Bolsonaro mudou o discurso sobre vacinas. Agora já admite que são indispensáveis para a retomada econômica. O governo tinha proibido a compra de vacinas por empresas particulares. Agora já admite essa possibilidade.
O problema é que não há tanta vacina disponível no mercado. A AstraZenica, por exemplo, está sob forte carga da Comunidade Europeia. A Europa investiu na vacina e a empresa não entregou ainda o que prometeu.
Não está nada fácil esse mercado internacional de vacinas. O Brasil, de certa forma, esnobou a vacina da Pfizer. Eu teria investido nela mas o governo criou tantos fantasmas em torno que até a ideia de virar jacaré entrou na história. Os países que mais vacinaram, quantitativa e proporcionalmente, EUA e Israel, estão usando a vacina da Pfizer. No caso americano, foi incluída também a Moderna.
Tudo isto está muito complicado. É preciso estudar um pouco melhor, antes de sugerir saídas.
O governo brasileiro apenas finge que está interessado no tema, mas se estivesse mesmo promoveria uma discussão sobre o plano de vacinação.
Estamos vacinando num ritmo lento. Chegamos aos 700 mil mas num prazo de uma semana. Nos EUA o planejamento de Biden prevê 1 milhão de vacinados por dia.
Não temos uma garantia de fornecimento estável dos insumos. O Ministro da Saúde não tem ideia de como a coisa vai se desdobrar no tempo. Na verdade, ele já não dava conta da pandemia muito menos do processo de vacinação. Agora está sendo investigado num inquérito da PF. Sua capacidade vai diminuir mais ainda porque precisará de energia para se defender.
As vezes tenho vontade de respirar outros ares fora da política. Lendo ontem um livro sobre Virginia Woolf, o autor, Herbert Mader, destaca um trecho do diário dela que fala de uma certa loucura pela jardinagem.
Mas em seguida, ela afirma que é possível a loucura em torno de um programa político, na verdade é muito fácil se perder numa trilha estreita e não sair mais.
Depois do trabalho cotidiano e da leitura fui ver um documentário sobre a escritora Joan Didion. O íitulo é bem interessante: The Center Will not Hold. Ela o usou quando saiu de casa e foi a São Francisco e, na época, descobriu um mundo completamente mudado.
A parte final da história de Didion, a morte quase simultânea do marido e da filha, é um pouco triste. Mas ela transformou toda essa tristeza em bons textos, transfigurou o sofrimento em literatura.
São as escapadas noturnas, nos livros e filmes, que me animam. o trabalho cotidiano e o debate sobre os rumos do Brasil não trazem boas notícias.
A situação no norte está complicada como tenho registrado aqui. Não há mais leitos de UTI em Rondônia. Pazuello está em Manaus e planeja deslocar quase mil pacientes.
As vezes me pergunto se não seria melhor reforçar a infraestrutura de Manaus, enviar uma equipe de médicos vacinados e tentar resolver a situação por lá.
Sinceramente só um estudo mais detalhado poderia responder a essa pergunta. Sei apenas que espalhar doentes de Manaus pelo Brasil é um dever para salvar suas vidas mas é também um risco de disseminação da nova variante.
Leio que mesmo quebrado, o Líbano conseguiu um empréstimo do Banco Mundial de US$ 34 milhões para comprar vacina. É o pais mais endividado do planeta mas está fazendo a coisa certa
Com esse dinheiro vão imunizar dois milhões de pessoas do grupo de risco. E tudo com a vacina da Pfizer que o governo brasileiro resolveu transformar numa grande ameaça.
Por hoje é só. Quando terminar o trabalho diário pretendo terminar de ver também a série sobre Nova York, Pretend it’s a city produzida por Martin Scorsese. A figura principal é a escritora Fran Lebowitz. Ela é inteligente as vezes engraçada. Mas nem sempre engraçada e, em certos momentos, apenas conservadora, sobretudo quando se refere à Califórnia que na verdade, ao longo dos tempos, é o grande celeiro de novas ideias nos EUA. Andei lendo um livro sobre isso, mas não tenho tempo de me meter na história dos EUA. Vivemos nos trópicos bastante complicados, mal conseguimos entender nosso realismo fantástico.
Bolsonaro dizia que a vacina da China era inválida que jamais a compraria. Agora agradece à China por mandar um pouco mais de insumos.
Daqui a pouco ela vai se vacinar em público e anular o decreto que proibe exibir seu carnê de vacinação.
Tudo pode acontecer, menos um plano sistemático e coerente para combater a Covid-19 e imunizar o povo brasileiro.
Fonte: Blog do Gabeira