26 de abril de 2024
Eliana de Morais

Estrada do Sabor, Serra Gaúcha

Conheça a Dona Odete, chefe de uma família de mulheres agricultoras que superou desafios e hoje encanta turistas na Estrada do Sabor, Garibaldi, na serra gaúcha
Por Rogerio Ruschel
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Meu prezado leitor ou leitora, vou contar uma historia que começa triste mas tem um final muito feliz – a historia da dona Odete Bettú Lazzari (foto acima) e sua corajosa família de mulheres. Era uma vez uma pequena propriedade na Linha São Jorge, uma comunidade no interior do município de Garibaldi, vizinha do Vale dos Vinhedos, na serra gaúcha, na qual vivia uma família de agricultores de origem italiana que vivia da produção e venda de uvas e leite. A região era linda (foto abaixo) e todos viveram felizes.
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Mas em 1997 aconteceu um problema: Danilo, o chefe da família, faleceu e o mundo desabou nos ombros da viúva Odete que ficou com quatro filhas para sustentar. Numa comunidade como essa as mulheres são quase sempre coadjuvantes dos homens da casa, e ao longo de dois anos a viúva teve que vender as vacas leiteiras, os tratores, arrendar os parreirais e até pedir dinheiro emprestado para parentes para sustentar a família. Até a natureza parecia estar pesada, contra as mulheres da famíla Lazzari.
Em 29 de novembro de 2001 o município de Bento Gonçalves, o Sebrae e a Atuaserra (organização privada) começaram a implantar a Estrada do Sabor, uma proposta para desenvolver o turismo rural na região e assim oferecer uma oportunidade de geração de emprego e renda para famílias rurais, com foco na agricultura e a agroindústria. Parecia que o céu começava a se abrir para a familia Lazzari
Além disso ao mesmo tempo se pensava em internalizar o turismo, isto é, aproveitar o fluxo de turistas que já visitavam as vinícolas grandes na cidade e outras atrações urbanas da região, o que de fato aconteceu. Hoje, quinze anos depois, o roteiro é um grande sucesso de crítica e público, muito bem organizado e sinalizado – e por isso mesmo muito frequentado.
Dona Odete Bettú Lazzari – hoje com 66 anos, abaixo – aceitou o convite para participar do projeto, imaginando poder gerar renda vendendo aquilo que ela e suas filhas sabiam fazer de melhor: refeições deliciosas com receitas secretas da família.
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Nos anos seguintes a vida foi uma dureza. As cinco mulheres (duas das filhas ainda adolescentes) enfrentaram todos os tipos de desafios: a falta de crédito oficial, o preconceito comunitário, a desconfiança dos vizinhos, a falta de estudos e a inexperiência em receber turistas e gerir um negócio. Dona Odete inventou a Osteria della Colombina que um dia seria um restaurante e começou oferecendo piqueniques no jardim da propriedade porque não tinha louças e toalhas; estes utensílios foram emprestadas pelo Hotel Casacurta e a secretária de Turismo e Cultura de Garibaldi, Ivane Favero, lembra que levou as louças para a casa da dona Odete em seu carro.
Pois as cinco mulheres venceram tudo isso e continuam vencendo: as filhas Rosangela, Raquel e Roselaine já estão casadas, formadas e tem empregos estáveis que ajudam o negócio da família, e a filha mais moça, Raissa, com 27 anos – uma excepcional  relações públicas formada em Enoturismo – é quem está mais presente no dia-a-dia da Osteria della Colombina ao lado da mãe. Rosangela, a filha mais velha, é técnica em agropecuária com habilitação em agro-indústria e estudou viticultura em Verona, Itália. E é uma das maiores incentivadoras da recuperação das receitas históricas da família. Na foto uma mostra dos produtos locais.
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Pois é, meu caro leitor ou leitora, quinze anos se passaram, e este não é o final, mas já é feliz. Hoje a Osteria della Colombina é reconhecida no Brasil e exterior e serve de exemplo em programas de Turismo Rural na Agricultura Familiar. Dona Odete e suas filhas recebem grupos de até 35 pessoas que se emocionam com a experiência criativa, simpática e autêntica oferecida na Osteria, como degustar refeições típicas de imigrantes italianos em ambiente único, numa mesa comprida, no porão da casa da família, que ainda tem um piso de “chão batido“.
Só para você ter uma ideia dos dotes culinários da família, anote: como minha visita foi individual e fora do horário de almoço, dona Odete teve que “improvisar”, cozinhando “algo simples”. Este “algo simples” da dona Odete começou com uma polenta brustolada na chapa como entrada , acompanhada de alguns embutidos, capeletti in brodo e um risotto fantástico.
O cardápio official servido para os visitantes (R$ 60,00 com vinho da casa) inclui estes pratos acima e mais: carne lessa – carne de galinha caipira e gado cozidas na água com temperos não revelados.
Na continuação tem salada orgânica e deliciosa, uma porção generosa de nhoque de três queijos com salaminho defumado; uma galinha ao molho vermelho de tomate da casa; carne de panela assada a moda antiga com bacon e salame – daquelas que tem sabor de panela realmente antiga – e uma fortaia, um tipo de omelete colonial italiano.
E mais: dona Odete oferece aos visitantes uma sobremesa natural excepcional: muitos doces, geléias e compotas de frutas e sorvete de limão siciliano feito em casa. Meu caro leitor ou leitora, é simplesmente divino! E ainda existem receitas antigas resgatadas pela família, como a moranga recheada, que fazem sucesso até mesmo além mar e que não pude conhecer!
A família oferece visitação à propriedade com trilhas entre pomares e parreirais, sempre no meio de uma deslumbrante paisagem; você se sente até mais leve depois do passeio! A família mantém um pequeno e intimista museu com objetos antigos como utensílios domésticos e agrícolas, peças religiosas e fotografias, em uma réplica de casa de madeira da colonização italiana.
Como bons empreendedores a familia Bettú Lazzari já está “exportando” produtos como vinhos familiares (com uvas Montepulciano, Corvina e Malbec, ótimos, por sinal), tempero, doces de frutas como uvas, cítricos, ameixas, pêssegos, peras, figos, marmelos – em pasta, geleias, compotas e conservas, tudo feito com matéria prima orgânica produzida em casa – e certificada. Dona Odete me disse que “aqui tudo saiu de nossa cabeça, pensamos coletivamente, nada é feito sozinho porque somos de uma família de Cremona, da Itália” – com forte sotaque de quem sempre falou o italiano de Veneto, hoje chamado de talian.
Mas as cinco mulheres tem outra magia de encantamento: convidam o visitante a participar da “Oficina Mãos na Massa“, a oportunidade do turista preparar sua própria “Colombina”, uma pombinha feita de massa de pão que repousa em uma embalagem tipo caixa de fósforo que as famílias italianas faziam desde o sempre, para envolver as crianças na produção do pão nas famílias. Tem gente que chora – e com razão, porque é um gesto simples mas cheio de significados de momentos que não conseguimos ter nas cidades grandes. Dona Odete me confessa: “Lidamos com o emocional das pessoas, os visitantes passeiam, fotografam, conversam, ouvem historias, ficam de duas a tres horas aqui, se emocionam, muitos choram escondido…”.
Pois é: em 15 de junho de 2016 a Osteria della Colombina completou 15 anos de história, data comemorada com o lançamento de um passeio autoguiado intitulado “Os Caminhos da Colombina” – veja abaixo a placa criada pela designer Rosana Marina.
O roteiro, que sozinho já justifica uma visita a a Osteria della Colombina, oferece passeios entre pomares, vinhedos, hortas certificadas orgânicas, animais domésticos, belas paisagens, agroindústria, uma pequena vinícola de sonho e um museu familiar. A idéia, como me disse a dona Odete, é que o visitante se sinta em harmonia com este lugar como nós nos sentimos”.
Nós nos sentimos, dona Odete, eu me senti de verdade. A Osteria della Colombina que foi palco de uma tragédia família, resistiu e continua sendo um lar – só que agora para muito mais pessoas do que as cinco mulheres corajosas da família Bettú Lazzari. Na foto abaixo eu recebo a energia positiva e tenho o privilégio de aprender sobre persistência, união e qualidade de ida com dona Odete e duas de suas valorosas filhas.
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Fonte: http://invinoviajas.blogspot.com.br/

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