28 de março de 2024
Colunistas Mary Zaidan

Federação, o jeitinho da vez

A cada dois anos, os parlamentares mudam as regras das eleições. O eleitor jamais é ouvido.

Plenário da Câmara dos Deputados

O Supremo Tribunal Federal deve decidir nesta semana o futuro das federações partidárias, novidade introduzida pelo Parlamento para driblar a cláusula de barreira – que impõe critérios de representatividade mínima aos partidos políticos – e o fim das coligações proporcionais. Ainda que contenha méritos, a nova regra, judicializada antes da estreia, resulta do improviso e açodamento do Congresso, que altera a legislação eleitoral com mais frequência do que o eleitor troca de roupa.

Ao contrário dos casamentos por conveniência, restritos ao pleito do ano, a federação teria lastro ideológico ao pressupor uma união estável de no mínimo quatro anos. Uma virtude e tanto que os políticos profissionais já ensaiam derrubar em 2023. E também reedita a verticalização, criticada por quem hoje a defende com unhas e dentes.

Da redemocratização para cá, os eleitores conviveram com diferentes regramentos eleitorais, idas e vindas de coligações majoritárias e proporcionais, e coligações verticalizadas.

Em 1998, as normas obrigavam os partidos coligados em uma chapa para eleições presidenciais a manter a mesma coligação em todos os estados e no Distrito Federal na disputa de governador, senador, deputado federal, estadual ou distrital. Algo muito semelhante ao que se exige agora das federações.

O que era interessante naquelas eleições passou a não ser na seguinte. Em 2001, o Parlamento que preconizava o caráter nacional dos partidos políticos e, portanto, das coligações montadas de cima para baixo, tentou inverter o entendimento em nome do “respeito às diferenças regionais”. Mas como as alterações se deram fora do prazo, para 2002 o STF manteve a verticalização, que só caiu em 2006. No ano passado, virou de novo.

Embora ocupe espaços generosos no debate político, a organização das federações passa longe do eleitor. Misturadas na mesma panela, para a maior parte dos que vão depositar seus votos nas urnas, as siglas continuarão sendo uma indecifrável sopa de letrinhas.

Dá para cravar que nem mesmo os filiados de uma agremiação terão a chance de se manifestar sobre uniões que, por óbvio, serão decididas pelos caciques de sempre. Lula busca juntar o PT com o PSB e o PCdoB. O PL de Valdemar da Costa Neto, a casa da vez do presidente Jair Bolsonaro e de parte de sua prole, sonha com a maioria do PSL e com o Republicanos, que, em princípio, quer distância do capitão. O PSDB tenta o MDB e o Cidadania, também cobiçado pelo Podemos. O PSD de Gilberto Kassab namora todo mundo.

Quanto ao eleitor, ele que se dane. As mudanças nas regras eleitorais jamais são feitas em benefício dele. Ao contrário. Os temas que poderiam incluí-lo no debate são postergados para as calendas, a exemplo do voto distrital (misto ou puro), que o aproximaria do seu representante, ou do voto facultativo.

Mas o divórcio com o eleitor poderia ser ainda pior se o “novo” Código Eleitoral aprovado pela Câmara tivesse sido referendado pelo Senado a tempo de valer para as eleições deste ano. Nele, ressuscita-se a propaganda partidária fora dos anos eleitorais, instrumento dito gratuito, mas pago por todos os cidadãos na forma de isenção de impostos para as emissoras de rádio e TV, e a proibição – em bom português, censura – à divulgação de pesquisas eleitorais até três dias antes do pleito. Mais: afrouxam-se as regras de inelegibilidades e de controle do dinheiro público destinado aos partidos políticos e ao fundo eleitoral, que neste ano soma escandalosos R$4,9 bilhões.

Como os congressistas estarão de olho exclusivamente nas urnas, o Código dificilmente voltará à baila em 2022. Mas parte dele, seguramente, ressurgirá no ano que vem, com mais um rol criativo de emendas para entrar em vigor nas eleições municipais de 2024.

É de praxe. Nos anos pares os brasileiros vão às urnas, nos ímpares, o Congresso calibra suas conveniências e altera as regras para as eleições seguintes. Depois, muda de novo, volta atrás e, surpresa, repõe a “novidade”. Desrespeitosamente sem consultar o principal interessado, o eleitor.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 5/2/2022.

Fonte: Blog do Noblat

Mary Zaidan

Jornalista, mineira de Belo Horizonte, ex-Rádio Itatiaia, Rádio Inconfidência, sucursais de O Globo e O Estado de S. Paulo em Brasília, Agência Estado em São Paulo. Foi assessora de Imprensa do governador Mario Covas durante toda a sua gestão, de 1995 a 2001. Assina há mais de 10 anos coluna política semanal no Blog do Noblat.

Jornalista, mineira de Belo Horizonte, ex-Rádio Itatiaia, Rádio Inconfidência, sucursais de O Globo e O Estado de S. Paulo em Brasília, Agência Estado em São Paulo. Foi assessora de Imprensa do governador Mario Covas durante toda a sua gestão, de 1995 a 2001. Assina há mais de 10 anos coluna política semanal no Blog do Noblat.

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