29 de março de 2024
Walter Navarro

69, o ano erótico


Por duas vezes – por enquanto – descobri que estou velho. A primeira foi ao cometer 52 anos. A segunda foi dia 17 de janeiro de 2019.
No YouTube, dois programas franceses, comemorando os 50 anos da música “Je t’aime, moi non plus”, de Serge Gaisnbourg e do filme “A Piscina”, com Romy Schneider e Alain Delon, de Jacques Deray.
Em comum, Jane Birkin que, 50 anos depois, está a cara da Brigitte Bardot, aos 84 anos.
Tentei, mas não consigo me lembrar a primeira vez que ouvi “Je t’aime, moi non plus”, mas garanto que foi, pelo menos, muito depois de 1969.
Mesmo porque, em 69 eu tinha sete anos – sabia contar apenas até 68 – e a música foi proibida em vários países, incluindo, claro, o Brasil, sempre na vanguarda do atraso.
“Je t’aime, moi non plus” foi condenada pelo Vaticano (o Papa) e tão perseguida como o filme “O Último Tango em Paris” (1972), de Bernardo Bertolucci, que morreu ano passado. Bernardo. O filme continua vivo, filhos ingratos!
“Je t’aime, moi non plus”… Tenho uma longa história com ela e com o último tango de Bertolucci. E com Paris. E com…
Mas hoje só vai ter tempo pro Gainsbourg, “desolé”.
Escrevo como se todos conhecessem “Je t’aime, moi non plus”, sem reconhecer os primeiros acordes infinitos. Ainda que seja uma das mais conhecidas do e no mundo.
É aquela… Dos gemidos… De motel… Quanta burrice, ingratidão e injustiça!
A música é das mais lindas e marcantes; a letra, um enigma para muitos.
99% das pessoas que ouviram mil vezes a música não entendem a letra ou não tiveram a curiosidade para…
Sem esnobismo, sem me gabar, eu entendi e entendo. E vou continuar procurando e achando, como em “O Último Tango em Paris”, “La Dolce Vita”, “Casablanca”; pra mim, sempre inéditos.
Mesmo os músicos que gravaram “Je t’aime, moi non plus” nunca entenderam, no mínimo, porque eram ingleses. Neste programa, sobre os 50 anos, foi engraçado e absurdo descobrir isso. Até o irmão de Jane Birkin, Andrew, que tem vinil e letra originais, só entendeu agora, no cinquentenário.
A música, como foi criada, é impossível de ser traduzida sem sérios danos mortais e fatais, a começar pelo título e antes de chegar ao hospital. Não ouso. Não profano.
Ela vai muito além do Jardim das Delícias que propõe.
Concordo com Jane, é até pudica.
Jane Birkin, que já foi uma das mulheres mais lindas da Terra, tinha 23 anos. Apesar de magérrima, sua bunda ficou famosa como a mais gostosa da “Swinging London”.
Já Serge Gainsbourg era dos mais feios de todos os tempos, com raros intervalos de beleza, daí uma de suas frases mais famosas: “A vantagem da feiura sobre a beleza é que ela dura”.
Mas tem muito mais.
Serge fez a música, que ficou famosa mundialmente, cantada com Jane, para outra mulher mais bonita e sexy do mundo, Brigitte Bardot.
Por isso “Je t’aime, moi non plus” é pudica.
O homem mais feio do mundo ganhando a mulher mais linda do mundo.
Nem ele acreditava no que tinha acabado de comer, em quem tinha acabado de devorá-lo. Ela sabia. Jane também.
O problema, sempre tem um nas perfeições, é que Brigitte era casada com um alemão – onde já se viu – e estava tendo apenas um caso com Serge.
Reza a lenda e a verdade que, depois de uma noite de muito sexo, Brigitte pediu a Serge: “Faça a música mais linda que você conseguir sobre mim, sobre nós, sobre o que estamos vivendo.
Fiat Lux!
E ele fez, e assim ele e Deus criaram a mulher. A mesma mulher, Brigitte, criada por Roger Vadim em “…E Deus Criou a Mulher” (1956).
Pausa para aplaudir Vadim que também garimpou as águas turvas de outra mulher mais linda do mundo, Jane Fonda, em “Barbarella” (1968).
Ah! Minha prolixidade!
Onde eu estava mesmo? Vou ter que reler, calma aí.
Sim, 1967! BB, Brigitte Bardot, estava chifrando o marido, Gunter Sachs, com Gainsbourg, na casa da Régine, em Paris.
“No dia seguinte…”.
Cai a ficha e Brigitte, depois de gravar “Je t’aime, moi non plus”, com todos os gemidos, orgasmos e Serge, pede a ele que cancelasse tudo, que não soltasse a música pois o maridão Cornélio não ia comprar o disco.
Serge, com G de Gentleman, “stop” tudo e guarda a música que, seria, enfim, gravada com Jane, em …1969!
Depois de curtir “A” fossa por Brigitte, Serge estava com Jane e aí acho que todo mundo conhece o final triste para sempre.
Muita água e álcool rolaram, com discos inteiros dedicados e gravados para e com Jane, inclusive, o título desta crônica, “69 Année Érotique”.
O filme “A piscina”, fica para uma próxima ou nunca.
PS: “Je t’aime, moi non plus” é uma declaração de amor. E declaração de amor assim não faz 50, 100 anos. Já nasceu eterna.

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

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