11 de setembro de 2025
Editorial

Contabilidade criativa ou recreativa?

A polarização está aí e não se esconde de ninguém. Ela é uma questão política com uma consequência econômica. E quando ela chega à economia ela é preocupante porque impacta diretamente em nossas vidas. A inflação quando sobe, não importando se muito ou pouco nos atinge diretamente.

Estamos, há algumas semanas envolvidos com o tarifaço norte-americano. Ele terá um impacto direto sobre preços e, principalmente, sobre empregos. Muita gente preocupada, e com razão, porque não se sabe ainda o efeito total do pacote ou o que esperarmos num primeiro momento e nos seguintes..

No entanto, há um tipo de discussão econômica que parece estar muito distante de nossas vidas. Quando ele é tratado pelos economistas e pelos analistas econômicos parece ao público que ela não é importante pra nós, mas são consideráveis suas consequências em nosso dia a dia.

Uma notícia econômica, extraída do Estadão nesta semana, diz que o governo Lula vai totalizar em seu terceiro mandato, mais de 387bi de reais em gastos não contabilizados na meta fiscal. O que isso quer dizer?

Bem, a área econômica do governo diz que a meta fiscal é de um déficit previsto de 0,25% do PIB. Daí achamos que o governo vai virar o exercício com este percentual como “saldo devedor em sua conta-corrente”, mas não é assim. Vejamos como anda a gestão da coisa pública do Lula III.

O desprezo pela dinheiro público não é estranho a governos do PT. É parte de seu DNA, mas no neste mandato a coisa está muito mais séria. Haddad sempre encontra explicações, motivos e o discurso “professoral” é que sempre de que é para o bem público.

Um pedaço importante das despesas do governo é retirado do cálculo da meta fiscal, como se, por exemplo, vocês estivesse fazendo uma dieta onde pode comer 1200 calorias e aí você não coloca neste cálculo algumas coisinhas que você come por fora, como por exemplo, um brigadeiro, um pudim ou um bombom, a fim de não comprometer seu limite de calorias do dia. Vai dar resultado sua dieta? Claro que não, mas é exatamente assim que o governo está fazendo: retira do cálculo coisas que ele gasta quando não poderia, pois assim não compromete sua meta fiscal.

Seria ótimo se pudéssemos fazer isso com nosso saldo bancário, não é? Dizendo ao banco que “não considere aquele gasto para debitar em meu saldo”. Não seria fantástico?

Só que os analistas de mercado e, principalmente, os investidores não se preocupam apenas com o discurso do governo nem com suas lorotas. Eles olham vários números, tal qual o Banco Central e daí eles veem a Dívida pública. Então voltamos à figura de nosso dia a dia. Quando eu tenho uma dívida, a primeira coisa a fazer para que ela não cresça é parar de gastar mais do que você gasta e pagar os juros da dívida, caso contrário, ela continuará crescendo.

O governo deveria ter um superavit de mais ou menos 3% do PIB para poder estacionar a dívida pública no tamanho que ela já está, mas estamos muito longe disso. Nossa dívida pública hoje está em quase 78% do PIB. Isso mesmo, nossa dívida pública está em quase 80% do PIB, podendo chegar a 100% em 2030.  Daí vem a dupla Lula-Haddad e discursa que estamos cumprindo a meta fiscal e que o governo tem uma preocupação fiscal indiscutível.

Isto não é verdade, porque estamos com a taxa de juros (Selic) em15% e o governo continua pressionando com despesas não contabilizadas na meta. Resultado: até agora 387bi além do que aparece naquele fajuto Arcabouço fiscal tão divulgado no início do Lula III, com dois efeitos negativos: não vemos qualquer movimento no sentido de que o governo quer equilibrar suas contas e perde, assim, a credibilidade diante dos especialistas de mercado.

Entretanto, o governo Lula não está agindo sozinho neste problema. Tem um parceiro importante que é o Congresso Nacional. Então temos um cenário de irresponsabilidade perfeita em que dois Poderes da República – Executivo e Legislativo – se unem para produzir um resultado falso, a fim de possibilitar o discurso, igualmente falso, de que há responsabilidade fiscal neste governo.

Quando se fala sobre isso, o povo diz que “a dívida é do governo, não é minha”. Só que não existe dívida do governo. O governo só conhece um dinheiro que ele usa, que é o nosso, logo todo dinheiro que entra no caixa do governo é nosso. Diferente do nosso salário que remunera um serviço que você prestou a alguém e a partir do momento em que ele entra no seu bolso, ele é seu, porque ele recompensou um trabalho que você fez.

No governo não é assim. O governo é prestador de serviço público. Ele só existe – em teoria – pra trabalhar pra você, usando seu dinheiro e quando ele acaba, chega o Haddad e propõe aumentar a carga tributária como recentemente com o IOF. É, figuradamente, como se você pedisse um aumento extemporâneo a seu chefe, no caso, ao Legislativo para fazer face às suas novas despesas.

Não se discute a validade do pacote e sim o porquê de ele não ser considerado na meta fiscal, com o auxílio luxuoso do Legislativo. Por quê? O governo justifica que o pacote fica de fora porque não pode comprometer as contas públicas, mas está comprometendo. São despesas que estão sendo feitas com que dinheiro? Com o nosso. Então…

É uma contabilidade recreativa!

A diferença entre a contabilidade criativa da Dilma e a recreativa de Lula é que a da Dilma foi feita por debaixo dos panos de um jeito que, sendo flagrada, sofreu um impeachment e a recreativa de Lula é um jogo entre os poderosos do poder público, onde eles brincam com você e o resultado é: o mercado não acredita e cobra uma taxa de juros maior para emprestar ao governo.

Assim, o empresário segura a atividade empresarial. Sobe os juros; mantém a taxa de juros para empréstimo ao governo alta; sobe os juros para a compra de bens, crédito imobiliário, financiamentos, cartão de crédito e cheque especial, ou seja: todas taxas de juros que nos afetam estão associadas à irresponsabilidade fiscal original do governo Lula III.

Ninguém pode esperar que Lula, depois de três anos de governo dissesse “agora vou ser equilibrado”, ou que Haddad, no mesmo período que desprezou o teto de gastos e criou esta contabilidade recreativa do arcabouço chegaria a dizer que iria voltar ao “modo arcabouço” que o incomodava sobremaneira.

Regra fiscal não deve ser uma formalidade, há que se ter credibilidade e tudo o que o arcabouço não tem é credibilidade. A área econômica do governo está um caos muito bem gerenciado por Haddad, de se virar para manter a meta fiscal, mesmo que para isso tenha que não considerar algumas despesas.

Para terminar, concluímos que Dilma e Mantega inventaram a “contabilidade criativa” e Lula e Haddad, a “contabilidade recreativa”!

Valter Bernat

Advogado, analista de TI e editor do site.

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Advogado, analista de TI e editor do site.

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