19 de maio de 2024
Colunistas Fernando Fabbrini

Madonna e a outra dona

Solidariedade, ilusão e ódio em público.

Foto: Hélvio

Rolou nas redes trechos do vídeo do show de Madonna em Londres, um dos últimos de sua turnê bilionária. Madonna habita o nosso planeta; viu e reviu as cenas dos massacres, sequestros e atrocidades cometidas pelos terroristas do Hamas. Com pose desafiadora, pernas abertas, botas de cowboy, colete justo, shorts minúsculos e segurando uma cerveja – a marca do patrocinador da turnê –, ela desabafou.

Disse que seria muito irresponsável de sua parte não comentar o que acontece no mundo. Que abria as redes sociais e tinha vontade de vomitar. Que via crianças sequestradas, bebês decapitados, gente sofrendo em toda parte. E repetia: “Que porra de mundo é esse?”.

(Concordo, dona Madonna. Modestamente, também faço a mesma pergunta todos os dias).

“Vou parafrasear James Baldwin (poeta, escritor e crítico norte-americano já falecido) e dizer que todas as crianças do mundo estão sob nossa responsabilidade. Não importa de onde são elas, suas nacionalidades, onde moram, quais são seus nomes – elas nos pertencem. Somos velas iluminando o mundo. Portanto, nossa luz não pode se apagar, cada um de nós tem o poder de mudar tudo!”, completou.

Um fã acendeu a lanterna do celular e milhares ergueram as mãos, acendendo também os seus e balançando-os, numa só cadência. “Londres! Vocês estão comigo?”, gritou Madonna, eufórica. “Yeahhhhhh!”, resposta em uníssono. E a cena alcançou de imediato milhões de jovens via Instagram, convictos de que Madonna e seus iPhones acesos conseguiriam transformar “this fucking world”.

(Aí, dona Madonna, me perdoe, mas achei que virou marketing oportunista, frases bem combinadas com a produção para não “ofender” ninguém).

Infelizmente, as celebridades – egos imensos e vaidosos – sofrem de onipotência crônica. Acham-se capazes de milagres e creem piamente que suas críticas e menções aos problemas mundiais têm peso e resolverão tudo. Vejam: a Amazônia está ardendo em chamas como nunca, e Leonardo Di Caprio nunca mais deu bola.

No final, Madonna deve ter bebido o resto da cerveja do patrocinador, devolvido o microfone ao suporte e sido imediatamente cercada por seguranças que a conduziram ao camarim. Com nova fortuna creditada na conta bancária, logo estaria dormindo na poltrona do jato executivo adaptado aos seus gostos, rumo ao lar: uma mansão em Upper East Side, bairro chique de Manhattan; imóvel de quatro andares, 26 cômodos, nove lareiras e 14 banheiros.

Alguém ainda acredita que discursos de famosos mudarão os propósitos dos senhores da guerra, dos terroristas assassinos do Hamas, dos odiosos interesses geopolíticos? Dos fabricantes de armamentos, dos políticos canalhas que tiram proveito das desgraças e das pandemias? Dos apologistas da violência; da vergonhosa complacência da ONU?

Além da Madonna, no Brasil vimos também o manifesto respeitoso, pacifista e conciliador de outra dona – uma burocrata desconhecida que ganhou segundos de fama na bolha esquerdista. Dona Gleide Andrade, secretária nacional de Planejamento e Finanças do PT e conselheira de Itaipu, postou nas redes: “Israel é assassino”, “uma vergonha para a humanidade”, “não merece ser um Estado”. Nas notícias, soubemos ainda que seu cachê para cantar versos tão cheios de amor e carinho é de R$ 37 mil mensais, pagos pelos brasileiros.

Melhor esquecer. Até porque essa performance só fez sucesso para a pequena plateia que já conhecemos. É a mesma que aplaude o atraso, a censura e as tiranias. E a que acende os celulares para o racismo, o ódio e principalmente a mentira, fingindo-se de fanzocas da paz e da justiça.

Fonte: O Tempo

Fernando Fabbrini

Escritor e colunista de O TEMPO

Escritor e colunista de O TEMPO

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