O ex-presidente Lula, seus amigos e os amigos dos amigos se preparam para voltar ao governo no meio de um clima ruim. O dia da posse, em vez de ser um momento de celebração, está sendo, pela ação deles mesmos, um momento de angústia. Lula, segundo dizem em seu redor, pode usar colete à prova de bala durante a cerimônia. O percurso do desfile pode ser mudado. Deve haver o mínimo possível de povo e o máximo possível de polícia. Lula tem de ficar longe, tem de ficar protegido, tem de estar cercado de guarda-costas com metralhadora. Há sete presos políticos nas celas do STF e do ministro Alexandre Moraes; mais dois estão com ordem de prisão decretada, por “atos antidemocráticos” que estariam colocando em risco a posse do novo presidente. O Sistema Lula e seus parceiros no Supremo querem tirar de onde estão os manifestantes que continuam nas portas dos quarteis – exercendo o direito constitucional de manifestarem sua opinião, e sem provocar até agora o mínimo incidente.
Fabricaram uma “ameaça terrorista”, para justificar a escalada da repressão. Em vez de chamar o povo brasileiro para a posse, chamaram a tropa de choque. Falam o tempo todo em prender, proibir, multar, censurar, castigar. Que “festa da democracia” é esta?
O “Brasil Feliz” de Lula começa com uma cara infeliz. Foi para isso, “fazer um Brasil feliz”, que ele disputou a presidência da República, segundo passou a campanha inteira dizendo; agora, antes mesmo de seu primeiro minuto no governo, os novos proprietários da máquina do Estado já estão sob ataque de nervos. A festa da posse vai ser a portas fechadas, e reservada exclusivamente a militantes e à multidão de aproveitadores que gira em torno deles: empreiteiros de obras, banqueiros com problemas na justiça, advogados criminalistas de corruptos milionários, mandarins do Judiciário, a politicalha em peso. O povo brasileiro está de fora. As bandeiras do Brasil, o verde-amarelo e o Hino Nacional estão longe de lá – estão diante das guarnições militares, em protesto contra eleições que consideram roubadas, um governo que não reconhecem como legítimo e uma dupla STF-TSE que fez todo o esforço possível para os manifestantes acharem as duas coisas.
Nunca houve no Brasil um presidente que assumisse o cargo com o país tão dividido como está agora. Na primeira vez que chegou ao governo, Lula dava a impressão de que reconhecia e admitia a existência de posições diferentes das suas. Parecia disposto a governar para todos, ou pelo menos para a maioria; o Brasil, segundo dava a entender pela maneira como montou a sua equipe, era maior que o PT. Não há nada disso hoje. Lula escolheu um ministério e um primeiro escalão de gueto. É puro “nós” contra “eles”. Quem não votou em Lula não é um adversário – é inimigo, e tem de ser destruído. Não se admite que os 50% dos votos, ou quase isso, que o TSE registrou para o adversário sejam a expressão de um direito; são apenas uma tara de “direita”, que deve ser reprimida como caso de polícia. Ser contra o Sistema Lula, e sobretudo dizer isso em público, em voz alta, é “antidemocrático”. Não se trata mais de reformar o que havia antes, na política, na economia e na sociedade. Trata-se de destruir o Brasil que vem existindo até agora – e colocar em seu lugar a partir do dia 1º. de janeiro de 2023, de preferência para sempre, um regime no qual só existe lugar para quem serve Lula e se serve dele.
Fonte: Gazeta do Povo
José Roberto Guzzo, mais conhecido como J.R. Guzzo, é um jornalista brasileiro, colunista dos jornais O Estado de São Paulo, Gazeta do Povo e da Revista Oeste, publicação da qual integra também o conselho editorial.