29 de março de 2024
Colunistas Walter Navarro

Selvagens Cães de Guerra e Carneirinhos


Anteontem eu disse que não haveria guerra.
Ontem, o Irão soltou seus rojões e bombinhas de São João, só para constar e fazer boi dormir.
Logo antes, recebi umas 69 mensagens no WhatsApp, com um texto, supostamente escrito por Paulo R. Cordeiro e com esta recomendação: “Todo mundo falando de uma possível Terceira Guerra Mundial. Achei legal, pura verdade”.
Mil perdões Sr. Cordeiro, teu texto pode até ser legal, bonitinho, mas ordinário. Tem nada de verdade. Muito menos a pura verdade.
O texto é este:
“Vocês já imaginaram essa geração X Y Z numa guerra?
– Um ia ligar pra mãe reclamando que o sargento gritou com ele.
– Outro não iria comer o rancho porque é intolerante à lactose.
– Outro vendo esse da lactose também não iria comer por causa do glúten.
– Outro porque é vegetariano.
– Outro, vegano.
– “Pagar 10”, só de luva.
– Banho da tropa demoraria 13 horas, porque um não iria querer ficar pelado na frente do outro.
– Antes de chegar ao campo de batalha, metade já estaria em depressão.
– 3000 morreriam fazendo ‘selfie’.
– 4000 postariam no Instagram: #partiuguerra.
– Não faltaria soldadinho de chumbo também foto fazendo bico.
– Seriam necessários 200 alojamentos diferentes para atender quase todas as identidades de gênero.
– 5000 morreriam com um tiro na testa devido ao fone de ouvido.
– 40.000 se refugiariam na faculdade, onde passam 1/3 da vida – desertando.
– Os que jogaram War e Batalha Naval ‘on line’, irão se achar oficiais”.
Editei o texto. Foi a parte mais fácil. Trabalho eu teria se fosse corrigir o pensamento, do começo ao fim, que é apenas uma piada.
Nunca fui à guerra. Nem mesmo prestei o serviço militar, por 1069 razões que não cabem aqui, agora.
Para simplificar, eu tinha coisa melhor a fazer. Como estudar, namorar, beber, me divertir… Só seria militar se começasse como general, pronto. E cinco estrelas!
Provavelmente, Paulo R. Cordeiro (Carneiro) e todos que gostaram de seu texto também não sabem o que é uma guerra.
Guerras são onde os fracos não têm vez. É coisa de homem, de macho americano, europeu, asiático, árabe.
Guerra é para quem pode. É para quem tem grana ou patriotismo, fanatismo sobrando.
Guerra é coisa de História do Brasil.
Vejam o que aconteceu quando uma simples Argentina desafia uma Inglaterra, pela porra de umas Malvinas que continuam Falklands.
Aliás, a própria população das ilhas preferiu continuar inglesa.
Guerras, muitas vezes, servem para desviar a atenção para problemas maiores.
Guerra no Brasil é caseira, é feita pela Polícia, todo dia e mata milhares de brasileiros. Guerra civil.
Não contem com as gerações X Y Z para fazer guerra. Elas não sabem nem quando estão com fome. E cagam e andam pelo Brasil e pelo mundo. Quanto a atacar o Brasil, tem certos lugares aqui que recomendo não invadir…
No mais, guerra sempre foi coisa de selvagens, bárbaros, conquistadores, escravos, pobres ou simplesmente loucos.
Guerras são horríveis e nunca resolveram. Guerra é dinheiro. Claro, elas têm um lado bom, plástico. O que seria da arte sem as guerras? “Guernica”, de Picasso, não existiria.
Guerra não é para principiantes e amadores. Repito, é coisa de macho. E de idiotas.
Muitos generais, oficiais morrem. Mas a maioria absoluta das vítimas, em todas as guerras, vem dos soldados e da população civil.
Jogos de guerra. Xadrez, com peões morrendo aos montes.
E as guerras são como a Burrice, logo, eternas. Sempre existiram e sempre existirão.
Em muitos países, principalmente os bélicos e problemáticos por natureza, o serviço militar é obrigatório.
Na Guerra do Vietnã, minha favorita, depois da 2ª Guerra Mundial, os Estados Unidos pela primeira, única e última vez levaram a pior por um simples motivo. Os soldados americanos nem sabiam por que estavam lá. Já os vietnamitas estavam defendendo sua terra, história, cultura, tudo.
Mesma coisa vale para os soviéticos no Afeganistão. Com um detalhe, EUA e URSS poderiam acabar aquilo em minuto, com bombas atômicas, mas depois de Hiroshima, estas bombas são tão letais quanto inúteis, pois acabariam com o mundo.
O ser ou não ser na guerra não é a morte, é a sobrevivência. Levar um tiro, pisar numa mina e explodir é bem melhor que muita vida que anda por aí.
O que é desagradável é ser ferido, feito prisioneiro, torturado. Trabalhos forçados, campos de concentração. Os que voltam, na maioria das vezes, viram Zumbis. Cicatrizes externas e ainda mais internas.
Agora, tem gente que gosta…
São os loucos supracitados.
Vi um documentário sobre a Legião Estrangeira que é terra de ninguém; lugar de deserdados, proscritos, marginais no sentido amplo da palavra, desajustados, foragidos, excluídos, sociopatas. Gente sem passado e futuro. Sobreviventes deles mesmos, antes da guerra.
Um deles, entrevistado, disse que a mãe achava que ele estava trabalhando na Disney. E ele lá nos confins da África, esperando ou procurando confusão.
Um outro, este foi o melhor, disse que foi para a Legião Estrangeira porque poderia matar à vontade, sem sofrer as consequências. Um verdadeiro psicopata que tinha vontade de matar em Londres, mas não podia.
O autor Paulo Cordeiro (Carneirinho) sabe de nada, inocente.
Na construção da ferrovia Madeira-Mamoré, a “Ferrovia da Morte”, no Brasil de 1887, dos 30 mil trabalhadores, vindos de todo o mundo e do Nordeste, seis mil morreram de doenças, como a malária.
Imaginem o horror. O cara, no meio da selva amazônica, trabalhando e morrendo de trabalhar.
Agora imaginem um soldado, na selva, no deserto; mesmo numa cidade devastada, morrendo sem nem saber o motivo….
Quando assisto a filmes de guerra, que adoro, não penso em tiros, explosões e morte. Meu medo ou receio mora em pequenas tragédias: uniforme e peso com frio, calor, umidade, sujeira, falta de banho, de bidê e principalmente em assaduras e micoses.
PS: Em suma, sou um covarde assumido, mero espectador invejoso da coragem alheia. Sobretudo, ainda tenho coisas melhores a fazer.

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

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