
Herdando de seu pai, Erico Verissimo o dom, Luis Fernando Verissimo não precisou da sombra do pai e com luz própria se consagrou em sua carreira de escritor. Foi um mestre do humor inteligente, que soube transformar o cotidiano em matéria literária sem jamais perder o rigor estético.
Sua obra, que atravessou jornais, livros, televisão e teatro, não se resume à crônica engraçada: nela convivem filosofia, ironia e lirismo condensados em frases curtas e memoráveis. Verissimo mostrou que a brevidade pode conter o universo. Como cronista jornalístico ele me deliciou com seus textos cheios de humor no extinto JB e também em O Globo.
Foi capaz de discutir metafísica em chave de piada e de transformar um simples traço físico em destino narrativo. A poesia, para ele, cabia em qualquer instante, e a filosofia podia ser servida num botequim. Sua literatura permanecerá como uma das mais refinadas expressões da inteligência brasileira.
Seus personagens são máscaras do humano, revelando nossas fragilidades com sarcasmo e ternura. Ridicularizou as vaidades sociais ao mesmo tempo em que expôs dilemas existenciais. Fazia humor refinado. Cresci lendo suas hilárias crônicas e suas tiradas nos mais importantes jornais e revistas do país. Contemporâneo, moderno, satírico, mordaz, discreto e tímido.
O Brasil perdeu mais um dos grandes escritores de seu tempo. Cronista, romancista, humorista, frasista e criador de personagens maravilhosos como, por exemplo:
Ed Mort é um personagem criado em 1979, como uma paródia dos detetives clássicos da literatura policial americana, especialmente Philip Marlowe, de Raymond Chandler. É um detetive particular que se mete em todo tipo de encrencas e casos inusitados, muitas vezes por falta de dinheiro ou por sua própria natureza atrapalhada. Ele divide um pequeno escritório em Copacabana com 117 baratas e um rato albino chamado Voltaire, e seus únicos bens de valor são uma caneta Bic, um telefone mudo e uma plaqueta com seu nome na porta. Ed Mort é conhecido por sua língua afiada e seu coração mole, o que o torna um personagem cativante e engraçado. As histórias de Ed Mort são curtas, mas envolventes e bem-humoradas, tornando-o um dos personagens mais populares de Verissimo.
O Analista de Bagé é um psicanalista de formação freudiana ortodoxa, mas com o sotaque, linguajar e os costumes típicos da fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai e a Argentina. É um defensor fiel das teorias de Freud e segue rigorosamente os princípios da psicanálise clássica. Ele tem um sotaque e linguajar característicos da região da fronteira, o que cria um contraste engraçado com sua abordagem psicanalítica tradicional. O Analista de Bagé também tem costumes e hábitos típicos da região, o que o torna um personagem peculiar e divertido. As histórias do Analista de Bagé são conhecidas por seu humor e ironia, que são usados para satirizar a psicanálise e a sociedade. O personagem também é usado para criticar a psicanálise e seus métodos, mostrando como eles podem ser aplicados de maneira absurda ou inadequada.
A Velhinha de Taubaté é um personagem famoso por ser “a última pessoa no Brasil que ainda acreditava no governo”. Ela foi criada durante o governo do general João Baptista Figueiredo (1979-1985) e era conhecida por sua ingenuidade e confiança nos governantes. A Velhinha de Taubaté era uma pessoa que ainda acreditava no governo e nos políticos, mesmo diante de todas as evidências de corrupção e ineficiência. Ela representava a esperança e a fé no sistema, mesmo quando tudo parecia perdido. O personagem foi usado por Verissimo para criticar a política e a sociedade brasileira, mostrando a distância entre os governantes e o povo. Em 2005, Verissimo anunciou a morte da Velhinha de Taubaté em uma de suas crônicas, intitulada “Velhinha de Taubaté (1915-2005)”. Segundo Verissimo, a Velhinha morreu decepcionada com o quadro político brasileiro, especialmente com o “mensalão”. A morte da Velhinha de Taubaté foi um símbolo da perda de esperança e da desilusão com o sistema político brasileiro.
– “As Cobras” é uma série de tiras que estreou no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em 1975. A série é estrelada por uma dupla de cobras que satirizam a situação social e política do Brasil durante a ditadura militar, além de abordar temas como futebol, religião e classe política. A série apresenta uma dupla de cobras como personagens principais, que são inteligentes, divertidas e metafísicas. As Cobras usam o humor e a sátira para criticar a sociedade e a política brasileira. Também são conhecidas por suas reflexões filosóficas sobre a vida e o universo.
Dora Avante, também conhecida como Dorinha, é uma personagem conhecida por sua personalidade extravagante e ideias mirabolantes. Ela é uma mulher da alta sociedade que não revela sua idade nem sob tortura e garante que só Deus e o famoso cirurgião plástico Pitanguy sabem quantos anos ela tem. Dora é uma mulher rica e influente que participa de eventos sociais importantes. Ela é conhecida por suas ideias mirabolantes para resolver problemas nacionais e mundiais. Dora lidera o grupo “Socialaites Socialistas” ao lado de amigas como Tatiana (“Tati”) Bitati, Betania (“Be”) Steira e Cristina (“Kika”) Tástrofe. O grupo luta pela implantação do socialismo soviético no Brasil, mas de forma irônica e crítica.
A Família Brasil é uma tira cômica que retrata a vida cotidiana de uma família brasileira de classe média. A família, que não tem nomes específicos para os personagens, enfrenta situações comuns como problemas financeiros e conversas desconfortáveis. A família é representada como uma típica família de classe média brasileira, com seus desafios e dilemas diários. As tiras usam humor e sátira para criticar a sociedade e a política brasileira. Embora não tenham nomes, os personagens são bem definidos e incluem o pai, a mãe, os filhos e outros membros da família, cada um com suas características e personalidades próprias.
Enfim, Verissimo foi para o outro lado, mas seus personagens ficarão para sempre. Se observarem, verão que todos os verbos utilizados para descrever os personagens acima estão no Presente. Uma forma de torná-los perenes. Obrigado, Verissimo!!!
Como avô, deixou por escrito o amor que tinha pela neta Lucinda, que deverá retribuir esse sentimento com orgulho, ao informar a todos quem foi seu avô.
Torço para que Lucinda siga os passos do avô e do bisavô e se torne escritora, dando continuidade à linhagem dos Verissimos.