17 de abril de 2025
Ligia Cruz

Vitória e outras Marias

Priscila Brenda, Vitória Regina e Adriana Rosa. O que essas mulheres têm em comum? Foram vítimas de feminicídio. Contra elas foram praticados atos bárbaros, que ceifaram suas vidas em plena juventude.

O caso de Vitória está em toda mídia, um crime bárbaro de feminicídio em que foi praticada tortura, espancamento, estupro, facada e degola.
Uma certa vidente desses podcasts sensacionalistas ao ser questionada sobre o crime afirmou que “não tinha jeito, era a hora dela”. Isso com uma frieza, misturada com aceitação, banalização e normalidade. De embrulhar as vísceras.

É assim que muitos reagem quando uma mulher é vítima de violência, por ser bonita, ter formas exuberantes, expressar sua vaidade, vestir-se de modo sensual e até por despertar ciúme e inveja. A mulher é culpada de cara por despertar nos homens sentimentos contraditórios. Desde a Bíblia.

O que está na raiz desse quadro sombrio é o sistema patriarcal que ainda impera no mundo civilizado, onde o homem é a figura principal nas relações e em torno dele gira todo o resto, inclusive as mulheres.

A misoginia é tão presente que ainda é encarada por muitos, inclusive pelas famílias brasileiras, como normal. É a “macheza” necessária que intimida e até mata. O homem pode tripudiar, zombar, fazer bullying, dar um tapas que está tudo certo. Dessa forma, sempre haverá homens subestimando o papel feminino, sua competência e liderança porque é cultural. Porque a testosterona vai aos píncaros e ele exacerba. As desculpas esfarrapadas da covardia. Ainda não superamos isso.

Abusos de toda ordem são praticados contra a mulher no cotidiano, que vão desde as piadinhas a julgamentos cruéis à violência em si.
Nos últimos 10 anos, 12 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, um número discrepante no cenário nacional e mundial. Destas 73% foram mortas por parceiros ou ex das vítimas e 10,7% por familiares e conhecidos. A cada 17 horas uma mulher é vítima de feminicídio no Brasil e a principal causa é a questão de gênero. Isso sem contar a violência em si, onde ocorrem os espancamentos, abusos de todo tipo e estupros. Os danos físicos e emocionais das sobreviventes são permanentes.

Segundo estatísticas das delegacias da mulher, no ano passado o estado de São Paulo liderou o ranking com 1.177 casos de violência (144 feminicídios), seguidos pelo Rio de Janeiro com 633 (66) e Amazonas, 604 (33), citando somente os três primeiros. Destes, São Paulo é o único estado com esse tipo de crime monitorado. Então, no resto do país, o número deve ser maior. A maioria das vítimas tem entre 13 e 39 anos.

De acordo com o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), ocorrem no Brasil 822 mil estupros por ano, um a cada dois minutos. E pasmem: apenas 8,5% são registrados pela polícia e 4,2% pelo Sus.

No mundo, 85.000 mulheres são assassinadas por feminicídio (dados de 2023/ONU), uma guerra em que somente o sexo feminino perde a vida. A África lidera o ranking, seguido pelas Américas e Oceania.

Na América Latina os crimes de violência contra a mulher são elevados, incluindo feminicídio, de gênero e misoginia. O Brasil somente é superado por El Salvador, Colômbia e Guatemala; depois vem a Federação Russa. Isso sem contar a situação nos países de maioria muçulmana que merecem um capítulo à parte e não há números e nem testemunhas.

Em linhas gerais, as estatísticas de vários órgãos e institutos revelam que a maioria dos crimes é praticada por parceiros íntimos, familiares e conhecidos. Ou seja, por pessoas que conhecem as vítimas. E muitas são atraídas por essa razão, há uma certa relação de confiança entre a vítima e seu algoz.

Então vem a questão: como acabar com isso, como a sociedade pode proteger as mulheres de facínoras e psicopatas?

A educação é uma das respostas e talvez uma das mais importantes. E começa na família. Mulher não é objeto, é sujeito. Não importa como se vista ou pense, merece respeito. Não há razão para cometer grosserias, isso muitas vezes degenera para a violência.

Mas enquanto a lei não der as respostas com penas pesadas e sem a progressão de regime, que no caso de crime hediondo equivale a 2/5 em anos, a mentalidade machista não vai mudar. Isso não basta. Não pode haver perdão, nem afagos para criminosos. Progressão de pena é um deformação do sistema judiciário brasileiro.

Por essa razão, enquanto não houver uma reforma no sistema penal veremos criminosos saindo livres para uma vida de normalidade em que pesem o desaparecimento e o estado psíquico de suas vítimas.

Ligia Maria Cruz

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

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