9 de novembro de 2024
Colunistas Joseph Agamol

Livraria Cultura – o fechamento I

Foto: Google Imagens – livrariacultura.com.br

Hoje eu soube que foi decretada a falência da Livraria Cultura. Uma crônica tristemente anunciada, claro. E lembrei de quando a Cultura do Rio fechou, em um lúgubre prenúncio.

A Cultura do Rio ficava na rua Senador Dantas, no prédio do antigo cinema Vitória – que só exibia filmes pornográficos. Depois do anoitecer, as imediações do cine Vitória eram ocupadas pelas chamadas “moças de vida fácil” – que de fácil não tem nada, sei disso.

Se você trabalhasse em um dos prédios comerciais do entorno, e deixasse sua moto na calçada – prática comum nos anos 80 e 90 – , era bem possível que, ao chegar ao veículo, encontrasse uma das referidas damas languidamente deitadas sobre o banco – cansei de ver essa cena, viu?

À medida que os anos avançavam e o Rio seguia em seu processo acelerado rumo à barbárie – iniciado em 1983 – o local tornava-se cada vez mais degradado, ponto de encontro de mendigos, traficantes, viciados – as prostitutas deram um sumiço de lá, incomodadas com a nova vizinhança.

Até que em 2012 a Cultura inaugurou sua segunda loja no Rio. Não havia um espaço como aquele na cidade, não que reunisse, em um mesmo local, livros, discos de vinil, dvds, colecionáveis, café… Como por encanto, pelo poder de um livro mágico, o que era sórdido se imaculou, o degradado se recompôs. Saiu de cena a fauna malfazeja que habitava a região, substituída por gente que queria apenas desfrutar do cheiro bom que só livros reunidos tem. Quem gosta sabe do que estou falando.

A Cultura era um verdadeiro oásis no centro do Rio – literal e metaforicamente falando. Quando morava na Lapa, era um hábito quase diário entrar lá, ao menos para passar quinze minutos percorrendo as estantes, tocando nos livros, tomando alguns nas mãos, com ternuras de amante apaixonado. Assim como eu, milhares. Milhões.

Tudo isso se foi. Não sei como está o local da Cultura agora, mas prevejo que, assim como a selva retoma um antigo templo abandonado, os velhos habitantes do local o reclamarão de volta. E mais um pedacinho do Rio de Janeiro maravilhoso se perde no tempo.

Uma cidade sem livrarias, um país sem livrarias é um lugar inóspito, deserto de emoções e sentimentos, tão árido quanto a superfície da lua.

Um país sem livrarias não é um país digno desse nome – que droga, um país sem livrarias não merece sequer que pessoas vivam nele!

Joseph Agamol

Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

subscriber
Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *