29 de março de 2024
Adriano de Aquino Colunistas

A metodologia das pesquisas no Brasil

por  Paulo Cursino

A nota abaixo deixou a esquerda ouriçada e irritadiça, mas estou vendo pouquíssima análise séria sobre o assunto até mesmo da turma da direita. Há anos critica-se a metodologia das pesquisas no Brasil, então a notícia deveria ser bem vinda para todo mundo. Qual o grande medo geral? Arrisco alguns palpites.

Primeiro, sejamos adultos: a metodologia da XP não está mudando porque “desagradaram” clientes bolsonaristas da corretora. Este é um raciocínio simplório e tosco – para não dizer extremamente estúpido – do baixo jornalismo e de militantes de rede social. As pesquisas da XP feitas pela Ipespe mudarão de metodologia porque PRECISAM mudar e passar mais confiança aos investidores.

A bem da verdade, TODAS precisam. Portanto, devagar com o andor, porque nem tudo é política. Investidor não quer saber se vai ganhar dinheiro com petralha ou bolsominion. Vença quem vencer, eles querem é previsões corretas para poderem enfiar mais grana no bolso. Gente esperta não briga com fatos, aprende a lucrar com eles.  Como sempre, a política é um cachorro adestrado que só late quando o capitalismo permite.  Não é tão difícil de entender, convenhamos.

Segundo, quando investidores e empresários com muito dinheiro começam a desconfiar de levantamentos feito por corretoras, quando não sentem firmeza nos números, eles tomam uma atitude muito simples e óbvia: bancam outra pesquisa paralelamente para comparar com aquela que estão lhe vendendo. Já vi isto acontecer mais de uma vez. A empresa ou o investidor em questão contrata uma consultoria particular e faz a sua própria pesquisa, às vezes até melhores do que as que lhe são oferecidas. Existem várias empresas que vivem disso. Se a pesquisa contratada no particular bater com a pesquisa divulgada, se os números ficarem próximos, tudo ok. Então os números correspondem aos fatos e todos ficam tranquilos. Foi o que aconteceu, por exemplo, durante anos, com quase todas as empresas que tentaram questionar a liderança da Globo pela medição do Ibope. Ao final, depois de comparar com suas próprias pesquisas particulares, quando viam que todas registravam números muito próximos ao que o instituto oficial divulgava, elas se mostravam desnecessárias. Vi acontecer mais de uma vez também.

Quando pesquisas encomendadas no particular registram números muito distantes das “oficiais”, digamos assim, é porque uma das duas está falhando e algo precisa ser solucionado. Ninguém gosta de ficar no escuro ou pagar por um serviço não confiável. Foi o que aconteceu agora. Os números da pesquisa da XP já não vinham retratando a realidade havia um bom tempo e isto é grave para uma empresa que depende de diagnósticos. Em suma: a realidade bateu à porta. Achar que empresários dispensam pesquisas por picuinha é coisa de gente que a pratica. Achar que investidores baseiam suas ações pela opinião de seu curto círculo de amigos, conhecidos, e familiares, é coisa de quem nunca investiu. E antes que me entendam mal e digam que estou tomando lado: as pesquisas podem estar errando tanto para Lula quanto para Bolsonaro. Lula, de fato, pode não estar tão bem. Ou então Bolsonaro pode estar BEM pior. Daí porque são necessárias novas metodologias, para descobrir o que REALMENTE ocorre e não para corroborar o que a gente pensa. Erro é erro, independente de para qual lado vá.

Porém, pela reação preocupada da imprensa e da maioria dos formadores de opinião, a histeria e a rapidez em dizer que as correções são para acalmar “bolsonaristas”, dá para dizer que um nervo exposto foi tocado. Os blefadores piscaram. Se antes eu apenas conjecturava que havia distorções, agora já tenho quase certeza. A mídia brasileira pode estar, de fato, vivendo numa ilha da fantasia dizendo que Lula vence no primeiro turno. Difícil neste momento é saber o que é maior: se o número de espertalhões lucrando com essa empulhação ou se o número de idiotas acreditando. 

Terceiro e último, podem anotar: a XP apenas saiu na frente. Daqui para frente quase todas as pesquisas mudarão seus formatos e métodos se não quiserem pagar mico ou serem úteis para alguma coisa. Terão que avisar as mudanças porque os números também mudarão muito. A única coisa que posso afirmar, com certeza, e embasado na minha própria experiência em campo, pesquisando, tabulando, repensando e calculando clusters, é que as pesquisas atuais realmente não prestam e tem a validade de um iogurte. Sendo bem claro: acredito na honestidade delas. Eu não acredito é na competência. A maioria dos métodos ainda aplicados hoje já eram defasados nos anos noventa. As amostragens sempre são ridículas – foi-se o tempo que 3000 ligações de telefone serviam de amostra para o país, na verdade nunca serviram – e a distribuição e quantidade de amostras já se mostraram inadequadas e incoerentes mais de uma vez. A realidade é que os insitutos ainda não conseguiram se adaptar à realidade das redes sociais que alteraram padrões de comportamento de opinião da população para todo o sempre. Vide os erros grotescos de pesquisa das nossas duas últimas eleições. Cartomantes garantem prognósticos mais confiáveis.

O que mais me impressiona é o nosso jornalismo ainda acreditar no milagre da profecia autorrealizável. “Vamos botar fulano na frente, martelar isso, que uma hora pega”.

De novo: foi-se o tempo, não acontece mais, o mundo mudou. O leitor médio que recebe notícias 24 horas por dia pelo celular já entendeu o jogo e não cai mais nessa. Fosse assim, Haddad hoje seria presidente e Dilma senadora por Minas. Hoje todo mundo já percebeu que se a estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem, a imprensa brasileira é um porão do Dops.

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