30 de abril de 2024
Colunistas Ricardo Noblat

Se Lula não fizer o que ele quer, Arthur Lira ameaça pegar em armas

Afinal, quem foi eleito para governar o país?

Espelho dele, espelho dele: haverá presidente da Câmara mais absolutista e voltado para o próprio umbigo do que Arthur Lira (PP-AL)? Talvez Eduardo Cunha, cassado e preso por corrupção à época da Lava Jato, e do qual Lira foi o melhor aluno.

Lira está há nove meses e poucos dias do fim do seu segundo mandato como Presidente da Câmara. Quer, porque quer, eleger um sucessor que obedeça às suas ordens e lhe assegure uma posição de destaque na próxima legislatura. Receia perder importância.

Há uma maldição que se confirma a cada dois ou quatro anos: ex-presidente da Câmara perde a reverência dos seus pares e passa a ser apenas um dos 513 deputados. Está nos planos de Lira se eleger senador em 2026, mas terá pela frente o clã dos Calheiros.

Renan (MDB), o patriarca, é senador há quatro mandatos consecutivos, e certamente deverá se reeleger. Alagoas é governado por um afilhado de Renan. O ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), também é senador. Parada indigesta para Lira.

Mas não impossível de ser vencida por ele. Vai depender do seu adversário apoiado pelos Calheiros. Por enquanto, Lira tem outro adversário para combater: Lula e o seu governo. Não foi Lula que escolheu Lira para adversário, foi Lira que o escolheu.

Lira tenta mandar no governo, mas Lula não permite. Então, Lira briga com ele, uma vez que brigar com o Supremo Tribunal Federal, o outro dos Poderes da República, seria arriscado. Lira está sempre em débito com a Justiça, mas julga-se credor de Lula.

Ganhou a presidência da Caixa Econômica para chamar de sua, além de algumas diretorias; ganhou outros cargos no segundo e terceiro escalões do governo, mas acha pouco. Lira queria a coroa do governo, o Ministério da Saúde, onde há muito dinheiro.

Mas Lula acha que Lira cobra muito caro por uma adesão ao governo que não seria completa nem confiável. Mudará de opinião mais adiante? A ver. A não ser que doravante Lira e o Centrão, que ele comanda, o deixassem governar em paz. A luta continua.

Cunha inviabilizou o governo da presidente Dilma Rousseff pondo em votação na Câmara as chamadas “pautas-bomba” – projetos de lei que contrariavam os interesses do governo. Por fim, abriu o processo de impeachment que acabou por derrubar Dilma.

Na semana passada, açulado por Cunha, que não tem mandato, mas continua influente na Câmara, Lira deixou correr solta a votação que por pouco não tirou da cadeia o deputado Chiquinho Brazão (ex-União Brasil), suspeito de ter mandado matar Marielle Franco.

Não fosse o empenho de última hora do governo e de ministros do Supremo, Brazão estaria solto. Lira descontou em Alexandre Padilha (PT-SP), ministro das Relações Institucionais, socorrido por Lula no dia seguinte. E, furioso, prometeu retaliar.

Zangou-se ainda mais quando soube que o governo demitiu um primo dele que era superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Alagoas. Junto à bancada bolsonarista na Câmara, prepara uma dura resposta ao governo.

A primeira ideia de Lira é abrir CPI’s com um duplo propósito: acuar o governo com denúncias e investigações e atrasar a votação de projetos prioritários. Outra linha de ação: pautar projetos que afetem a agenda do governo.

Lira tem força para isso e não renuncia a usá-la. É o administrador de parte do Orçamento Secreto da União e, por isso, conduz seus colegas pela coleira. Em ano eleitoral, o Congresso se esvazia nos últimos meses. Mas foi Lira o inventor da votação à distância.

Um deputado não precisa mais estar presente na Câmara para que seu voto seja computado. Vota de longe, ou dá sua senha a um assessor para que vote por ele.

Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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