3 de novembro de 2025
Carlos Eduardo Leão

O sopro da virtude

Entre Adão, Eva e a Palavra, surgiu algo ainda mais humano: o flato original.

E o Instagram, essa fonte inesgotável de inspiração dos cronistas amadores — categoria literária em que humildemente me encaixo — segue revelando pérolas do comportamento humano.

O insight de hoje nasceu de uma sequência de postagens sobre um tema que, acreditem, está em alta: o peido. Sim, senhoras e senhores — o peido. Palavra medonha, de sonoridade grotesca e zero vocação poética. Um termo que deveria ser exilado do português, paradoxalmente “Última Flor do Lácio” que não merecia tamanho agravo.

Doravante, decreto solenemente: nada de “peido”. Adotarei “pum”, “flato”, “traque” ou, em casos de extremo requinte, “bufa” — todos igualmente vexatórios, mas de certa sofisticação semântica. Afinal, a língua também merece um desodorante linguístico.

O fato é que esse terrível substantivo masculino acompanha a humanidade desde Adão. E aqui surge a grande dúvida da Antropologia do Ridículo: quem foi o primeiro a estrear a arte? Ele ou Eva?

Segundo o perfil “VIRAFATOS”, no Instagram, há fortes indícios de que a honra — ou a desgraça — tenha sido de Eva. Diz o relato que, na Idade Média, as mulheres mais desejadas eram justamente aquelas que soltavam “puns”, de preferência os mais aromáticos e vigorosos. Acreditava-se que esses gases eram manifestações sagradas de purificação — o chamado “sopro da virtude”.

Os maridos, por sua vez, orgulhavam-se do talento perfumado das esposas. Em tabernas e feiras, entre goles de hidromel, vangloriavam-se:

— “A minha mulher, senhores, é tão virtuosa que uma bufa sua limpa o ambiente mais rápido que incenso do Vaticano e extermina ratos, baratas e outros peçonhentos num raio de 50km.

Era outra época. Um “flato” bem dado após o jantar, tipo Gás Sarin intestinal, espantava doenças, inveja e até visitas inoportunas. E, convenhamos, se eu fosse a visita, correria antes do segundo ato dessa ópera gasosa.

O mais curioso, porém, era o rito pré-nupcial. Antes do casamento, a jovem noiva reunia-se com um conselho de anciãs e soltava o “pum” da aprovação. Se o aroma fosse suficiente para desmaiar meia dúzia de velhas, estava apta ao matrimônio. Já as que continham o “traque” por pudor eram vistas como almas impuras, acumulando pecados e gases. Pode isso, Arnaldo?

Intrigado, recorri ao Google — essa Barsa digital temperada com fofoca — e encontrei “EUSOUSTEPH”, uma influencer Especialista em Monarquia por Westminster (ou por Hogwarts, talvez).

A moça garante que, na Idade Média, o corpo feminino era visto como território de pecado e, por isso, vigilância constante. Textos médicos falavam sobre gases, sim, mas nada de “virtude perfumada”. Segundo ela, nada disso tem base real. “Essas peidonas precisavam era de jejum e oração”, conclui em tom moralista.

Se esses tempos fossem agora, eu não teria dúvida:

“— Alexa, pare o 3I/ATLAS! Quero uma carona pra Plutão!”

Lá, certamente, o cheiro seria mais ameno!

P.S.: Escrever sobre “puns” e citar o Lácio na mesma crônica é, no mínimo, um feito civilizatório. Se Camões tivesse lido o Instagram, talvez “Os Lusíadas” cheirassem um pouco diferente.

Carlos Eduardo Leão

Cirurgião Plástico em BH e Cronista do Blog do Leão

Cirurgião Plástico em BH e Cronista do Blog do Leão

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