7 de maio de 2024
Colunistas Joseph Agamol

Literatura é um superpoder

Imagem: Google Imagens – superpoderes.mystrikingly

Corriam os anos 80. O local, um bairro do subúrbio carioca, ali, pertinho do que viria a ser conhecido como “Complexo do Alemão”. Sim, violência havia, alguma, esporádica e ocasional, quase coreografada, como em um roteiro de Tarantino, não a violência sistêmica, corrosiva e corruptora de hoje.

A rotina tinha suas asperezas cotidianas, contrapondo-se às suavidades impremeditáveis – apenas a extraordinariedade da vida, em seu eterno fluir e refluir, pedindo da gente é coragem, como lembrou Guimarães Rosa, ele próprio um extraordinário impremeditável.

Havia uma criança. Com seus oito anos, cumpria o costume das crianças, envolvidas, sem o saber, no esquenta e esfria, no aperta e afrouxa, no sossega e desinquieta da Vida. Convicta de que teria água para beber na rua, mangas na mangueira e ciranda jogada na calçada. Incertezas? Ao acordar, haveria almoço? Rudezas. Mas Tom Jobim tinha acabado de lançar o disco contendo ”Águas de Março”. Salvamentos. Suavidades.

Em meio aos rituais da existência, a criança descobriu um tesouro: um armário, repleto de livros. De todos os autores. Brasileiros, quando brasileiros eram mestres da arte de escrever. Alemães. Russos. Judeus.

Alencar. Vinicius. Drummond. Cecília. Graciliano. Machado. Veríssimo. Não eram nomes. Eram palavras mágicas, chaves mestras que abri (g) am um portal para outros mundos. O armário era um armário de Nárnia. Os livros a pegaram pela mão. E a criança leu.

E, lendo, descobriu e viveu mil outras vidas além, transcendendo a realidade nem sempre suave, nem sempre sutil, vestindo outras peles como se suas fossem, imergindo em outras eras como se de fato lhe coubessem, absorvendo outras almas como se fosse seu destino, e sorvendo cada porção de existência como se reais fossem.

E eram.

Literatura é um superpoder.

E, nesse exato momento, há meninos e meninas encontrando as palavras mágicas.

Protegê-las deve ser uma missão.

Joseph Agamol

Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

1 Comentário

  • Rute Abreu de Oliveira Silveira 6 de agosto de 2022

    Sim, Joseph, literatura “na veia” é mesmo um superpoder.
    Amo os seus escritos, amo ler, amo mostrar para as minhas netas a beleza dos livros, e nessa missão tenho tido o maior sucesso, e sonho com um mundo onde, porque foram leitores, as pessoas consigam se posicionar no seu dia a dia.
    Que cada vez mais crianças, jovens e adultos descubram esse prazer inenarrável que a leitura nos dá.
    Rute Abreu de Oliveira Silveira

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