Presentear quem não merece não é tarefa fácil. Eu lhe entendo, Papai Noel!


Querido Papai Noel,
Não estranhe, por favor! Estou meio crescidinho pra lhe escrever, mas sou eu mesmo. Pelo que me lembro, eu tinha uns 7 anos quando da minha última carta pra você. E não escrevi mais, porque algum desavisado me interrompeu o enlevo, a magia e o encantamento que você desperta na humanidade desde sempre.
Em tempo: esse “sempre” remonta o Século IV quando a figura do Papai Noel foi criada à imagem e semelhança de São Nicolau, um bispo católico gordinho, bonzinho que adorava presentear. Ao longo dos séculos muita coisa aconteceu e o bom velhinho com traje de inverno vermelho apareceu assim, pela primeira vez, na revista americana Harpers Weekly, no final do século 19.
Acredita-se que o vermelho tenha sido uma criação publicitária da Coca-Cola. E aí, nos idos de 1931, o desenhista Haddon Sundblom, espertamente, utilizou a imagem da lenda em um comercial da própria Coke, acrescentando um saco de presentes e o indefectível gorro de pompom branco.
E a Finlândia, hein? Gélida, charmosa e esperta, resolveu surfar na onda do Papai Noel. Montou uma estratégia sensacional de marketing para estimular o turismo local e deu, em 1950, uma certidão de nascimento pro rechonchudo e construiu uma vila na Lapônia que se tornou o seu lar-doce-lar. Esse é o curso resumido da história.
Um misto de decepção e tristeza tomou conta daquele momento, Papai Noel. Não tive coragem de contar pra minha irmã, 1 ano mais nova. Aquele “Papai Noel é o pai da gente” jamais deveria existir a bem dessa deliciosa ilusão.
Nunca me esquecerei dos olhares de minhas filhas diante de você, amigo. Embevecidas e emocionadas. Você é a personificação da instituição “família”, o elo inquebrantável da harmonia e mercador incomparável da esperança.
Tô ouvindo um zum-zum-zum que você estaria desapontado com os andamentos das coisas por aqui e não está com muito saco de nos encontrar. E estão dizendo que a economia é a responsável pelo seu desânimo. Tente acreditar na nossa mídia, Papai Noel. A tchurma é fera!
Segundo ela, o dólar está subindo ou em função de memes, ou pela vitória do “Laranjão” ou ainda pela desastrosa atuação da equipe econômica do PR anterior. Só isso! Releve, amigo!
Tão falando também que você tá meio puto, mas entenda que a alta dos combustíveis, segundo aquela mesmíssima imprensa, também é uma boa pra todo mundo.
E esse negócio de comer carne todo dia tem que acabar mesmo. E, claro, aquelas enchentes no sul aconteceram por incompetência da turma do meio-ambiente da gestão passada.
Não nos prive de sua visita! Se está havendo qualquer tipo de desacerto, não é de agora, segundo a tchurma. É da famosa herança maldita. Portanto, venha!
Mas se você está meio desconfiado dessa gente, sugiro que reserve um lugarzinho no seu saco de esperança e presentes para injeções de respeito, comprimidos de responsabilidade, vacinas de decência e pomadas de moral. Alimente bem suas renas, corra em direção a essa tchurma e presenteie-os. Faça a sua parte!
Não sei se aceitarão ou entenderão sua iniciativa, mesmo porque presumem-se acima do bem e do mal.
Caso não aceitem, sugiro aquele seu infalível plano B com supositórios de malagueta ou enema de urtiga para que possam se aprazer, não apenas com a via de administração desses medicamentos mas com o extraordinário efeito que deles decorre. Quem sabe melhoram?
Feliz Natal, Papai Noel! Não deixe de vir. Perdoe-os! No mínimo, “eles não sabem o que fazem”.