4 de maio de 2024
Colunistas Ligia Cruz

Wendy não era feminista

Imagem: Google Imagens – Recreio

“Infantilovers” dão uma tremenda preguiça quando começam a desfazer o feito para atender a grupos específicos e resolver suas questões familiares em público.

Se Peter Pan foi idealizado para ser um menino branco, duende que voa, se recusa a crescer e vive na “Terra do Nunca”, com outros meninos, qual é o problema?

O conto retrata uma espécie de convivência numa confraria que faz parte do ideário infantil de qualquer garoto nessa etapa da vida.Todos querem ser heróis e sobrenaturais de alguma forma. Se juntam em grupos para brincar, competir, disputar força, ter as melhores ideias e destacar-se dos seus iguais.

Meninos e meninas têm uma natural divisória entre seus mundos, antes da fase de identificação sexual. Salvo quando convivem entre irmãos e brincam juntos e, à sua vez, cedem, para um viver, a realidade do outro. Absolutamente normal.

Quando os sociopatas da Disney começam a destroçar os enredos, a incluir as definições de gêneros e os conflitos raciais nos clássicos da literatura perde-se a essência do autor no seu contexto e tempo. Uma chatice sem tamanho.

O dramaturgo escocês, da Glasgow Academy, Sir J.M.Barrie, escreveu a primeira versão do que viria ser a conhecida saga de Peter Pan, como “The boy who wouldn’t grow up” (O menino que não queria crescer), em 1904. Depois veio “Neverland”, (traduzido como “A terra do nunca”) e, só em 1911, surgiu a peça teatral como Peter Pan e Wendy. Ou seja, a menina ganhou relevo na trama porque, talvez, o próprio autor tenha feito uma releitura do papel da mulher que à época vinha se descolando de todo o regramento social.

Wendy sempre foi coadjuvante no conto, embora tenha sido sempre o contraponto entre os mundos real e o de fantasia. Meninas não são menos por isso e, nesta fase, não se tinha a noção do sacal feminismo universitário, que inundou as escolas. Elas aderiram à esquerda, como se fosse condição obrigatória para a validação dos protestos.

Só depois que passam pela doutrinação nas escolas básicas é que as adolescentes se encaixam na militância das pautas sócio-sexuais. Tornam-se um arremedo de machos mal-humorados e acabam na cama dos verdadeiros misóginos, sugadores de sonhos.

Deveriam preocupar-se mais com o “feminino”, com os direitos civis, com as oportunidades iguais no mercado de trabalho e menos com os tais machistas idiotas que comandam as verdades. Para esses, dá-se as costas. Se casou com um, daqueles bem chatos, separe-se. Não passe a vida chorando. Pau neles todos, com força para quebrar mesmo!

Portanto, Wendy é só um personagem da 3D e do seu tempo. A visão do universo criativo do autor retrata o contexto da primeira década dos anos 1900. Tempo que antecedeu à grande revolução comportamental, que aboliu o espartilho, diminuiu as saias, permitiu às mulheres fumarem e dirigirem automóveis e a adotarem o cabelo Chanel para simplificar a vida cotidiana, nos anos 20, do século XX.

Portanto, o imaginário do universo infantil do escritor foi espelhado nas transformações sociais profundas desse tempo em que homens e mulheres foram protagonistas de muitas mudanças.

Estamos bem longe ainda de dizer que o mundo deixou de ser machista, que não haja a possessividade doentia do homem em relação à mulher, que não haja crimes em nome da honra masculina e que os abusadores têm motivos para agredir, como os endinheirados e descerebrados jogadores de futebol de hoje.

O vilão do conto de Barrie é o malévolo capitão gancho. Certamente inspirado nos piratas ingleses que barbarizaram nas ilhas e portos do Atlântico Norte.

Moral da história: deixe de ser babaca, leia os livros originais, respeite a história no seu tempo e deixe em paz os personagens! Quando se restaura um livro antigo, jamais se deve modificar suas características, retirar os registros deixados pelas pessoas que o manusearam. A história pode ser interpretada, não reescrita em nome de outro autor. Mexeu é seu, assine. E plágio é crime.

A próxima interferência será a da “Branca de Neve” parda. Isso é doentio!

Ligia Maria Cruz

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

Jornalista, editora e assessora de imprensa. Especializada em transporte, logística e administração de crises na comunicação.

1 Comentário

  • Rute Abreu de Oliveira Silveira 23 de abril de 2023

    Maravilhoso o seu texto.
    Muito verdadeiro e atual.
    O mundo parece ter enlouquecido com esse tal do “ politicamente correto”.
    Assino embaixo do seu escrito.
    Rute Abreu de Oliveira Silveira.

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