Por muito tempo, o conhecimento sobre vinhos se deu por transmissão oral. Não havia publicações e nem estudos científicos sobre a elaboração, conservação, transporte e consumo de vinhos. Tudo que se praticava era passado de geração para geração, de pai para filho.
Em algum momento da história, começou-se a produzir publicações dedicadas a este tema, culminando com o que existe hoje, um grande universo que abrange livros, revistas, cursos, diversos tipos de informações midiáticas, etc…
Ainda assim, alguns aspectos do nosso dia a dia continuam sendo praticados de acordo com tradições de origem familiar e acabam se tornando um mito ou lenda, até que alguém decida estudá-los.
Estamos falando sobre transportar garrafas de vinho por longas distâncias, por exemplo, quando as compramos em uma viagem e as trazemos de volta para casa.
Qual a regra a ser adotada?
1 – Deixamos em repouso para o vinho se recuperar do stress da viagem;
2 – Abrimos assim que nos der vontade de provar. Vinhos não se alteram em viagens.
Se me perguntarem, sempre digo que o melhor é deixar em repouso. Sou adepto de longos períodos de guarda e costumo comprar vinhos já pensando nisto. Hábito que adquiri por tradição familiar. Na minha casa, sempre foi assim e não me arrependo de nenhum vinho que passou por este rito, embora, por pura distração, já tenha perdido uma ou outra garrafa.
Recentemente, nas páginas da revista Decanter, Jonas Tofterup MW, decidiu por à prova esta teoria, obtendo resultados curiosos.
Sua pesquisa foi bem elaborada. Foram necessárias 48 garrafas de um mesmo vinho, safra 2012, que a vinícola garantiu terem sido engarrafadas em sequência, minimizando erros. Dividiu em 4 lotes que passaram por diferentes experiências:
Lote 1 – foi enviado para outro país, por avião 2 meses antes da análise;
Lote 2 – realizou o mesmo procedimento, 2 dias antes da análise;
Lote 3 – foi colocado em um caminhão que “sacudiu” por 8 horas seguidas;
Lote 4 – nunca saiu da vinícola.
A análise foi complexa, incluindo testes químicos e degustações às cegas, com um painel de 12 especialistas. Cada amostra foi analisada duas vezes.
O resultado final mostrou que não havia diferenças significativas entre os 4 lotes. A análise química mostrou que, apenas, nos vinhos que viajaram de avião, uma concentração menor de Dióxido de Enxofre (SO2) e uma coloração mais acastanhada que os que não voaram. Atribui-se a uma provável absorção de ar, pelas rolhas, por conta da variação de pressão dentro da aeronave.
Aparentemente isto põe, por terra, mais um mito?
Talvez não.
Ao contrário do que esta experiência demonstrou, nem sempre podemos controlar todas as etapas do processo. Ao compramos um vinho, em uma loja ou supermercado, não temos nenhuma garantia de como ele foi manuseado, acondicionado, transportado e guardado, até chegar nas prateleiras de vendas.
Se pensarmos num vinho de safra mais antiga, temos que considerar que haverá borras que precisam estar depositadas no fundo da garrafa antes de abri-la. Nada melhor que deixá-la em repouso.
A foto que ilustra este texto mostra um barco Rabelo, que transportava os barriletes de vinho do Porto, em turbulenta viagem pelo rio Douro, até as caves onde ficariam longos anos em repouso.
Engenheiro, Sommelier, Barista e Queijeiro. Atualiza seus conhecimentos nos principais polos produtores do mundo. Organiza cursos, oficinas, palestras, cartas de vinho além de almoços ou jantares harmonizados.
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