
Há 65 anos, um poema sobre professores continua a atravessar o tempo — lembrando-nos que, sem eles, o Brasil permanece à deriva.
Não é lenda. No Japão, o professor é o único que não se curva diante do imperador.
Também não é lenda que, no Brasil, o professor é o que mais se curva — não por reverência, mas por resistência. Dobra o corpo diante do descaso, da precariedade e da indiferença de um país que ainda não entendeu que nenhuma nação se ergue sobre os ombros da ignorância.
Neste 15 de outubro, Dia do Professor, recorro à travessia lírica do poema “Canoeiros”, de meu saudoso avô Kosciuszko Barbosa Leão — jurista, filósofo, escritor e Membro Emérito da Academia Espírito-santense de Letras — publicado exatamente há 65 anos, em 1960, no Correio da Manhã. Um poema que, mais do que homenagem, é espelho e denúncia.
Em seus versos, o canoeiro é o símbolo do mestre: aquele que, com força e paciência, leva o passageiro de uma margem à outra. Sem ele, diz o poeta, “é impossível passar destas margens além”.
O professor, como o canoeiro, não tem holofotes. Remando entre rios de desatenção, conduz gerações inteiras — e, ao final da travessia, recebe apenas uns “níqueis” atirados ao chapéu de palha.
O que mudou em 65 anos? Pouco — ou quase nada.
As salas continuam cheias e os salários, vazios. As políticas públicas prometem pontes, mas entregam remos quebrados. E, ainda assim, há sempre um canoeiro à beira do rio, insistindo em remar.
Ensinar, no Brasil, é um ato de fé. É acreditar que a canoa não afunda, mesmo quando o rio é revolto. É seguir remando por entre as correntezas da desinformação, do desrespeito e do esquecimento. É remar contra a maré — e, paradoxalmente, ser o único que faz o país avançar.
Kosciuszko chamava o professor de “máximo operário da Pátria”. Um trabalhador que não constrói muros, mas pontes; que não empunha ferramentas, mas ideias e que não acumula bens, mas desperta consciências.
Esse operário continua invisível — mas é ele quem sustenta, silenciosamente, as estruturas do amanhã.
O Brasil precisa se mirar no espelho de “Canoeiros” e perceber o abismo que separa o discurso da realidade. Precisamos compreender, de uma vez por todas, que o professor não é passageiro da história — é o condutor da travessia.
Hoje, mais do que homenageá-los, é preciso ouvi-los. Respeitá-los. Erguê-los como se ergue um farol na escuridão.
Porque sem esses canoeiros — esses remadores do saber — não há margem segura, não há futuro possível, não há nação que se sustente.
Que o poema de 1960 continue remando em nós.
E que um dia, enfim, o Brasil aprenda a não curvar seus professores, mas a aplaudi-los de pé!
PS: Dedico “Canoeiros” à D. Zulmira Ferreira, minha 1ª professora, e aos meus mestres médicos Olívio Louro Costa, Evaldo D’Assumpção e Ivo Pitanguy.


																		
																		
																		
																		
																		
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