29 de março de 2024
Sergio Vaz

As ruas gritaram. Só não ouve quem é doido

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O foco das manifestações era claríssimo. Por Sérgio Vaz
Estava linda a Avenida Paulista neste domingo, 4 de dezembro. Como seguramente estava linda a Avenida Atlântica, a Praça da Liberdade, a Avenida Boa Viagem, a Esplanada dos Ministérios, para citar só as manifestações que já vi nas fotos do Rio, de Belo Horizonte, do Recife, de Brasília. A Paulista, isso posso garantir, estava uma beleza.
Ao voltar de outras manifestações na Paulista, escrevi que não importavam tanto os números que seriam divulgados pela PM, pelo Datafolha. Que não importavam tanto as comparações com outras manifestações feitas pelos interessados – por seus motivos partidários – em comprovar que havia menos gente dessa ou daquela vez.
Sinto a mesma coisa agora. Não importam tanto os números, nem as comparações com as outras manifestações ao longo de 2015. O que importa é que tinha muita gente. Muita gente na Paulista, na Atlântica, na Praça da Liberdade, na Boa Viagem, na Esplanada, e em mais um monte de vias país afora.
Milhares e milhares de pessoas dispostas a sair de casa para manifestar que não aguenta mais tanta corrupção, e não aguenta manobras do Congresso para transformar o que deveriam ser medidas contra a corrupção em medidas a favor dos acusados e contra os acusadores e os que julgam os crimes.
Ao longo dos últimos dias, muitas pessoas demonstram nas redes sociais dúvida diante das manifestações programadas para este domingo. Qual é o foco?, perguntavam alguns. Manifestação exatamente para quê? A favor de quê, contra o quê?
Pois é.
No primeiro dia de grandes manifestações de rua desde o Fora, Dilma, Fora, PT, o povo respondeu a esses céticos (ou mal intencionados) com absoluta clareza.
Multidões foram às ruas protestar contra a corrupção e defender a ação dos que lutam contra ela.
Simples assim. Nada complexo. Foco claro, claríssimo.
Multidões nas ruas contra a corrupção e em defesa de quem luta contra ela.
(Fiz um álbum de fotos que comprovam como as pessoas na multidão da Paulista tinham foco perfeito.)
***
Vamos e venhamos: encher a Avenida Paulista – e as avenidas de tantas outras capitais – de pessoas que querem apenas protestar contra a corrupção e defender quem luta contra ela não é coisa fácil. Não é bolinho. Sem qualquer ajuda de organizações fortes, tipo partido político, central sindical, dezenas e dezenas de sindicatos, UNEs, Ubes, MSTs, MSTSs et caterva.
Várias quadras da Paulista estavam inteiramente tomadas por pessoas que foram para lá apenas para dizer que querem um país melhor.
Sem esquemas organizados. Sem ônibus fretado. Sem condução de graça. Sem sanduíche de mortadela.
Apenas para defender um país melhor.
Não é fácil. E aconteceu. Os parlamentares vão ter que ouvir, vão ter que levar em consideração.
Não vai dar mais para transformar, no meio da madrugada, projeto de lei contra a corrupção em projeto de lei pró-acusados e contra os agentes que investigam e julgam.
Se os parlamentares não ouvirem o tal do ronco surdo que as ruas produziram hoje, é porque estão doidos. Porque são suicidas.
É porque querem se destruir e, de quebra, ajudar quem quer a destruição da instituição, o Congresso Nacional, e, portanto, da democracia.
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Ah, sim, havia os malucos pedindo intervenção militar.
Fazer o quê? Há maluco para tudo na vida. Há gente que até acha que Dilma foi uma boa presidente da República!
Uma pena, uma tremenda pena que haja carro de som pedindo intervenção militar, um idiota completo fazendo discurso grotesco pró-golpe militar no carro de som, pessoas como você e eu andando pela avenida com cartaz pedindo a volta dos militares.
Uma pena, uma tremenda pena – mas, de novo, fazer o quê? Impedir que eles participassem?
Lamentei profundamente – isso eu gostaria de registrar – que, na hora de organizar a localização dos caminhões de som, tivessem permitido que esses loucos, alucinados, abibolados, lunáticos, alienistas e alienados pró-militares ficassem entre o caminhão do MBL e o do Vem pra Rua. Nas anteriores, eles ficavam mais à margem, mais longe do ponto central das manifestações, que é entre o Masp e a Fiesp. Ficavam mais à margem, na periferia, na extremidade, que é onde eles têm mesmo que ficar, já que existem e não dá para para impedir que participem.
***
E, sim, havia alguns cartazes contra Michel Temer – cartazes produzidos de forma industrializada, em alguma gráfica, por alguém interessado especificamente no tema. Era extremamente visível o contraste entre esses diversos, todos iguaizinhos, e a imensa maioria dos cartazes, feitos à mão, cada um de um jeito.
Acho Fora, Temer uma idiotice. Como assim, ser contra a pinguela que temos para fazer a travessia entre o absoluto caos que foi o segundo governo Dilma Rousseff e as eleições presidenciais de 2018? Sim, é um pinguela, mas é tudo que temos. Sem ela, como tem repetido, com a razão que lhe sobra, Fernando Henrique Cardoso, caímos todos no abismo.
Havia também gente contra o Congresso Nacional – não contra os parlamentares que roubam ou que defendem os que roubam, mas contra o Congresso, a instituição.
Mas, de novo, fazer o quê? Há correntes e correntes de opinião. A rua é do povo, como o céu é do condor, e o povo mostrou lá algumas das diversas correntes.
Todos tinham, no entanto, acima das diferenças, um único foco. Ao contrário do que diziam os céticos (ou mal intencionados), a multidão, Brasil afora, tinha um foco claro, nítido, objetivo: estava nas ruas contra a corrupção e em defesa de quem luta contra ela.
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Houve, nos dias que antecederam as manifestações deste domingo, quem temesse por violência. Temia-se que houvesse atos como os da violência absurda, insana, vista na Esplanada dos Ministérios na última terça-feira, dia 29/11, durante protesto dos apoiadores do governo deposto contra o controle dos gastos públicos.
Não houve um episódio de violência na Avenida Paulista. Nem na Avenida Atlântica, na Praça da Liberdade, na Avenida Boa Viagem, na mesma Esplanada dos Ministérios, e nas demais ruas do país afora.
Os que saem queimando carros, quebrando vidros, em defesa da descontrole dos gastos públicos agem de um jeito.
Os que são contra a corrupção e defendem quem luta contra ela agem de outro.

O Boletim

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