Em 1980, pouco depois da morte de Vinicius de Moraes, seu amigo, Rubem Braga, escreveu mais uma bela crônica, para homenagear o poeta. É assim que Rubem termina a crônica: “Eu ainda vou ficando um pouco por aqui (Ipanema, Rio de Janeiro n.d.r.) – a vigiar, em seu nome, as ondas, os tico-ticos e as moças em flor. Adeus”.
Moças em flor, no Rio de Janeiro e a ilustração desta crônica, lembram-me outra linda “chansong” de Chico Buarque, “Carioca”: “De noite, meninas, peitinhos de pitomba, vendendo por Copacabana as suas bugigangas”.
Aconteceu comigo.
Juro, eu estava indo a outro lugar. Tarde quente na Savassi, aqui no forno de Belo Horizonte. Passava pela Baiana do Acarajé, lépido e faceiro, quando tive que parar e pegar uma mesa. Eram cinco da tarde. Só tinha uma mesa ocupada. Mas muito bem ocupada, por três lindas meninas, na flor de seus 20 e poucos anos. O visual era tão lindo e agradável que não resisti e sentei-me na mesa ao lado delas, de frente. Elas estavam à sombra, encarei o sol assim mesmo. Valia e valeu a pena.
Percebi que eram amigas de colégio, de longa data, porque as três faziam faculdade; uma de jornalismo, outra de direito e a terceira não consegui descobrir.
A jornalista era gata, mas a advogada era muito mais. A terceira também.
A jornalista, Duda – o único nome que ouvi – vestia uns negócios esvoaçantes, meio hippie. A advogada, super elegante e suculenta num shorts de tricô que dava vontade de desmanchar com os dentes. Lindo rosto, corpo escultural, perfeita. A terceira também, num legging (?) irresistível – acho este tipo de calça a coisa mais sensual, claro, é uma segunda pele, revelando todas as curvas e colinas.
Ao deparar-me com as três beldades, não esperava ouvir nada que prestasse, pareciam três “patricinhas”, tomando uma Brahma. Uma atrás da outra.
Solidário e solitário, de frente pro mar, pedi também uma Brahma.
Como não sou Beethoven, captei também a conversa das meninas.
Tinham nada de “patricinhas”. Fiquei encantado ao ver e ouvir o quão elas eram jovens e politizadas, principalmente a estonteante advogada.
A conversa começou com a jornalista. A advogada ficou calada um tempão. Só ouvindo e eu só vendo as pernas bronzeadas querendo sair do shorts laranja. A menina do legging de vez em quando falava.
Veio o papo das eleições.
Agucei os ouvidos.
Duda, a jornalista, disse que ia votar em Eduardo Campos.
A advogada disse: vou votar no Aécio Neves.
E começa a discussão.
Numa boa.
A advogada diz que o melhor presidente que o Brasil já teve foi Fernando Henrique Cardoso. Eu concordava com tudo o que ela falava e ela ia ficando mais linda, cada vez que ficava mais inteligente e antenada.
A advogada diz que chega de PT, que democracia é mudança, que o PT já está há 12 anos no poder e agora tem que largar o osso e deixar outros consertarem o país.
Aí elas começam a discutir sobre o Bolsa Família. A jornalista defendendo, a advogada argumentando e bem: “Quem criou o Bolsa Família, foi FHC, apenas tinha outro nome. É por isso, por causa desse assistencialismo é que o Brasil não vai pra frente, a economia está estagnada; quem recebe Bolsa Família não quer mais trabalhar. Basta olhar ao redor, tá faltando gente pra trabalhar em todo lugar”.
A jornalista discordava, sem argumentamos, mas levantava a bola pra advogada: “O Bolsa Família já cumpriu seu papel, ela deveria ser modificada, deveria ser temporária, deveria incentivar a procurar trabalho. O Bolsa família tinha que ter validade de um ano. Veja o que aconteceu com a Grécia, Portugal, Espanha. Quebraram exatamente por causa disso, o governo bancava tudo e ninguém mais queria trabalhar, só queriam viver do salário desemprego. Nenhum país aguenta isso, o Brasil já não está aguentando”.
E por aí foi.
Fiz uma foto das três, mas como tentei disfarçar, a imagem não ficou boa. Uma pena.
Impossível esquecer a opinião do professor chinês de economia, Kuing Yamang, que viveu na França: “A sociedade europeia está em vias de se auto-destruir. Seu modelo social é muito exigente em meios financeiros. Mas, ao mesmo tempo, os europeus não querem trabalhar. Só três coisas lhes interessam: lazer/entretenimento, ecologia e futebol na TV! Vivem, portanto, bem acima dos seus meios, porque é preciso pagar estes sonhos…
Os seus industriais deslocalizam-se porque não estão disponíveis para suportar o custo de trabalho na Europa, os seus impostos e taxas para financiar a sua assistência generalizada. Portanto endividam-se, vivem a crédito. Mas os seus filhos não poderão pagar ‘a conta’. Os europeus destruíram, assim, a sua qualidade de vida empobrecendo. Votam orçamentos sempre deficitários. Estão asfixiados pela dívida e não poderão honrá-la. Mas, para além de se endividar, têm outro vício: os seus governos ‘sangram’ os contribuintes.
A Europa detém o recorde mundial da pressão fiscal. É um verdadeiro ‘inferno fiscal’ para aqueles que criam riqueza. Não compreenderam que não se produz riqueza dividindo e partilhando, mas sim trabalhando. Porque quanto mais se reparte esta riqueza limitada menos há para cada um. Aqueles que produzem e criam empregos são punidos por impostos e taxas e aqueles que não trabalham são encorajados por ajudas. É uma inversão de valores. Portanto o seu sistema é perverso e vai implodir por esgotamento e sufocação. A deslocalização da sua capacidade produtiva provoca o abaixamento do seu nível de vida e o aumento do… da China!
Dentro de uma ou duas gerações, ‘nós’ (chineses) iremos ultrapassá-los. Eles tornar-se-ão os nossos pobres. Dar-lhes-emos sacos de arroz… Existe um outro cancro na Europa: existem funcionários a mais, um emprego em cada cinco. Estes funcionários são sedentos de dinheiro público, são de uma grande ineficácia, querem trabalhar o menos possível e apesar das inúmeras vantagens e direitos sociais, estão muitas vezes em greve. Mas os que decidem acham que vale mais um funcionário ineficaz do que um desempregado… (Os europeus) vão diretos a um muro e a alta velocidade…”.
PS: Este chinês está falando da Europa ou do Brasil? Melhor ir tomar outra Brahma.


Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.