Mais uma longa sessão da CPI, desta vez com o Ministro Marcelo Queiroga. Ele procura se esquivar de todas as perguntas incômodas que colocavam Bolsonaro em contradição com seu discurso de médico.
O argumento era esse: não faço juízo de valor sobre as declarações do presidente. Em certos momentos, quando se tratavam de temas favoráveis ao governo, ele não economizava juízos de valor.
Parece-me que Queiroga está procurando de todas as maneiras se manter no cargo, que talvez fosse uma antiga aspiração. Ele olha para trás e vê três ministros caídos no caminho e tenta uma estratégia de sobrevivência bastante delicada.
No caso da hidroxicloroquina procurou se esquivar com o argumento de que o tema será decidido por um Conselho, ele será o árbitro e não pode antecipar sua decisão.
A única declaração mais enfática, se é que podemos chamá-la assim, foi a que condenou a aglomeração, mesmo se provocadas por Bolsonaro.
Ainda está pesando no ar as declarações de Bolsonaro que insinuaram que o vírus foi fabricado pela China para desenvolver uma guerra bacteriológica. Estamos enfrentando uma nova guerra?
Bolsonaro não mencionou a China mas deu a entender que tratava da China. Posição diferente da australiana por exemplo. Ali o governo desconfia dos chineses e expressou oficialmente.
Uma delegação da OMS foi a Wuhan e constatou que era improvável que o vírus tenha escapado do laboratório da cidade.
Li muitas matérias sobre o tema no ano passado. Mas não eram convincentes. É um absurdo a China propagar um vírus na sua própria população correndo um risco gigantesco só para se colocar melhor na corrida econômica
Escrevi um artigo sobre isso para o Globo. Bolsonaro não se comporta como um presidente mas como membro de um grupo de Whatsapp que dissemina teorias de conspiração. As consequências não serão boas para o processo de vacinação, que depende de insumos e da boa vontade chinesa. Cerca de 80 por cento das vacinas aplicadas no Brasil vieram precisamente da China.
A decisão dos Estados Unidos de suspenderem a patente das vacinas contra Covid-19 é histórica. Os EUA sempre foram contra sob o argumento de que a medida desestimula a inovação.
A Alemanha não concorda com a posição americana.
Mas o Brasil que não tem direitos de vacinas a defender mas sim necessidade de produzi-las tem uma posição oficial contrária à suspensão das patentes. Com a mudança americana, a posição brasileira ficou mais incômoda. Será que voltaremos aos velhos tempos da AIDS em que dizíamos abertamente que era um imperativo humanitário suspender patentes em epidemias?
Os tempos são outros.
Aqui no Rio, 25 pessoas morreram numa operação policial no Jacarezinho. Alguma coisa está errada pois o saldo é de uma operação de guerra. A operação foi contra traficantes armados, mas algumas pessoas foram feridas na estação de Triagem. Um policial morreu.
A polícia acusa os traficantes de recrutarem meninos de 12 anos para o tráfico. Quem já passou por Jacarezinho sente claramente uma atmosfera pesada por ali. Há gente armada e dizem que nas ruelas mais distantes, foram erguidas barricadas para conter a polícia.
Ainda é cedo para analisar esta operação. Mas ela se enquadra no roteiro das guerras assimétricas e uma das variáveis importantes é saber como a população do lugar sentiu o confronto, para que lado pendeu sua simpatia.
São muitas as complicações. Participei hoje da reunião do Conselho da Cidade, pessoas que colaboram com o governo municipal. A mesa da qual participei tinha como tema Paz e Cooperação. Discutir esse tema num dia de 25 mortos no Rio dá um pouco da ideia da complexidade do tema.
Fonte: Blog do Gabeira