Há caminhos ocultos em todo lugar, às vezes disfarçados atrás de um canteiro, de uma sebe, de um jardim, e que, quando descobertos, desvelam uma cidade invisível, na maior parte do tempo.
Encontrei um desses, por mero acaso, ao defrontar-me com uma vereda bifurcada ao longo da trilha. Escolhi o que me pareceu mais rarefeito de gentes, pois queria ficar a sós comigo. Entrei em uma alameda isolada, povoada por ipês de todas as cores, mais velhos que os celacantos. Ents de Tokien. Foi aí que eu a percebi. A fada.
Eu acredito em elementais. Seres da natureza. E, por isso, só por crer, eu a vi. Estava disfarçada entre a ramagem de um frondoso ipê-rosa, a me fitar, seus olhos dourados, de tigre fêmea, nos quais entrevi ferocidade e doçura. Sorriu-me, e, em meio ao riso, pressenti dentes aguçados. Seu olhar era de convite, promessa e ameaça, mas até o risco parecia suave.
Apontou-me um círculo, atrás do ipê. Eu vacilei. Ela entristeceu-se, ao notar meu dilacerar. Dúvida. Nada disse, mas formou um pensamento que, como se cinema fosse, projetou-se em minha mente, technicolor, panavision: uma terra com rei e com lei, de belos dias e longas noites, plenos da alegria bárbara e do prazer selvagem da caça em outros mundos e planos, como o meu.
Ela desistiu de me dissuadir e partiu. Mas não sem antes de oferecer-me uma promessa, disfarçada de intimação: estaria ali, na mesma árvore, a apontar o caminho para que eu a seguisse, aqui e lá, e, como prova de sua sinceridade e para que eu não a esquecesse, se possível fosse, ordenou ao ipê que baixasse seu galho e me ofertasse seu mais belo glóbulo de flor, a qual aceitei, recolhi e parti – ao volver a vista atrás, pude vê-la, no limiar entre os mundos, a me observar, toda dentes e olhos.
Vou voltar.
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.
