo quanto o seu conteúdo não contraria a Constituição vigente”.

Depois de encontrar no JusBrasil, procurei no Google, a revogação desta lei em outro site, e vi , que inclusive, ela foi usada no impeachment de Dilma Rousseff, logo, os dois ministros podem ter cometido crime de responsabilidade e, por isso, estariam sujeitos à abertura de um processo de impeachment pelo Senado Federal, segundo a legislação mencionada acima…

Mas sabemos que isto nunca irá acontecer.

O impeachment, assim como as CPIs, não são um processo jurídico, são um processo político que pode gerar consequências jurídicas, dependendo do MPF ou da 1a Instância, quando se tratar de réus sem a “impunidade parlamentar”. Não, não errei. O termo correto para mim é impunidade e não imunidade… já houve avanços neste assunto, pois os deputados e senadores somente a têm no exercício regular de seu mandato e em função dele, mas precisamos acabar com isso…

Sigamos: o Senado, assim como a Câmara, está repleto de “réus” em processos no STF, devido à sua absurda impunidade parlamentar – assunto para outro momento – e por outros “crimes”. Sim, entre aspas, pois se o STF ainda não os classificou como crime, não posso classificá-los desta forma. Além disso, a maioria dos deputados e senadores têm processos contra si no STF, devido à outra aberração que é o foro privilegiado e, é claro, jamais quererão ir contra os atuais ministros, para não irritar quem irá julgá-los… ou seja, é uma lei que jamais será cumprida na prática, no que tange aos ministros do STF, entretanto, quanto aos Chefes do Executivo, já vimos que ela vale, e muito.

Agora vejam: nenhum dos ministros do STF foi eleito, mas o chefe do Executivo o foi, e ele é quem os indica, por prerrogativa constitucional… o chefe do Executivo pode sofrer, e alguns já sofreram impeachment, como vimos com Getúlio Vargas (1954); Carlos Luz (1955); Café Filho (1955); Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016). Repararam na diferença de enfoque nos anos dos impeachments dos presidentes que ocorreram?

Vale ressaltar: após Getúlio Vargas em 1955, veio Carlos Luz, no mesmo ano, depois Café Filho, vice de Getúlio que assumiu após o impeachment, também foi “impichado”, a seguir, 37 anos depois, Collor teve seu impeachment e somente em 2016, Dilma teve o seu… viram a diferença de enfoque da população e do Congresso à época para hoje? Quando é que hoje conseguiríamos “impichar” 3 presidentes num mesmo ano? Indo às ruas, usando as Redes Sociais (que não havia à época), enfim, manifestando-se de alguma forma legal.

Alguém acha que farão a mesma coisa com algum ministro do STF? Óbvio que não.

Ainda mais depois de Lewandowski dar aquela rasteira na Constituição ao manter os direitos políticos de Dilma Rousseff em seu impeachment, quando a lei mandava cassar-lhe os direitos políticos? Claro que isso fez parte de um acordão entre o Congresso e o STF, na pessoa de Lewandowski – isento os demais ministros à época, porque apenas ele participou do processo. Nada a reclamar, jogo político, constitucional, assim como as CPI’s, que também são um fórum político, assim, é o plenário do Congresso que deve julgar um impeachment de um Chefe do Executivo ou de um dos Ministros de nossa Corte Suprema, nunca antes ocorrido em nossa história. Esta frase é bem conhecida, não é?

É claro que não procederão da mesma maneira contra qualquer ministro do STF, por isso estes se sentem acima da lei, por terem cargos vitalícios, e podem fazer o que quiserem, até mesmo, eventualmente, ir contra a nossa Constituição e contra uma lei de 1950, ainda em vigor, salvo melhor juízo.

Um dos ministros, atualmente, faz todo o processo legal, passando pela investigação, denúncia, aceitação da denúncia, indiciamento, tornando-o réu. Intima/cita, julga, pedindo prisões preventivas dos réus e obrigando-os a usar tornozeleiras ou mantendo-os presos… mas por que um só ministro do STF pode iniciar e concluir um processo? Há algo errado, não?

O STF não seria o foro adequado para dirimir demandas de quem tem foro privilegiado? Nunca deveriam ter a iniciativa. Investigar, denunciar, intimar, processar e julgar é todo o processo legal e não deveria ser feito por um único membro do Judiciário. Por que estas decisões não são exclusivas do plenário? Mesmo que seja o caso de se usar o ministro de plantão, ele poderia, em casos excepcionais, convocar uma sessão online para resolver o problema, não? Passar a decisão para o plenário isenta o ministro de uma responsabilidade que ele não deveria assumir. Afinal, com os salários e benesses, os ministros do STF (e outros membros do Judiciário) deveriam trabalhar 36h/dia para justificar tais penduricalhos. Vamos em frente!

O que Barroso e Lewandowski, apenas por estarem presentes, fizeram nos EUA, claramente se tornou um ato político. Não pareceram imparciais ou isentos. Lembram da famosa frase? “À mulher de César não basta ser honesta, precisa parecer honesta!”. É isso, eles são honestos, mas não pareceram honestos ao participar de um evento político, como foi este em Boston. O filtro para “participar ou não” deve vir, no mínimo, do próprio ministro, salvo se ele tiver outras intenções, o que não me pareceu nas falas dos dois no Encontro.

Acho que os dois ministros, aliás todos os demais, deveriam, o máximo possível, se manter imparciais e não participarem de eventos com clara tendência política, como este de Boston. Deveriam se autoproteger para poderem julgar, sem qualquer sombra de dúvida, qualquer de suas decisões.

No vídeo, a entrevistadora fala, claramente, que a ideia é “como impedir a reeleição de Bolsonaro neste ano”. Notadamente, a entrevistadora, seguindo o script – não sei se é a opinião dela – disse que “não sabe como “faríamos isso“… incluindo todos os participantes, dentre eles, obviamente, os dois ministros. Uau!!!

Ela diz a seguir? “pra mim não é óbvio que “a gente” já derrotou Bolsonaro”. Como assim “a gente”?

Só isso já seria suficiente para os dois ministros se retirarem do recinto ou se recusarem a responder a qualquer pergunta, obedecendo à legislação em vigor sobre participação política. Aliás, isso já deveria estar explicitado no convite que deveria, pela isenção, ter sido recusado. Por que não foi?

Ela segue: “vai ficar muito mais difícil pra gente derrotar o Bolsonaro”, citando inclusive a jornalista Natuza Nery, da GloboNews (óbvio) para conseguir criticar o governo. Palavras da entrevistadora: “Eu morro de medo do que vai acontecer.../… Nós é que somos os poderes do bem”. (o grifo é meu)

Fala sobre jornalismo sério… só pode ser brincadeira… PODERES DO BEM?

Enfim, não quero criminalizar nenhum dos ministros que participaram, apenas acho que, diante do fato de perceberem que o encontro seria evidentemente político – o que pra mim estava implícito no convite -, deveriam ter se recusado a comparecer ou se retirado… ficou mal… politicamente, mal!

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

Advogado, analista de TI e editor do site.

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