Pode até parecer que estou exagerando, mas, ao vir morar no interior de São Paulo, no já cada vez mais distante ano de 2015, me deparei com algumas especificidades – amo essa palavra, assim como “inverossímil” e outras tantas – que me deixavam confuso. Exemplo clássico:
– Oi! Quero uma água com gás.
– Obrigado.
– IMAGINA!
Pronto. Eu ficava, de início, meio como o meme da Nazareth, olhando e matutando, sem entender. “Como assim? É para ‘imaginar’ alguma coisa? Será que a moça do caixa imagina que estou imaginando algo? Será uma espécie de piada com cariocas? O que eu RESPONDO, droga?!”
Eu dava um sorriso desenxabido, fazia um muxôxo – mais duas palavras que amo! É, eu sei que “muxôxo” não é mais acentuado, mas eu gosto assim – pegava minha água e dava o fora.
E assim foi até eu me adaptar às peculiaridades do “paulistês”. Por isso segue esse já não tão pequeno glossário do idioma falado no Estado dos bandeirantes.
– café “carioca”: uma beberagem aguada, rala e sem sabor vendida por aqui. Eu considero uma ofensa pessoal esse café ser alcunhado por “carioca”, visto sermos os cariocas os maiores conoisseurs e apreciadores de café no Brasil, e bebemo-lo forte, encorpado, oloroso e, preferencialmente, puro.
– Feijão “carioca”: na mesma linha do item anterior, paulistas consomem todos os dias uma variante menos nobre e pouco saborosa de leguminosa que chamam de “carioca”. Sendo que nós consumimos apenas o único feijão digno desse nome, o Thor dos feijões, o PRETO, óbvio.
– “lanche”: é outro mistério insolúvel da humanidade os paulistas chamarem de “lanche” o que é apenas um sanduíche. “Lanche”, não me canso de esclarecer, é apenas o nome de uma refeição, tal como “almoço”, ou “jantar”.
– “mistura”: o porquê de aqui em São Paulo o prosaico acompanhamento do feijão com arroz receber o nome de “mistura” é um enigma tão enigmático quanto saber quem ergueu os moais da Ilha da Páscoa. É sobejamente sabido que “mistura” refere-se, tão somente, ao alimento destinado a periquitos, canários e outras aves caseiras.
(Continuará)
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.