A família de Gabriel Arns e Helena Steiner (Foto: Acervo da Pastoral da Criança)
Gabriel Arns e Helena Steiner, imigrantes de origem alemã, formaram uma família de 13 filhos: sete moças e seis rapazes. Religiosos e devotos dos ensinamentos de São Francisco de Assis, tiveram a alegria de ver três filhas freiras e dois filhos frades.
Entre seus filhos estão Paulo Evaristo, que veio a ser Arcebispo de São Paulo, e Zilda, fundadora da Pastoral da Criança que, estou certa, dispensa apresentações.
Zilda formou-se em pediatria e dedicou-se a salvar vidas de crianças. Estava no Haiti em missão da Pastoral da Criança, quando daquele terrível terremoto, que a vitimou.
Paulo Evaristo, sabedor que faria falta ao pai nas lides da lavoura, custou a confessar que essa era sua vontade, dedicar sua vida aos ensinamentos de São Francisco de Assis. Mas, quando o fez, foi inteiramente abençoado pelo pai que só lhe pediu: “Não esqueça nunca que você é filho de colono”.
O rapaz dedicou-se a estudar para melhor servir a Deus e quando se doutorou em filosofia patrística na Sorbonne, defendendo a tese “A Técnica do Livro Segundo São Jerônimo”, assim comunicou aos pais num telegrama: “O filho do colono é doutor pela Universidade de Paris e não se esqueceu da recomendação do pai”.
Intelectual de peso, foi professor de Teologia e escreveu 50 livros. Admirado por seus pares tanto na Igreja quanto na Academia nada disso lhe subiu à cabeça e como disse ontem Fernando Henrique Cardoso, de quem era grande amigo: “Que seu exemplo de frugalidade e decência sirva de inspiração no momento de reconstrução moral pelo qual precisamos passar”.
Foi nomeado Arcebispo de São Paulo pelo papa Paulo VI que numa atitude digna de um grande chefe da Igreja, no mesmo dia em que removeu Dom Agnelo Rossi de seu posto de Arcebispo e o chamou para trabalhar em Roma, nomeou Dom Paulo Evaristo para substituir Dom Agnelo. Nada disso foi confirmado por escrito por Paulo VI mas sabe-se que o motivo imediato foi este: Dom Agnelo declarou que não havia presos políticos no Brasil, que dirá torturados, em contradição ao que dizia sobre o assunto Dom Paulo Evaristo. Tapar o sol com a peneira não era o forte de Paulo VI!
Desde que fora nomeado para trabalhar no Arcebispado de São Paulo, Dom Paulo Evaristo dedicava-se a visitar comunidades carentes e os detentos nas muitas cadeias de São Paulo. Ao verificar as condições em que estavam frades dominicanos e outros religiosos, começou a usar sua força para enfrentar as autoridades e descrever o que via.
Como Arcebispo de São Paulo, então, sua luta foi ainda mais ferrenha.
Durante um dos períodos mais escuros da ditadura militar, procurou o presidente Emílio Medici para, em nome dos bispos paulistas, entregar-lhe um documento em que exigiam o fim das torturas. Medici, cuja força advinha das armas, deu um murro na mesa e gritou: “O senhor fique na sacristia que nós cuidamos da ordem”. Dom Paulo Evaristo, cuja força advinha da fé, pegou de volta o exemplar da encíclica ‘Rerum Novarum’, que levara de presente para o general, e retirou-se sem retrucar. Não mais se falaram e só se viram em ocasiões protocolares.
Dom Paulo Evaristo nunca deixou de protestar contra a tortura e o arbítrio e é de todos nós muito conhecida sua belíssima atitude quando do assassinato de Vladimir Herzog que o governo queria que passasse por suicídio. A missa na Catedral da Sé, com a presença de mais de oito mil pessoas, na qual ele, o rabino Henri Sobel e o pastor James Wright, rezaram pela alma de Herzog, foi, segundo disse baixinho Dom Helder Câmara, (Arcebispo de Recife e Olinda proibido de falar ao público), em pé no altar atrás do amigo Paulo Evaristo: “Vencemos, quebramos a Revolução, Paulo”.
Há os que sem compreender nada de nada, chamem os dois arcebispos, Helder e Paulo Evaristo, de ‘vermelhos’. Não é o sentimento do povo. A prova? A Catedral da Sé, novamente testemunha da dor da grande cidade, está lotada há 48 horas, desde que começou o velório de seu Arcebispo-emérito, o Cardeal da Esperança, o Pastor Intrépido e Generoso, como disse o papa Francisco.
Muitos são os elogios e palavras de admiração que Dom Paulo Evaristo recebeu. Mas a todos ele preferia ser conhecido pelo singelo e muito verdadeiro ‘Amigo do Povo’.
Fonte: Blog do Noblat
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