O TSE decidiu que, se por acaso ele identificar um conteúdo “igual” a outro que se assemelhe a um que já tenha sido alvo de uma decisão judicial para retirá-lo do ar, ele vai poder determinar (de ofício) a exclusão deste conteúdo da mídia onde ele estiver publicado.
A decisão, segundo o TSE, visa reduzir o tempo do processo, no entanto esta decisão embute, um absurdo constitucional, que alguns jornalistas, infelizmente, estão defendendo, mas, felizmente, diversos juristas e alguns jornalistas, a estão recriminando veementemente.
A determinação de “igual” não pode ser uma definição subjetiva do TSE. Ela tem que provir de uma investigação – nunca administrativa – mas judicial, que, como a primeira, terá o poder de dizer que “esta” é igual “àquela”.
Simplificando: apenas uma decisão judicial pode dizer que algo é igual ao julgado anteriormente.
Se a intenção principal fosse mesmo, como diz o TSE, de ganhar tempo jurídico, por que as milhares de ações contra a Previdência Social, por exemplo, muitas exatamente iguais, mas de origens diferentes, nunca ninguém se preocupou em “ganhar tempo” para os beneficiários? Temos pessoas esperando há 15 anos por uma decisão simples: a mesma que já foi tomada para outros cidadãos, mas neste caso, o “igual” tem que ser provado judicialmente pelo autor.
Ah, sim, nestes casos, não há intenção política, então se pode esperar o tempo que for para a produção de provas legalmente?
O âncora da Band, Eduardo Oinegue, contou uma história nesta semana, que mostra perfeitamente o senso do que deveria estar explícito nesta decisão do TSE:
“… certa vez, há muitos anos, alguém queimou a bandeira americana e isso foi a julgamento. Uma pessoa foi presa por incendiar a bandeira. O processo chegou à Suprema Corte e o Estado pedia a condenação do réu. A bandeira americana tem 13 listras horizontais, 7 vermelhas e 6 brancas, e tem 50 estrelas que representam os estados americanos. Um dos ministros da Suprema Corte – não de forma administrativa ou de ofício – mas, no julgamento, perguntou àqueles que queriam a condenação do réu: “quantas listras e quantas estrelas há na bandeira americana”. Obviamente a resposta foi correta, 13 listras e 50 estrelas. A seguir este mesmo ministro perguntou: e quantas listras e estrelas tinha a bandeira queimada? Claro que a promotoria não sabia responder, afinal a bandeira havia sido queimada, e não havia uma única imagem que mostrasse as estrelas e listras da bandeira queimada. Então o ministro disse que, se a bandeira queimada não tivesse exatamente 13 listras e 50 estrelas, não seria a bandeira americana, logo o réu não poderia ser condenado. Como não havia como provar o pedido do ministro, o réu foi absolvido”.
Isso mostra bem porque o conceito de “igual” deve ser juridicamente demonstrável, algo que prove, legalmente, a perfeita igualdade jurídica entre os dois conteúdos.
Uma vírgula, um acento ou uma separação de sílabas, diferentes do conteúdo original já não permite que seja, legalmente, aceito como igual.
E quem vai determinar isso? Um burocrata do TSE? Sim, refiro-me a um burocrata (um setor e não uma pessoa), até porque não quero acreditar que os ministros do TSE tenham tempo suficiente para irem às redes sociais e YouTube, diariamente, para compararem vídeos e/ou textos publicados contra ou a favor de quem quer que seja para determinar que seja retirado do ar.
É este burocrata que vai, administrativamente, por sua livre percepção, definir a igualdade entre os dois conteúdos?
Se sim, não há diferença entre este burocrata e um CENSOR.
Não é porque a intenção do setor burocrata é nobre, que a decisão seria nobre, mas é totalmente errado entregar a alguém um direito que a própria Constituição não entrega, ao contrário, proíbe que se retire. Como dizia Caetano Veloso: “É proibido proibir”!
Além disso, mesmo que fosse um dos ministros do TSE a investigar as redes sociais, a função e a intenção seria a mesma, caso a decisão de suprimir o conteúdo se desse sem uma investigação para determinar judicialmente a igualdade entre os referidos conteúdos.
A agravante é que se trata de uma decisão temporária, com data de validade – 31/10/2022, somente porque o dia da eleição está chegando e é preciso “ganhar tempo”, mas ganhar tempo como? Rasgando a Constituição? Retirando do ar conteúdos apenas por não atenderem a requisitos traçados pelo TSE?
Fica bem claro que o tempo da sociedade é um e o tempo da Justiça é outro, mas neste caso, como há um interesse político-eleitoral envolvido, os tempos da sociedade e o tempo da Justiça passam a andar juntos, como deveriam ser sempre, é isso?
O TSE está, visivelmente, assoberbado com o volume de ações advindas da coligação petista contra seu adversário, daí a decisão para “simplificar” as coisas e “ganhar tempo”. Só que não podemos simplificar e ganhar tempo ferindo a Constituição, somente porque alguém determinou que é fake news.
Já vimos a proibição do uso de palavras, quaisquer que sejam elas, por mais ofensivas que elas possam ser, sem o devido processo legal, mas DEPOIS do uso da palavra. A proibição PRÉVIA escandaliza a nossa Constituição.
O TSE resolveu que determinadas palavras não podem ser usadas, se associadas a um determinado candidato. Por quê? Porque seriam ofensivas?
Se forem, cabe ao ofendido entrar no competente Tribunal com a devida representação. Mas e se o dano for irreparável? Se assim for, ele pode pleitear a reparação prevista na Constituição relativo a danos morais e outros.
Por exemplo: o beneficiário da previdência que espera uma decisão há mais de 10 anos, não é dano irreparável? E se ele morrer no curso do processo? E o preso detido preventivamente sem o devido julgamento, não é irreparável?
O dano irreparável é apenas para os candidatos nesta eleição e até 31/10/2022?
Ora, as mesmas armas estão sendo usadas pelos dois lados. Se boas ou más não interessam, pois, se alguma inverdade for dita, ou ofensa for feita, que o autor seja punido exemplarmente, no processo legal, mas NUNCA anteriormente à publicação.
A proibição do uso FUTURO de algumas expressões fere a Constituição no quesito Liberdade de expressão.
Aliás, nem deveria existir uma Justiça Eleitoral – uma das nossas jabuticabas. A Justiça comum é que deveria resolver os casos e, em alguns, o STF.
Se o tempo da Justiça não for suficiente, paciência, esta é a nossa realidade…
O que não podemos admitir jamais é a censura, seja ela prévia ou não!