3 de maio de 2024
Colunistas Walter Navarro

Toda Mudez será castigada

Não faço crônicas todos os dias, claro. Mas, ontem, escrevi sobre o Burt Bacharach e pensei: hoje vou dar um tempo porque, afinal, o que é raro é caro. Aí lembrei que escrevo de graça e resolvi trabalhar.

Comecei uma coluna sobre idiotas; Por exemplo, esta gente que começou a escrever para todas, todos e “todes”.

Assassinaram o camarão e a gramática.

Quando penso em idiotas, ou seja, todos os dias; lembro do Nelson Rodrigues que tem, pelo menos, umas mil frases sobre: “Invejo a burrice, porque ela é como a Pedra da Gávea, eterna” ou “Os idiotas vão tomar conta do mundo; não pela capacidade, mas pela quantidade, são muitos”.

Quando penso em Nelson Rodrigues falando de idiotas, lembro de seus discípulo, Arnaldo Jabor, escrevendo sobre imbecis: “O bom asno é sempre bem-vindo, enquanto o “pernóstico” inteligente é olhado de esguelha. A burrice dá mais ibope, é mais fácil de entender. A burrice dá mais dinheiro; é mais comercial”.

E procurando sobre o Jabor, descobri que hoje, dia 15 de fevereiro de 2023, faz um ano que morreu e ninguém mais fala dele. Arnaldo Jabor morreu mesmo e não foi só para todos os ingratos.

E enquanto eu revia antigas entrevistas com o Jabor, meu amigo Leopoldo Martins me avisa que Raquel Welch morreu! Raquem? Sim, Raquel Welch, hoje, aos 82 anos. Logo ela, que nasceu no mesmo ano que Jabor, 1940.

Sempre confundi Raquel Welch com outras duas gostosas; Bo Derek, a “Mulher Nota 10” e Ursula Andress, a não menos deliciosa e primeira “Bond Girl”, em “007 Contra o Satânico Dr. No” (1962), com Sean Connery.

Mas quem foi Raquel Welch e por que é tão famosa? Porque na década de 1960, estrelou o filme “Mil Séculos Antes de Cristo”, usando apenas um biquíni. Nossa! O mesmo traje de Úrsula em “007”. Uma ousadia que, naquela época, não era castigada. Pelo contrário

Assassinaram o Cinema e a nudez.

Pronto, e agora? Quem quer saber de Jabor e Raquel? Que vida besta! Acordar, escovar os dentes e dormir.

Qual foi o legado de Arnaldo Jabor? Gosto muito de pelo menos quatro filmes dele: “Toda Nudez Será Castigada”, “O Casamento”, “Tudo Bem” e “Eu Te Amo”. Todos com mulheres lindas, sem biquíni.

Jabor era tarado como Hitchcock que, em cada filme, escalava uma loura de fechar o comércio, como Grace Kelly.

“Toda Nudez” e “O Casamento” são baseados, e muito bem, em Nelson Rodrigues. O primeiro, com a estonteante Darlene Glória, o segundo, com a ninfeta, Adriana Prieto.

“Tudo Bem” não tem musas, mas mostra que no Brasil tudo vai mal desde sempre. “Eu Te Amo”, o primeiro filme brasileiro que vi em Paris, em 1982, no cinema; tinha Vera Fisher e Sônia Braga muito nuas. Tá bom demais, né?

O último filme dele, “A Suprema Felicidade” é um STF, perdão, uma suprema bosta, de tão chato. Só se salva a atriz, Tammy Di Calafiori, outra Lolita, linda e também nua.
Hoje, descobri que Jabor deixou um filme inacabado, “Meu Último Desejo”, baseado no conto “O Livro dos Panegíricos”, de Rubem Fonseca.

Assassinaram a Literatura.

É a “história de Doutor, um ex-político famoso que agora passa os dias sozinho, em uma cadeira de rodas, rodeado por lembranças do passado obscuro”.
Um ex-político, famoso, à beira da morte, revelando todos os podres a dois cuidadores. Interessante… Penso em alguém…

Assassinaram a Política.

Como jornalista, Jabor deixou muito mais que oito filmes, milhares de crônicas, em jornais e livros; comentários e opiniões em jornais de TV. Uma crônica é sucesso de Rita Lee: “Amor e Sexo”, muito boa.

Nelson Rodrigues inventou a maldição “o mineiro só é solidário no câncer”. Mas foi um mineiro, Fernando Gabeira, quem salvou o cineasta e criou o jornalista Arnaldo Jabor. Foi Gabeira que, para ajudar, tirar Jabor da merda, levou-o para escrever na Folha de São Paulo. Depois, Augusto Nunes deu outros empurrões.

Assassinaram o Jornalismo.

Interessante! Muito antes de Jabor, outro mineiro, Fernando Sabino, foi quem arrumou emprego para os amigos mineiros Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e Hélio Pellegrino, no Rio de Janeiro, nos anos 40. Hoje, mais que nunca, o mineiro só é solidário no câncer. Mas, tem que ser câncer incurável.

Assassinaram Minas.

Mas vem cá, continua chovendo, é quase Carnaval, nada para fazer e, afinal, tudo isso para quê?

Assassinaram o Carnaval.

Burt, Nelson, Arnaldo, Raquel, Sean, Grace, Adriana, Rubem, Fernando, Otto, Paulo, Hélio, todos morreram. E a Rita Lee não está passando muito bem.

PS: Já o Brasil ficou mudo e não entende bem as palavras.

Walter Navarro, Chicago, 15 de Fevereiro de 2023

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

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