3 de maio de 2024
Colunistas Sylvia Belinky

Uma experiência “sui generis”

Há alguns dias, levei, no condomínio em que moro e que tem um total de 72 casas, um abaixo-assinado solicitando que uma autoridade tome providências com relação aos cortes diários de luz que ocorrem e, para os quais, a ENEL encontra-se ocupada demais para dar atenção.

Se vai ou não funcionar, não sabemos; mas, o que mais me chamou a atenção foi a reação das pessoas diante de algo que tem incomodado a todos e prejudicado alunos, que têm provas e aulas online interrompidas, pessoas em home office, que não conseguem terminar reuniões de negócios, eletrodomésticos, como televisores, geladeiras, etc. que queimam, e é sempre bom lembrar que moramos “no interior”, onde tudo fica sempre mais complicado não só pela distância, como também pelo trânsito…

É preciso que eu mencione que temos um grupo de WhatsApp, em que parte desses moradores está e em que são discutidos todos os assuntos – de cocô de cachorro, que o dono não recolheu pois tinha alguma mensagem urgente e bem mais interessante no celular; qual a manicure que pode vir em casa; um encanador, que trabalhe aos domingos – a assuntos menos glamorosos, como este que estou levantando.

Alguns assinaram sem qualquer problema e me agradeceram o empenho – de fato, não conheço nenhuma outra forma de conseguir a adesão de alguém que não seja “indo à luta”.

Já outras leram cuidadosamente o texto, o que reputo essencial e muito justo e assinaram, perguntando se mais pessoas da mesma casa, se maiores de idade, poderiam assinar.

Essa foi uma dúvida que pairava, pois eu achava que deveria ser um responsável pela casa. Mas, um vizinho entendia que quanto mais moradores melhor. Optou-se por vários representantes da mesma casa, desde que maiores de idade, uma vez que cada um poderia ser afetado diferentemente.

Alguns queriam que eu voltasse mais tarde, pois outros moradores da casa, que deveriam assinar, não estavam – sendo que esta era uma hipótese completamente fora de cogitação, uma vez que tenho 74 anos e tinha de ir a pé, sob o sol.

Aí, diante a minha sugestão de colocar os nomes, números de documento e assinar pelos que não estavam em casa, a pessoa me olhava como se eu fosse uma delinquente e dizia: “Aqui em casa, não agimos dessa forma”. Claro, dando-me a entender que, se na minha eu faço…

Pessoas, que deram tanta importância ao “cocô alienígena”, não pareceram dar encarar o abaixo-assinado como algo sério, de fato…

Em algumas casas, não encontrei ninguém a não ser a faxineira, com quem deixei recado para que me ligassem para eu voltar lá ou que eu as receberia na minha casa para assinarem.

O resultado foi nenhum.

Fica fácil imaginar a dificuldade que encontra um recenseador. No meu caso, sou uma senhora idosa, de cabelos grisalhos, vestida de acordo e bem-falante, além de vizinha, e a dificuldade foi enorme.

O fato é ver como as pessoas reagem diante de algo tão importante.

Se eu estivesse convidando para uma “boca livre” ou para colocar cílios postiços meu sucesso teria sido maior!

No mencionado grupo de WhatsApp já propus uma horta comunitária, um “cachorródomo” – coisas para as quais existe espaço; mas, a discussão não durou muito. Há aqueles que “vestiram a camisa” de uma moradora que está sendo processada por ter transformado seu pátio interno em um mini salão de cabeleireiro. Como esta atividade vai contra a convenção do condomínio, querem que ela saia de seu imóvel ou que interrompa essa atividade.

Acontece que, se há regras, elas são para todos, sem exceção. Dessa forma, têm de ser seguidas por quem quiser morar no local.

Implantar melhorias dá muito mais trabalho do que defender o indefensável e foi, sem dúvida, uma grande aprendizagem ver a reação das pessoas diante de alguém que gostaria de fazê-lo!

Vivemos uma época em que temos que ser influencers para termos atenção, ainda que seja apenas para definir qual o melhor lugar para os cachorros ou gatos fazerem cocô…   

Sylvia Marcia Belinky

Tradutora do inglês, do francês (juramentada), do italiano e do espanhol. Pelas origens, deveria ser também do russo e do alemão. Sou conciliadora no fórum de Pinheiros há mais de 12 anos e ajudo as pessoas a "falarem a mesma língua", traduzindo o que querem dizer: estranhamente, depois de se separarem ou brigarem, deixam de falar o mesmo idioma... Adoro essa atividade, que me transformou em uma pessoa muito melhor! Curto muito escrever: acho que isso é herança familiar... De resto, para mim, as pessoas sempre valem a pena - só não tenho a menor contemplação com a burrice!

Tradutora do inglês, do francês (juramentada), do italiano e do espanhol. Pelas origens, deveria ser também do russo e do alemão. Sou conciliadora no fórum de Pinheiros há mais de 12 anos e ajudo as pessoas a "falarem a mesma língua", traduzindo o que querem dizer: estranhamente, depois de se separarem ou brigarem, deixam de falar o mesmo idioma... Adoro essa atividade, que me transformou em uma pessoa muito melhor! Curto muito escrever: acho que isso é herança familiar... De resto, para mim, as pessoas sempre valem a pena - só não tenho a menor contemplação com a burrice!

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