5 de maio de 2024
Colunistas Walter Navarro

A Rita levou meu sorriso

Quem leu, leu, quem não leu, basta procurar no meu Facebook ou nos labirintos da Internet, a crônica que escrevi, no dia 8 de março, Dia Internacional da mulher, homenageando Rita Lee.
Numa foto recente, percebi que, infelizmente, ela estava chegando ao fim. Eu só não podia saber que ela morreria exatamente dois meses depois, dia 8 de maio de 2023.
Jô Soares e Gal Costa também ganharam uma crônica, mas como diria Nelson Cavaquinho, “depois da vida”, porque me pegaram de surpresa.
Assim que soube da Rita, como todo mundo; na manhã do dia 9, ontem, apenas republiquei a crônica de 8 de março. Tudo que eu escreveria ontem, já estava lá.
Entre muitos elogios (obrigado), “curtidas e compartilhamentos”. Velho amigo meu de Campinas, Marcelo Osse, desafinou o coro dos contentes. Nos comentários, ele escreveu o que eu ignorava: “O câncer nomeado por ela como ‘Jair’, já foi”.
Outro amigo, de São Paulo, Marco Angeli, este virtual, no Instagram, escreveu: “Numa espécie de piadinha macabra, Rita Lee apelidou o câncer que tinha de ‘Jair’, ‘ironia fina’ comemorada pelos amigos. Um desses amigos emendou: ‘tira o Jair’. Não deu. Espero que descanse com a paz que, aparentemente, não teve em vida. RIP”.
Em agosto de 2022, depois de 38 anos, fui rever meus velhos amigos, na mesma Campinas, onde cresci.
Na TV a cabo do hotel, só tinha canal vagabundo e, mesmo odiando, por curiosidade, sintonizei na Globo News, para ver do que eles estavam xingando o Bolsonaro, já que o presidente era criticado e insultado 24h/24h.
E não deu outra. Só pararam para anunciar a morte de Jô Soares.
Bebendo uma cerveja, apostei comigo mesmo: como estes comentaristas da Globo News aproveitarão a morte do Jô, para falar mal do Bolsonaro. Não esperei muito.
Logo em seguida, apareceu um gaiato, lembrando mais uma tirada “engraçadíssima” do Jô.
“Quando Jô Soares deu entrada no hospital Sírio Libanês, um médico perguntou a ele se havia alguma visita que não queria receber. A resposta veio imediata, acompanhada de um sorriso: ‘Só o Bolsonaro’. O caso foi contado pela ‘ex-esposa’ de Jô, Flávia Pedras Soares, durante o velório do comediante e revelado pelo jornalista Juca Kfouri em seu blog”.
Bom, “Flavinha” e Kfouri, dispensam comentários.
Como dizia o “Planeta Diário”: Elvis não morreu. Já o Tancredo… Como dizem os franceses, “o ridículo não mata”, já o câncer…
Os gauleses também aconselham: “pode-se rir de tudo, menos quando estamos comendo farofa”.
Concordo com tudo e com todos.
Discordo das brincadeiras de Rita e Jô, mesmo porque Jair continua bem vivo. Isso, depois de uma facada que alguns chamam de “fakeada”.
O nome que Rita deu a seu câncer não tem graça, é no mínimo deselegante. Perdi e perco muitas pessoas, com esta praga. Engraçada é outra frase de Rita: “A vida é curta e eu sou grossa”.
Ontem à noite, em casa, como dizia o mesmo “Planeta Diário”, fiquei “revendo henrique cardoso” dois shows de Rita Lee. Comprovei seu enorme talento e sua deliciosa sensualidade, principalmente na gravação do “Acústico MTV”, de 1998.
Em 1998, o presidente do Brasil era Fernando Henrique Cardoso (PSDB), aquele que fingia ser o contrário e único adversário do PT. Hoje, seu companheiro de luta, é vice-presidente do Brasil, no “governo” PT. “Quem te viu, quem te vê”, não é?
Pois bem, ironicamente, na TV, Rita cantava mais um sucesso, “M Te Vê”, que começa assim: “Quem M Te Vê, quem M Te Viu. No final dos 90, o Brasil tem um pé no penta, o outro em Chernobyl”.
O penta só veio em 2002, mas o lado Chernobyl continua contaminando tudo.
E Rita continua: “A gente explode se for campeão, depois se fode na eleição. A gente perde a copa e aprende a eleger quem é honesto e competente”.
Aprendemos a eleger? A reeleger FHC e depois quatro vezes seguidas o PT?
Mas deixemos a bola com a Rita: “Já dizia o General De Gaulle
‘Este país não é sério!’. Mais vale um craque de gol, que dois de araque no Ministério”.
Rita morreu sem saber que De Gaulle nunca disse esta frase. O autor era um diplomata brasileiro, Carlos Alves de Souza, embaixador do Brasil na França, inspirado por um incidente ridículo, entre os dois países, que ficou conhecido como “Guerra da Lagosta”.
Rita não é obrigada a saber História do Brasil e pelo jeito desconhecia também o presente, quando continuou a cantar: “Quem quer trocar a Copa do Mundo, por um Brasil sem vagabundos. Se a bola no pé deixar na mão, que vantagem Gérson vai levar. É nas urnas que eu vou me vingar”.
25 anos depois de cantar tudo isso, o Brasil está cada vez mais Chernobyl e imagino em quem Rita votou.
O triste é que Chernobyl, com C de câncer, matou e vai continuar matando muita gente, de câncer.
Continuo amando Rita e agradeço por tudo que ela cantou e falou; de tudo que ela riu, comendo farofa.
Agora, ri melhor quem ri por último. Quem será?

PS: E se perguntar só defende, o nome da doença é Jâncer ou Lâncer?

Walter Navarro, Kiev, 10 de maio de 2023

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

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