16 de abril de 2024
Ricardo Noblat

O preço de manter Temer

Michem Temer, boia (Foto: Arte Antonio Lucena)

Tão cedo saberemos quanto custará ao país a decisão a ser tomada, depois de amanhã, pela Câmara dos Deputados de arquivar a segunda denúncia de corrupção contra o presidente Michel Temer.
Partes do custo poderão ser mensuráveis desde logo. Exemplo: o volume de dinheiro liberado pelo governo para a construção de pequenas obras nos currais eleitorais dos que votaram a favor do arquivamento da denúncia.
Se o custo se limitasse a isso, tudo bem. Por lei, o governo é obrigado a pagar emendas parlamentares ao Orçamento da União que destinam pequenas verbas para isso e aquilo. É fato que ele o faz ao seu gosto, premiando aliados e punindo adversários.
Ocorre que a operação de salvamento de um presidente encurralado inclui despesas de maior valor, algumas incalculáveis, outras manifestamente imorais. Aí está o busílis.
 
Em agosto último, o governo anunciou a privatização de 14 aeroportos, entre eles o de Congonhas, em São Paulo. Com a venda, esperava arrecadar R$ 6 bilhões a serem aplicados em novos investimentos.
Sob a pressão do PR, dono de 38 votos na Câmara, o governo desistiu de privatizar Congonhas e avalia a reabertura do aeroporto de Pampulha, em Belo Horizonte, para voos de longa distância.
Quem manda no PR é o ex-deputado Valdemar Costa Neto, um dos mensaleiros do escândalo do PT. De trás das grades, ele obrigou a presidente Dilma a demitir um ministro para nomear outro afinado com o PR.
Solto depois de ter ficado no xilindró apenas um ano dos quase oito a que fora condenado por corrupção, Costa Neto segue dando as cartas com a desenvoltura de sempre.
O ministro dos Transportes é do PR. A Infraero é do PR. Congonhas representa quase 15% da receita da Infraero. É o segundo aeroporto mais rentável do país.
O PR deve ter lá suas razões para manter Congonhas sob controle. Deve ter identificado vantagens em brigar pelo restabelecimento de voos de longa distância em Pampulha. Costa Neto é um esperto rato. Digo: gato, de faro finíssimo.
Impedido de caçar votos com a distribuição a mancheia de cargos e de dinheiro, Temer assinou decreto no fim da semana que reduz em 60% o valor das multas por crimes ambientais.
Os 40% restantes poderão ser pagos com ações de reflorestamento. Pequenos infratores costumam pagar suas dívidas em dia. Os grandes entram com ações na Justiça para não pagar.
O agrado feito por Temer teve endereço certo: os ruralistas, donos de 200 preciosos votos na Câmara. Para que a denúncia contra Temer fosse aprovada seriam necessários 342 votos de um total de 513.
A primeira denúncia foi arquivada por 263 votos contra 227, e duas abstenções. Ausentes, 19 deputados. Temer peleja desta vez para ir além dos 263 votos. É possível que consiga.
Nada mais do que já fez ou faça para manter-se no poder será capaz de superar a indecente portaria baixada por Temer que altera as regras de combate ao trabalho escravo, ou análogo ao trabalho escravo. Ruralistas sapatearam de tanta felicidade.
O Brasil levou mais de 100 anos para firmar um pacto contra o monstruoso crime que o envergonha até hoje. Ou que deveria envergonhá-lo. Temer deu meia volta volver.
Parou o relógio da História. Atrasou os ponteiros. Ganhou mais alguns votinhos para permanecer impune.
Mesmo que, mais tarde, revogue a portaria, mostrou do que é feito – de ambição desmedida, de ausência de escrúpulos e de um oportunismo infame.
Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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