25 de abril de 2024
Ricardo Noblat

Limite-se. E que seja limitado

Reserva mineral (Foto: EFE)

Com frequência e em troca de nada, o governo do presidente Michel Temer se oferece para ser imolado em praça pública. Tal vocação para o sacrifício talvez decorra do sentimento de culpa por ter nascido dos escombros de uma administração que ajudou a construir e a arruinar quando lhe foi conveniente.
O decreto que extinguiu a Reserva Nacional do Cobre e Associados, uma reserva amazônica de 47 mil quilômetros quadrados maior que o Estado do Espírito Santo, repousava em uma das gavetas do governo a salvo de polêmicas. Até que repentinamente emergiu e desatou a fúria nacional.
Se ao invés de um decreto, a extinção da reserva tivesse sido proposta por meio de um projeto de lei a ser visto, revisto e votado pelo Congresso, o governo apanharia da mesma maneira, sim. Mas pelo menos poderia argumentar que o Congresso como a casa do povo é que daria a última palavra.
Nada é mais autoritário do que um decreto presidencial. Nada se parece mais com um ato de força ou verdadeiramente é. Nada evoca tempos nem tão distantes assim que o país prefere esquecer. Melhor que não esqueça. De tão errada, à extinção da reserva se opusera o próprio Ministério do Meio Ambiente.
Em menos de uma semana, o governo foi obrigado a recuar de sua intenção original substituindo o decreto por outro. E de novo recuou ao suspender por fim os efeitos do primeiro e do segundo decreto. A suspensão visa “promover um amplo debate com a sociedade sobre o tema” por 120 dias.
Ora, por que o governo não julgou antes necessário ouvir ninguém a respeito de tema tão candente? Por acaso imaginou que a sociedade acabaria por engoli-lo sem estrebuchar? E quem disse que um governo parido nas circunstâncias em que este foi pode dar-se ao luxo de ir muito além dos seus modestos chinelos?
Um governo tão impopular quanto o outro que o pariu deveria comportar-se com recato, vergonha e descrição, limitando-se a fazer o feijão com arroz e a esperar que bata a hora de o povo eleger o próximo. Por legítimo, deve ser aturado. Por indesejado, deve limitar-se e ser limitado.
Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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