26 de abril de 2024
Colunistas Ricardo Noblat

Em breve, no banco dos réus, o touro dourado do Anhangabaú

A inauguração da estátua coincidiu com a semana em que o principal índice da Bolsa atingiu o menor patamar em pontos do ano

Fossem outros os tempos, mas logo quando uma parcela grande dos pobres brasileiros corre atrás de ossos para comer, a inflação sobe, os juros sobem, o preço do dólar sobe, aumenta a concentração de renda, o governo dá calote no pagamento de dívidas judiciais vencidas e manda para o brejo a responsabilidade fiscal, o que faz justamente agora a Bolsa de Valores de São Paulo?

Entroniza diante de sua sede a estátua dourada de um touro com 5 metros de comprimento, três de altura e que pesa uma tonelada. Desde 1989 há um touro igualzinho, só que em bronze, em Wall Street, distrito financeiro de Manhattan, Nova Iorque. Obra de um escultor italiano, ele é menos comprido (4,9 metros), mais alto (3,4 metros) e mais pesado (3,5 toneladas)

O touro brasileiro é obra do artista plástico e arquiteto Rafael Brancatelli, sócio-diretor de uma construtora especializada na execução de obras rápidas. Ele jura que não se inspirou no de Nova Iorque. E justifica por que escolheu um touro e não outro animal: “O touro tem um olhar sereno, mas está preparado e sabe que se tiver um desafio, vai encará-lo com toda força”.

O de Nova Iorque está em paz. O de São Paulo enfrenta o desafio de não se tornar um ponto de manifestações. O touro começou a atrair pichadores. À sua sombra, serviu-se um churrasco de protesto. Passou a ser vigiado por brigadas de agentes de limpeza e de segurança. E, em breve, segundo Guilherme Boulos (PSOL), líder dos sem-teto, seu caso irá parar na justiça.

“Falam que o touro simboliza o progresso e a economia melhorando. A verdade é que aumentou o número de pessoas na rua, desempregadas”, reclama Vinicius Lima, ativista da organização SP Invisível. Defende-se a Bolsa de Valores: a escolha da figura do touro foi uma forma de associar o animal à resiliência do investidor e do brasileiro. Endossa Brancatelli, o pai do touro:

“Enquanto quem gera emprego e move a economia for acusado e responsabilizado pela fome neste país, e os governos (de esquerda ou de direita) não forem devidamente cobrados por sua falta de eficiência e idoneidade, nada vai mudar”. [Brancatelli se diz um liberal. Nem Bolsonaro, nem Lula. Aguarda o surgimento de um nome da terceira via. Se a candidatura de Sérgio Moro decolar…]

Nas redes sociais, o touro é alvo de memes e ganhou apelidos: “Vaca Louca do Anhangabaú”, nome do vale que corta o centro da capital paulista; “Borba Gado”, alusão à estátua do bandeirante Borba Gato; e “Touro da Cracolândia”, que lembra a proximidade do prédio da Bolsa de Valores com uma das regiões mais decaídas de São Paulo, onde drogas são consumidas a céu aberto.

A inauguração da estátua do touro dourado ainda não deu sorte aos negócios. Coincidiu com a semana em que o principal índice da Bolsa atingiu o menor patamar em pontos deste ano.

Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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